Ao logo desses 10 anos, o país sofreu a maior recessão da história, com o Produto Interno Bruto (PIB) caindo 3,8% em 2015 e 3,6% em 2016. O desemprego disparou, o endividamento das famílias cresceu e o investimento na economia se retraiu. Analistas acreditavam que, após a crise, a retomada começaria a partir de 2017 e ganharia força nos anos seguintes. Mas a previsão não se cumpriu.
O Brasil nunca demorou tanto, como agora, para sair de uma recessão, dizem especialistas. O país cresceu 1,1% em 2017 e em 2018, mas o ritmo caiu neste ano, mesmo com a expectativa positiva do setor produtivo em relação ao governo de Jair Bolsonaro, que sinalizou uma guinada para políticas liberais, de desburocratização e reformas estruturais. A economia deve avançar 0,9% de acordo com previsão dos analistas do mercado financeiro, divulgada no Boletim Focus, do Banco Central (BC).
O principal problema econômico do país hoje são as contas públicas, que estão no vermelho desde 2014. ;A aprovação da reforma da Previdência é essencial para sinalizar em direção à solução da crise fiscal do país ; que suporta uma dívida pública de quase 80% do PIB. Esse ponto é tão importante, porque um ambiente macroeconômico estável e capaz de incentivar os investimentos e a produção só é possível com o equilíbrio das contas públicas;, ressalta o presidente do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), Roque Pellizzaro Junior.
Rombo
Todo ano, o governo gasta mais do que arrecada, aumentando a dívida pública. Estudo da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado, aponta que o deficit fiscal só deverá ser eliminado em 2023. Ou seja, se a previsão se confirmar, o país terá nove anos de rombo nas contas do governo. De acordo com analistas, a explicação está na expansão dos gastos com aposentadorias e pensões.
Enquanto as despesas do governo federal cresceram quase 30% de 2014 para 2018, passando de R$ 1,05 trilhão para R$ 1,351 trilhão, o custo com o pagamento de benefícios previdenciários avançou 49%. Esses gastos têm consumido a maior parte do orçamento federal, o que, na prática, reduz o espaço para aplicação de recursos em diversas outras áreas, como educação e infraestrutura. Como consequência, há cada vez menos dinheiro para investimentos públicos, o que também contribui para o desaquecimento da economia.
O economista e professor Mauro Rochlin, da FGV, explica que a estagnação recente do PIB está relacionada com a falta de confiança de consumidores e empresários. Para o especialista, até o momento, o governo não conseguiu construir um ambiente de estabilidade fiscal, o que tende a ocorrer caso o Congresso Nacional aprove uma ;boa; reforma da Previdência, com impacto significativo na contabilidade pública. ;Se a reforma da Previdência for aprovada, o risco de o governo emitir moeda ou dar calote fica afastado. Isso é uma estaca importante;, diz. Ele ressalta, porém, que ainda há um débito do Palácio do Planalto em se empenhar em medidas de maior liberalização do ambiente de negócios.
Economistas afirmam que a reforma da Previdência é fundamental, mas não garante grande taxas de crescimento. O país sofre também com profundos problemas de produtividade, além de ter uma complexa carga tributária e encargos que atrapalham os negócios. Para atrair investimentos, será preciso uma ampla agenda de medidas para simplificar a vida de empresários do setor produtivo.
Rochlin explica que é difícil dizer quanto o país cresceria após a concretização da reforma da Previdência, mas ressaltou que tudo dependerá da força política do governo em implementar as mudanças necessárias. ;Aprovada, haverá a possibilidade de que o Banco Central atue com taxas de juros bem menores, obrigando agentes privados a bancar investimentos no setor produtivo em busca de maior rentabilidade;, diz. ;É preciso avançar para que as decisões de investimentos voltem a acontecer;, acrescenta.
Pellizzaro Junior afirma que há uma grande capacidade ociosa na economia, com empresários pouco propensos a investir e consumidores segurando os gastos. ;Nesse caso, uma situação alimenta a outra. Se o empresário não investe, não há empregos, a renda das famílias fica comprometida e, portanto, o consumidor não compra. Diante desse cenário, a confiança dos agentes permanece baixa e as vendas do varejo mostram resultados bastante inferiores aos patamares registrados em 2014;, compara.
É possível observar a fraqueza da economia nos índices setoriais divulgados pelo IBGE, que ficaram muito aquém do esperado neste ano. A indústria tombou 2,7% de janeiro a abril, em comparação com o mesmo período do ano passado. Na mesma base de comparação, o setor de serviços avançou apenas 0,6%, assim como o comércio. Os dados também contribuíram para diminuir o otimismo em relação à economia.
Mais pobre
Tanto é que os analistas do mercado financeiro reduzem as projeções para o crescimento do PIB deste ano há 16 semanas. Neste período, as perspectivas de expansão de 2019 recuaram de 2,48% para 0,93%. Pellizzaro Junior observa que o PIB per capita, que é a divisão de tudo o que é produzido no país pelo total de habitantes, está em nível bastante inferior a 2014, período anterior à recessão, o que mostra que a população está mais pobre.
Um estudo da FGV calculou que a ;nota média; de felicidade do brasileiro nunca foi tão baixa como atualmente. O índice tem como base dados de renda e bem-estar trabalhista. ;A renda real do brasileiro vem se recuperando de forma bastante lenta. Apenas no final de 2017, ela voltou aos patamares anteriores à recessão de 2014. O desemprego, por sua vez, atinge mais de 13 milhões de brasileiros e a ocupação formal vem mostrando resultados modestos, enquanto o número de subutilizados (a parcela da população que trabalha menos do que poderia) tem batido recordes. Ao lado disso, o consumidor vem enfrentando dificuldade para pagar suas contas, e o país soma hoje mais de 60 milhões de inadimplentes;, diz o estudo.
Com tanto enfraquecimento da economia, economistas passaram a prever a queda nos juros para estimular a atividade. No comunicado desta semana, o Banco Central preparou o terreno para criar um ambiente de redução da taxa Selic, atualmente em 6,5% ao ano. A autoridade monetária prevê uma inflação muito abaixo da meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que é de 4,25% para este ano e de 4% para 2020. As projeções do BC para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) são de 3,9%. Segundo o Copom, o cenário supõe uma trajetória de juros que encerra 2019 em 5,75% ao ano e se eleva a 6,5% ao ano em 2020.