Economia

Inadimplência cai, mas bancos aumentam juros para o consumidor

Mesmo com o índice de calotes atingindo o nível mais baixo desde 2011, instituições financeiras elevam as taxas cobradas nos empréstimos a pessoas físicas em fevereiro. Para analistas, concentração do mercado ajuda a explicar a alta

Beatriz Roscoe*, Marina Torres*
postado em 28/03/2019 06:00

Juros alrtos, porcentagem

Os juros para os consumidores dispararam em fevereiro sem qualquer justificativa lógica. Apesar de a taxa básica de juros, a Selic, estar na mínima histórica de 6,5% ao ano desde março do ano passado, e da inadimplência dos clientes ter diminuído, os bancos aumentaram os encargos financeiros, principalmente, no cartão de crédito, no cheque especial e no crédito pessoal não consignado.

A inadimplência é um dos motivos apontados pelos bancos para justificar o alto custo dos empréstimos no país. Em fevereiro, a taxa média de atraso de pagamentos das pessoas físicas recuou para 4,7% dos contratos, a menor marca da série histórica iniciada em 2011 pelo Banco Central. No entanto, a taxa média de juros cobrada pelas instituições financeiras aumentou 0,8 ponto percentual em relação ao mês anterior, totalizando 38,5% ao ano. Para as pessoas físicas, os juros subiram 1,9 ponto, ficando em 53,2% ao ano e o spread ; diferença entre o custo de captação e o valor cobrado nos empréstimos ; aumentou em 2 pontos percentuais.

Cartel

Para o professor de finanças públicas da Universidade de Brasília Newton Marques, os dados refletem um aumento da percepção de risco dos bancos, mas também a concentração do mercado. ;Emprestar dinheiro é um risco, então, as instituições financeiras elevaram as taxas. Mas puderam fazer isso porque funcionam como um cartel, uma crítica feita por vários setores. Por isso, há uma diferença abismal entre a taxa Selic e a taxa de juros dos bancos, uma vez que não há concorrência;, avaliou.

Ivaneide Barros, 53 anos, é autônoma e explica que já chegou a entrar no cheque especial e usar empréstimo consignado. ;Acompanhei uma vez os juros quando comprei um sofá em uma loja de eletrodomésticos. Quando vi, tinha gastado muito mais do que havia planejado. Acho que as empresas e os bancos deveriam explicar melhor essa questão dos juros;, disse.

Segundo José Matias-Pereira, professor de finanças públicas da Universidade de Brasília, os bancos operam na defensiva: ;O segmento financeiro, principalmente o bancário, está sempre em uma posição defensiva, muitas vezes, incompreensível. A taxa de juros está baixa, o nível de inadimplência está caindo, não existe lógica para continuar aumentando as taxas;, comentou.

A revendedora de cosméticos Corina Cunha, 35 anos, conta que usa basicamente cartão de débito. Ela nunca fez empréstimo consignado nem comprou parcelado com juros no cartão. Para ela, não faltam informações sobre o assunto. ;As empresas explicam, mas as pessoas não observam direito antes de utilizar o cartão,; opinou.

O professor de finanças Bolívar Godinho, da FIA e da Unicesp afirma que a taxa Selic não tem tanta influência na taxa de juros cobrada pelos bancos. ;A inadimplência determina mais as taxas dos bancos do que a Selic. Mas, se a inadimplência está em queda e os juros estão subindo, isso demonstra que os bancos ainda não estão confortáveis para emprestar dinheiro e não enxergam um cenário muito claro do que vai ocorrer daqui pra frente;.

Entre as modalidades de crédito mais utilizadas, os juros efetivamente pagos pelo consumidor no rotativo do cartão de crédito subiram de 286,9% ao ano, em janeiro, para 295,5% em fevereiro. No cheque especial, a taxa passou de 315,6% para 317,9% ao ano. Na modalidade de crédito pessoal não consignado, a taxa média foi de 119,1 para 119,3% anuais.

Em todas essas modalidades, a taxa de calote caiu ou se manteve praticamente estável. No cheque especial, a queda em fevereiro foi de 0,9 ponto percentual, para 13,3%. No crédito pessoal não consignado, recuou de 7% para 6,9%. No cartão de crédito, a inadimplência passou de 5,7% para 5,8%.

* Estagiárias sob supervisão de Odail Figueiredo

Nas alturas

Bancos sobem juros cobrados ao consumidor, mesmo com queda da inadimplência:

Taxa média de juros para pessoas físicas (% ao ano)

Set/18 52,0
Out/18 51,9
Nov/18 51,6
Dez/18 48,9
Jan/19 51,3
Fev/19 53,2

Cheque especial (% ao ano)

Set/18 301,4
Out/18 300,4
Nov/18 305,7
Dez/18 312,6
Jan/19 315,6
Fev/19 317,9

Cartão de Crédito (% ao ano)

Set/18 37,1
Out/18 36,0
Nov/18 35,4
Dez/18 33,9
Jan/19 35,0
Fev/19 38,3

Inadimplência Média (% dos contratos)

Set/18 5,0
Out/18 4,9
Nov/18 4,8
Dez/18 4,8
Jan/19 4,8
Fev/19 4,7


Fonte: Banco Central

  • Abecs lança crediário com cartão

    Os consumidores têm mais uma opção de financiamento na praça. A Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) anunciou uma nova modalidade de crediário com cartão de crédito, em que o parcelamento é feito diretamente pelo banco. A simulação da operação poderá ser feita na própria maquininha antes da contratação. Assim como outras operações de crédito, o crediário no cartão também terá juros, que dependerão do grau de risco ; baseado no histórico do consumidor. As quantidades máximas de parcelas vão ser definidas pelo banco emissor do cartão. Segundo a Abecs, há quatro bancos habilitados para ofertar a nova modalidade: o Bradesco, o Itaú, o Santander e o Banco Votorantim.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação