Especialistas afirmam que a melhora percebida em novembro tem um componente sazonal, devido às festas de fim de ano e à Black Friday, e pode ter influência de medidas que injetaram dinheiro na economia, como a liberação de saques do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Só será possível avaliar se o mercado de trabalho realmente começou a reagir quando os efeitos de incentivos pontuais começarem a se dissipar, explica o economista Bruno Ottoni, da consultoria IDados.
Também não será com base em medidas específicas, como criação de novos tipos de contrato ou reformas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que a situação vai se resolver. Ainda que melhorem o ambiente de contratação, essas iniciativas não são suficientes para impulsionar a geração de empregos, ressalta Ottoni. Ou seja, a queda sustentável na taxa de desemprego depende de o país conseguir crescer mais rápido e aumentar os investimentos.
O diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Felipe Salto, projeta crescimento de 2,3% da economia neste ano. Na avaliação dele, os resultados positivos recentes se devem à taxa básica de juros, que está no menor patamar histórico, de 4,5%, e a alguma recuperação de investimentos. “É um conjunto de fatores, principalmente da demanda interna, que ajudam a recuperar o emprego”, afirma.
Professor da Universidade de São Paulo (USP) e economista da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Hélio Zylberstajn ressalta que a taxa de juros baixa é um indutor do investimento, porque gera uma migração de poupança: o dinheiro que antes era colocado em títulos do governo, que agora rendem muito menos, está sendo direcionado para o setor produtivo. “As pessoas estão investindo mais em ações, e já se anuncia na bolsa abertura de capital de muitas empresas. Quando elas abrem capital, as pessoas compram ações e isso gera investimentos”, explica.
O aumento no número de vagas formais, no entanto, deve vir mais para o fim do ano, acredita Daniel Duque, pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV). Por enquanto, a recuperação ainda é convertida em empregos informais, os primeiros que reagem quando a atividade dá sinais de melhora, explica. “É o suficiente para gerar ocupação, mas não ao ponto de criar empregos em grande escala. O que as pessoas fazem é ir para a informalidade, porque conseguem manter pequenas atividades por conta própria, mas não encontram emprego formal ainda”, diz.
Kayo César Borges, 25 anos, se mantém na lista dos 38,8 milhões de brasileiros que se sustentam com empregos temporários, bicos ou por conta própria. O último trabalho que ele conseguiu foi em dezembro, sem carteira assinada, como em todos os outros nos últimos três anos. Enquanto enviava currículos e tentava marcar entrevistas, Kayo ficava na recepção de um salão de beleza, apenas nos fins de semana e “se tivesse demanda”, ressalta. O pagamento era por dia trabalhado, nada fixo.
O primeiro — e último — emprego com carteira assinada foi em 2017, como auxiliar de escritório. “O mercado é muito pouco flexível. Hoje além de indicação, tem que ter experiência, e poucos jovens têm, porque não dão oportunidade”, reclama Kayo. Ainda assim, ele percebeu uma melhora nos últimos meses. “Depois de muito tempo, comecei a ser chamado para entrevistas. É sinal de que o mercado deu uma melhorada. Em 2017 e 2018 não aparecia nem isso”, conta.
Confiança
O desemprego reage mais lentamente do que outros indicadores porque, no início da recuperação econômica, ainda falta confiança para que os empresários apostem em novas contratações. Ainda que a economia deslanche, é preciso manter um ambiente positivo de negócios, ressalta Zylberstajn. “O emprego depende da iniciativa privada, que precisa de confiança nas políticas do governo para, gradualmente, voltar a investir no país”, resume.
Quando a ocupação é promovida pelo investimento, cai a informalidade, afirma o economista da USP. “Não dá para imaginar, por exemplo, uma obra de infraestrutura sem contratação”, diz. Segundo ele, não há outro caminho para atrair investimentos: é preciso ajuste fiscal e privatização. Ele diz que a reforma previdenciária, sancionada em novembro do ano passado, já melhorou o horizonte.
Governo aposta em incentivos
O governo conta com mudanças nas leis trabalhistas para aumentar o número de contratações em 2020. Com a informalidade batendo recorde, a preocupação é gerar vagas com carteira assinada. Uma das iniciativas mais recentes do Ministério da Economia veio pela Medida Provisória nº 905/2019, que concede incentivos fiscais para empresas que contratarem jovens entre 18 e 29 anos em busca do primeiro emprego.O governo pretende gerar até 1,8 milhão de postos pela nova modalidade, chamada de contratação Verde Amarela, até o fim de 2022, quando a medida perde a validade. As empresas que aderirem terão menos encargos trabalhistas. Na visão de do professor da Universidade de São Paulo (USP) e economista da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) Hélio Zylberstajn, a política é “acertada e veio em ótima hora”.
“A parcela da população mais vulnerável ao desemprego é a dos mais jovens. As empresas preferem gente com experiência e acabam relegando jovens porque a contratação é cara”, avalia o professor. Ele lembra que a MP também pretende facilitar o acesso ao microcrédito, o que, nas estimativas dele, pode gerar até 4 milhões de empregos. “Ao estimular o crédito a quem é mais pobre, você dá condição de ele comprar uma máquina de costura, por exemplo, e começar a trabalhar”, explica.
Vários pontos da MP, entretanto, têm sido questionados. Alguns analistas dizem que a geração de vagas deve ser irrisória. Outros atacam, principalmente, a contrapartida para a contratação. A proposta inicial era de que o seguro-desemprego passasse a recolher Imposto de Renda para compensar a redução de tributos às empresas. O governo deve voltar atrás nesse ponto, devido à repercussão negativa.
Segundo o diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto, não ficou claro como o programa vai ser financiado nem o efeito no mercado de trabalho. Ele lembra que o programa Primeiro Emprego, implantado em 2003, similar ao Verde Amarelo, gerou 30 mil vagas em três anos. “Pode ser que (a medida) ajude, mas não é daí que vem a solução do mercado de trabalho. Tem que ter recuperação continuada e fundamentada em aumento de investimentos e produtividade”, reforça.
Daniel Duque, pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV), concorda que o efeito vai ser pequeno “e mais no sentido de deslocar emprego dos mais velhos para os mais jovens”. Mas, mesmo que esse seja o único efeito, ele pode ser positivo, avalia. “Atrasar muito a entrada de um jovem no mercado de trabalho é muito ruim e pode comprometer drasticamente o futuro dele”, pondera.