Jornal Correio Braziliense

Economia

Sinal de fumaça na indústria de cigarros eletrônicos

Marca dominante no mercado americano, a Juul Labs troca de presidente em meio a uma série de denúncias sobre os efeitos do dispositivo na saúde dos usuários

São Paulo ; As últimas semanas têm sido de muita apreensão entre os fabricantes de cigarros eletrônicos, ou vaping, como são chamados pelos usuários, com denúncias de mortes causadas pela utilização do dispositivo nos Estados Unidos e uma série de acusações por parte de governos e agências reguladoras. A empresa mais afetada por essas discussões é a americana Juul Labs, que domina aquele mercado, que já estava sob críticas por conta das acusações de que seu produto estaria aliciando adolescentes.

Com tantas notícias ruins, a companhia decidiu reagir e anunciou ontem que Kevin Burns, presidente-executivo da americana Juul Labs, deixou o cargo. No seu lugar, assumirá K. C. Crosthwaite, executivo da Altria, a maior empresa de tabaco, dona de uma participação de 35% no capital da marca de cigarros eletrônicos de São Francisco.

Nos Estados Unidos, a Juul tem enfrentado um ambiente regulatório cada vez mais restritivo tanto na esfera federal quanto estadual. Mais recentemente, passou a ser investigada criminalmente sobre suas práticas de marketing.

Ate agora, nove mortes foram associadas a doenças pulmonares causadas pelo uso de vaping. Os casos fizeram com que as agências de saúde pública notificassem sobre os riscos. Alguns pacientes informaram ter usado o cigarro eletrônico para o consumo de nicotina ou de THC, substância obtida a partir da maconha.

Discute-se a possibilidade de a Juul ser proibida de oferecer produtos aromatizados, o que aumenta a atratividade para o público mais jovem, segundo especialistas. Os cigarros eletrônicos da Juul cresceram no mercado doméstico americano especialmente pelo apelo recreativo, ao oferecer opções com sabores de hortelã, pepino e manga.

Toda a polêmica em torno do consumo por adolescentes levou a uma pressão popular contra os cigarros eletrônicos e colocou a Juul no centro do debate. Em julho de 2017, Burns, que agora se despede do comando da companhia, se desculpou pelo fenômeno que os cigarros eletrônicos desencadearam.

Questionado sobre o que diria aos pais de um adolescente viciado nos produtos da empresa, o executivo respondeu na época: ;Não é para eles. Espero que não tenhamos feito nada que tornem os dispositivos atrativos. Como pai de um jovem de 16 anos, sinto muito por eles e tenho empatia pelos desafios que estão a enfrentar;.

Ano e meio depois, em julho de 2019, James Monsees, cofundador da Juul Labs e líder da equipe de desenvolvimento de produtos, era chamado para ser ouvido por um comitê, para apurar ;o papel da Juul na epidemia de nicotina entre jovens;. O problema se agravou ainda mais em agosto deste ano, quando uma pessoa morreu após ter usado cigarros eletrônicos com sabores e outras 200 ficarem doentes por causa do mesmo produto. Agora, o número de doentes já se aproxima de 500, o que tornou a situação de Burns insustentável.

Uma outra crítica à qual a Juul foi submetida foi quanto ao slogan de sua campanha, o "Make the switch; (em inglês, faça a troca), o que foi interpretado pelo FDA (o Food and Drug Administration, órgão regulador americano semelhante à Anvisa) como uma tentativa da empresa de mostrar seus cigarros eletrônicos como mais seguros do que os tradicionais.

Toda essa discussão, que pode colocar em dúvida o futuro dos cigarros eletrônicos no mercado americano, ocorre ao mesmo tempo em que a Anvisa começou a debater, em audiências, a possibilidade de liberar a venda do dispositivo no Brasil. Quem acompanha o assunto de perto acredita que os casos de doentes e de mortos vítimas desses produtos poderão ter um peso importante na decisão da agência reguladora.

Aliança naufraga
Também na última quarta-feira, a Altria e a Philip Morris International informaram ter encerrado as negociações para fundir as companhias, que, juntas, valeriam cerca de US$ 200 bilhões. A Philip Morris também atua no mercado de dispositivos eletrônicos ; uma das marcas é o IQOS ; e já anunciou que, no futuro, pretende deixar os cigarros tradicionais para trás.

"Embora acreditássemos que a criação de uma nova empresa resultante da fusão tivesse o potencial de criar sinergias incrementais de receita e custo, não conseguimos chegar a um acordo", informou, por meio de nota, Howard Willard, presidente e diretor-executivo da Altria. "Estamos ansiosos para continuar nossa comercialização de IQOS nos EUA, de acordo com nosso acordo existente."