Nove governadores encerraram seus mandatos em 2018 com um rombo de R$ 71 bilhões para os sucessores, segundo dados declarados pelos próprios Estados ao Tesouro Nacional. Não deixar dinheiro em caixa suficiente para bancar as despesas de sua gestão é prática vedada pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e criminalizada no Código Penal, sujeita a pena de um a quatro anos de reclusão, embora até hoje ninguém tenha sido responsabilizado formalmente.
A informação prestada pelos governos estaduais confirma a tendência apontada por levantamento do Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado, divulgado em dezembro, que já mostrava o risco de novos governadores herdarem um caixa no vermelho.
Os dados são o retrato da situação delicada das contas desses Estados, que continuam com folhas de pagamento atrasadas e negociam com o governo federal um pacote de socorro. O resgate que já está sendo desenhado pelo Tesouro pretende antecipar recursos via empréstimos à medida que os governos estaduais implementem medidas de ajuste.
Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Sergipe encerraram o ano passado com um rombo que soma R$ 67,9 bilhões. Em praticamente todos eles, faltou tanto dinheiro não vinculado (ou seja, que pode ser usado livremente em qualquer despesa) quanto vinculado (carimbado apenas para determinado gasto, como em saúde ou educação).
Outros dois Estados (Pernambuco e Tocantins) e o Distrito Federal deixaram um rombo somado de R$ 3 bilhões apenas em recursos não vinculados. Em tese, o dinheiro carimbado seria suficiente para cobrir essa insuficiência, mas, na prática, essa aplicação violaria a legislação. Ou seja, eles também descumpriram a regra de responsabilidade fiscal.
"O gestor assumiu obrigações financeiras sem a suficiente disponibilidade caixa para cumprir com essas obrigações, pois os recursos vinculados não poderão ser utilizados para honrar esses compromissos", explicou o Tesouro Nacional em resposta ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado.
Procurados, os Tribunais de Contas Estaduais do Distrito Federal, do Rio e de Minas Gerais informaram que seguirão o cronograma de análise das contas, cujo processo deve ser concluído no segundo trimestre deste ano. O TCE-MG informou ainda que, em caso de irregularidade, o parecer prévio pode recomendar a rejeição das contas e resultar em inelegibilidade eleitoral do ex-governador Fernando Pimentel (PT).
O TCE de Tocantins não quis se manifestar antes da análise das contas. Os tribunais de Pernambuco e Sergipe informaram que só poderiam dar uma resposta, nesta terça-feira (26/2). Os demais não retornaram. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Estados estouraram limite de dívida e gastos com pessoal
Com o agravamento da crise fiscal, sete Estados descumpriram limites de gastos com pessoal e de endividamento previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) em 2018. Os dados constam de relatório divulgado nesta segunda-feira, 25, pelo Tesouro Nacional. De acordo com o documento, Minas Gerais, Mato Grosso, Paraíba, Roraima e Tocantins gastaram mais do que o permitido com o salário de seus servidores no ano passado. Já Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul terminaram o ano com a dívida consolidada líquida acima do permitido pela lei.
Ao ultrapassarem os porcentuais impostos pela LRF, os Estados podem ficar impedidos de contratar operações de crédito e de receber transferências voluntárias da União. O descumprimento vem em um momento em que sete Estados declararam calamidade financeira. Desde o início do ano, Goiás, Roraima, Rio Grande do Norte e Mato Grosso declaram situação de calamidade financeira. Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul estão na mesma situação desde 2016.
Os Estados pressionam por mais um socorro do governo federal e a equipe econômica já prepara um novo programa, como mostrou o Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado, para que governadores consigam dinheiro novo no curto prazo, permitindo a antecipação de recursos que serão obtidos ao longo dos quatro anos de mandato em troca da aprovação de medidas de ajuste fiscal.
O relatório divulgado nesta segunda foi elaborado pelo Tesouro Nacional com dados repassados pelos próprios Estados. A LRF determina que as despesas com pessoal dos Estados com os servidores do Executivo não podem ultrapassar 49% da receita corrente líquida. Os gastos de Minas no ano passado chegaram a 67%, do Mato Grosso a 58%, Paraíba 51%, Roraima 52% e Tocantins 57%.
Outros três Estados - Alagoas, Piauí e Santa Catarina - estão justamente no limite de 49%. No total, dez Estados ficaram acima do chamado limite prudencial, que é de 46,55%.
A LRF também limita o tamanho da dívida consolidada líquida, que não pode ser maior do que duas vezes a receita corrente líquida. No Rio Grande do Sul, o endividamento atingiu 223% e, no Rio de Janeiro, 262% da receita.
O gasto com inativos representou quase a metade das despesas de Estados como São Paulo (49%), Minas Gerais (45%), Rio de Janeiro (43%) e Pernambuco (43%).
Punições
A LRF prevê punições para Estados que estiverem desenquadrados. No caso do teto para gasto com a folha de pagamento, os governadores têm dois quadrimestres para se enquadrarem antes de sofrerem punições. Já o Rio Grande do Sul, que descumpriu, o limite para a dívida, tem três quadrimestres para se enquadrar e já fica imediatamente proibidos de fazer operações de crédito. O Rio de Janeiro fica de fora das penalidades porque aderiu ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que prevê uma série de obrigações para o Estado ajustar as contas em troca da suspensão do pagamento da dívida por seis anos.
Para o economista Felipe Salto, presidente da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, o problema fiscal dos Estados é mais grave do que o da União e tem origem no aumento dos gastos com salários de ativos e inativos. Ele lembra que a reforma da Previdência será importante para ajudar a socorrer os Estados, tanto pelo lado da receita, ao permitir que governadores fixem alíquotas maiores de contribuição previdenciária, quanto pela despesa, ao aumentar a idade mínima para a aposentadoria.
Procurado, o Rio de Janeiro lembrou que está sob o Regime de Recuperação Fiscal e que adota medidas de aumento de receita e de redução de despesa para "reequilibrar as finanças estaduais e retomar os índices previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal". Os demais Estados não se pronunciaram.
Na quarta-feira, 27, o Supremo Tribunal Federal inicia julgamento que pode dar aval a governadores para reduzir jornada e salários de servidores públicos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.