Em abril de 2016, a chef confeiteira Inaiá Sant;Ana iniciava uma nova etapa da sua vida: abriu a própria confeitaria em Brasília, voltada para um público de celíacos (intolerância ao glúten) e de alérgicos à proteína do leite. Com uma clientela bastante restrita e exigente, a nova empreitada começou a passos lentos, mas foi ganhando tração à medida em que eram realizados investimentos e análises de mercados. Naquele ano de estreia, o Produto Interno Brasileiro (PIB) recuou 3,6% no Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Apesar de toda dificuldade que a cercava, Inaiá seguiu firme e se dedicou bastante para manter seu sonho vivo e de pé. Diante da crise, não podia vacilar. Era preciso ter a certeza de onde estava se metendo. ;Sempre tive muita segurança e noção de que é preciso fazer as coisas sempre bem estruturadas, estudadas, pautadas, e, com meu negócio, não foi diferente;, diz. E essa postura vale para hoje. ;A todo momento, estou na confeitaria. Como tenho apenas uma loja, faço questão de acompanhar tudo de perto. Olho o movimento, observo o que está acontecendo e acompanho o mercado;, pontua.
Não é só. A receita de sucesso de Inaiá inclui um ingrediente preponderante: ter boas pessoas ao seu lado, sobretudo em momentos de dificuldades. É preciso ainda ter paciência. As pessoas precisam saber esperar os resultados. ;Tenho a consultoria do Sebrae, uma consultoria particular e, recentemente, contratei um consultor financeiro, que me ajuda bastante. Sabemos que a crise ainda não acabou, mas, quando você está bem preparado, consegue enxergar o mercado em que você está, não tem como dar errado. Quando entrei nesse negócio, não tinha a opção de dar errado;.
Cuidados
Comunicadora por formação, área que trabalhou por cerca de 15 anos, a chef largou tudo para se dedicar à gastronomia em 2014. Focou em aprender a arte da pâtisserie e realizou diversos cursos de especialização em preparos de pratos livres de glúten e lácteos. Começou testando as receitas em casa e, por três anos, trabalhou somente com encomendas para familiares e amigos. O incentivo para abrir a confeitaria veio do nascimento da filha, que apresentou sintomas de alergia ao leite. A empresária não queria que sua herdeira deixasse de comer doces por conta do problema.
A primeira loja da Quitutices era bem pequena e tinha apenas cozinha, balcão e quatro mesas. O carro-chefe da loja eram as encomendas. Como as guloseimas despertaram o interesse do público, muita gente passou a querer degustá-las no local. Inaiá, então, resolveu mudar de local e ir para um lugar maior, na Asa Sul. ;O modelo de negócio que escolhi foi de uma única loja, a melhor do segmento, com segurança alimentar. Hoje, muitas pessoas pensam somente em crescer, e se esquecem de cuidar da empresa, o que é extremamente importante;, ressalta. Mais: ;Investindo em quem está perto de você e não tratando seu funcionário apenas como um colaborador ou como um funcionário qualquer, você estará no caminho certo. Nada se faz sozinho nessa vida. É importante ajudar quem lhe ajuda;, receita.
Aprendizado
Com a crise econômica que o Brasil passou ; a recuperação segue lenta ;, os pequenos empreendedores temem pela instabilidade. Para a chef brasiliense Lídia Nasser, proprietária do Empório Árabe, não é diferente. Diante das turbulências na economia, ela precisou cortar o quadro de funcionários para tentar equilibrar as contas, que reduziu drasticamente. ;Quem disser que nunca passou por uma crise de uma forma negativa, está mentindo. A recessão foi algo que abalou todo o país. Foi muito difícil. Enfrentamos queda de faturamento de mais ou menos 27% no primeiro ano da crise. Ficamos muito apreensivos;, conta, ao lembrar do período mais difícil.
Lídia salienta que teve de adiar vários planos, pois só tinha em mente tentar sair do vermelho. ;Não consegui fazer os investimentos que gosto, no sentido de ampliar mais e diversificar os negócios, por conta da redução de pessoal. Isso foi um ponto que a crise me pegou de jeito, fiquei impossibilitada de fazer qualquer coisa;, afirma. Mas não desanimou. Neta de libaneses, a chef se interessou pelos sabores e temperos da Arábia ainda pequena. Nos almoços e jantares da família, ficava ao lado da avó paterna, Anitta Sertek Perides, para aprender a fazer pratos e doces da terra natal de seus familiares. O primeiro prato que conduziu sozinha foi arroz com lentilha.
O Empório Árabe começou em 2005, quando Miguel Nasser e Cleuda Perides, pais de Lídia, abriram um mercado de iguarias árabes em Taguatinga. Miguel queria colocar no Distrito Federal um pouco da cultura e da gastronomia do país de seus familiares. O projeto deu certo e, em poucos anos, o pequeno estabelecimento se transformou em dois restaurantes, um, em Águas Claras, outro, na Asa Sul.
Lídia reconhece que, com a crise, precisou mudar a forma de gerenciar os negócios. ;Agora, somos mais criteriosos na compra de mercadorias. Criamos um departamento para cotar preços, que variam de forma absurda. Esse mecanismo faz com que a gente analise melhor as mercadorias e encontre um bom valor. Antigamente, comprávamos alimentos para uma semana, hoje em dia, adquirimos para duas ou três. Assim, evitamos comprar toda hora;, declara. ;Acredito que minha passagem pela crise foi superpositiva, pois me ensinou a ser mais flexível e mais criativa. Comparo a crise à punição de um pai ou de uma mãe para o filho. A princípio, é ruim, mas, depois, você vê que aprendeu com aquilo.; (AP)