Autor do texto da proposta de reforma tributária encampada pela Câmara, a PEC 45, o economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), crê que o ambiente está mais favorável à criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que abarca tributos sobre consumo de União, Estados e municípios. Ele contesta a posição da equipe econômica de Jair Bolsonaro, de começar a reforma só com a criação de um IVA dos tributos federais.
Em entrevista ao Estado, Appy, lembrou que os secretários de Fazenda dos Estados divulgaram manifesto para marcar posição de que não aceitam uma reforma sem o ICMS (tributo estadual). Para o economista, a implantação de um imposto único federal, proposto pelo Instituto Brasil 200, seria um "desastre". A seguir, os principais trechos da entrevista.
Os Estados apoiarão a PEC 45?
A carta dos secretários de Fazenda diz que os Estados apoiam a PEC 45 com mudanças. Eles pedem um fundo de desenvolvimento regional e um de compensação de perdas. Querem que o IBS (nome do imposto único) tenha três alíquotas, em vez de uma, e tratamento diferenciado para a Zona Franca de Manaus. Querem ainda que a União não participe do comitê gestor do imposto e querem substituir o ICMS por um IVA moderno com uma base ampla e tributação no destino.
Quais as diferenças entre a PEC e a proposta dos Estados?
Estranhamente, eles estão defendendo três alíquotas fixas e iguais. A PEC 45 dá autonomia para os Estados fixarem alíquotas. Eles falam que, se a discussão caminhar para a posição da União de criar um IVA federal, só aceitam se tiver um IVA estadual e um imposto sobre vendas e varejo municipal. Nas duas opções, os secretários deixam claro que querem substituir ICMS por um IVA.
Dá para conciliar a posição dos Estados com a PEC 45?
Acho que sim. Obviamente que preferimos um único imposto, mais fácil para o contribuinte. Mas nenhuma das posições dos Estados é radicalmente contraditória à PEC 45.
Por que é ruim fazer em etapas, como quer o governo?
Para o contribuinte, é mais simples ter um único imposto. Achamos o modelo da PEC 45 tecnicamente melhor. Se politicamente for necessário fazer mudanças, desde que não descaracterize (o texto), o Brasil sai beneficiado.
O sr. acredita que a posição dos Estados de uma reforma mais ampla é firme?
Eles sabem que o ICMS será cada vez mais uma base de financiamento menos relevante dos Estados. Isso ocorre porque a economia tende a ser cada vez menos de mercadoria e cada vez mais de serviços. Hoje, a locação de bens não paga ICMS ou ISS (tributo municipal). Essa é uma área cinzenta que tende a ficar cada vez maior e coloca os Estados numa situação muito delicada.
Como fica o setor de serviços?
O setor de serviços para empresas não será prejudicado. Na verdade, será beneficiado. Isso porque hoje paga ISS e não gera crédito. Com o IBS, vão pagar um imposto maior, mas vão recuperar o crédito integral. Na soma, entre o imposto pago pelo prestador do serviço e o recuperado na forma de crédito, vai diminuir a carga tributária. Esse é um ponto importante para entender o IBS, que tributa o consumo. A empresa no meio da cadeia apenas recolhe o imposto.
E os serviços prestados para o consumidor final?
Parte importante dos serviços ao consumidor final, como oficina mecânica e cabeleireiro, está em regime simplificado. Isso vai continuar. Mas parte dos serviços é prestada por empresas de maior porte é de telecomunicações, como Netflix. Por que Netflix tem de pagar imposto menor do que sapato? Outro ponto relevante é que as famílias ricas consomem mais serviços do que as pobres, enquanto as pobres consumem mais mercadorias.
A reforma em duas fases do governo federal não dificulta a aprovação?
Se o ambiente político é favorável à reforma ampla, não vejo razão de o Executivo se opor. O discurso de que politicamente é mais difícil fazer uma reforma ampla é verdade. Mas o Congresso sinaliza que está disposto a discutir a reforma ampla. Os Estados também. Não consigo entender o posicionamento do governo. Os Estados não querem deixar a discussão do ICMS para depois.
Como é a sua proposta da desoneração?
Aqui talvez exista divergência. Mas é posição minha, não do Congresso. A melhor forma de desonerar a folha é retirar da folha as contribuições não estão vinculadas aos benefícios, (como) Sistema S, salário-educação, Sebrae e Incra.
O que o sr. acha da CP, nova CPMF, defendida pelo Ministério da Economia?
É uma opção e pode haver outras para financiar a desoneração da folha. Não existe imposto bom, só menos ruim.
E a proposta de Imposto Único do Instituto Brasil 200?
Uma CPMF com alíquota baixa talvez não seja muito distorciva. Uma CPMF com alíquota alta é um desastre.
Críticos da sua proposta dizem que seriam criadas mais de 5 mil alíquotas diferentes...
Imagina! A proposta mantém autonomia da União, Estados e municípios para fixar alíquotas, (mas) o imposto é uma alíquota só para todas as mercadorias e serviços - se o município baixar alíquota, tem de baixar para tudo. Isso, do ponto de vista da operação do imposto, é simples, é uma tabela.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.