Se todos os projetos previstos no Plano Nacional de Logística (PNL), do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), forem concluídos até 2025, a situação rodoviária do país pode ficar pior do que está hoje. Isso porque o PNL não contempla a manutenção das estradas, e mais da metade estará em péssimas condições até lá. A conclusão é do pesquisador da Fundação Dom Cabral (FDC) Paulo Resende, coordenador da Plataforma de Infraestrutura em Logística de Transportes (PILT). ;Estão construindo puxadinho em casa velha, quando é possível investir R$ 300 bilhões até 2035, com 70% de recursos privados, para otimizar o setor;, alertou.
Pela estimativa do pesquisador, com esse montante, do qual a participação de recursos públicos seria de R$ 90 bilhões, diluídos em 17 anos, é possível reduzir o custo com transportes em R$ 31 bilhões por ano em 2035. ;O investimento se paga em 10 anos;, disse. Para se ter um comparativo, o projeto do presidente eleito Jair Bolsonaro para infraestrutura prevê investimentos de R$ 180 bilhões em 2019, o que é considerada uma meta bastante ambiciosa por vários especialistas. ;É possível fazer muito mais com a metade do dinheiro;, defendeu Resende.
Segundo o estudo inédito desenvolvido pela PILT, da forma como estão no PPI ; que o novo governo promete aproveitar ; , os projetos não vão mudar a matriz de transporte nacional a ponto de tirar o peso das rodovias e tornar a distribuição entre os modais mais equilibrada. Para chegar a essa conclusão, Resende explicou que a plataforma minera o Big Data, a partir de dados de vários órgãos governamentais, entre eles, a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), o Ministério dos Transportes e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). ;O conceito do estudo é de demanda por infraestrutura, baseado em rigor técnico, transparência e imparcialidade, sem dinheiro público e sem ingerência do setor privado que o financiou;, detalhou.
A partir da Matriz de Origem e Destino (MOD) desenvolvida pela EPL em 2015 e de acesso a dados privados, com ajuda da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), a pesquisa avaliou mais de 195 mil quilômetros (km) de estradas, responsáveis por 89% do tráfego brasileiro, e 19 mil km de ferrovias, além dos modais aquaviário e dutoviário. ;O que se percebe é que temos rodovias de nível Bélgica, concentradas em São Paulo e estradas péssimas, nível Índia, por todo o país;, afirmou, fazendo referência à ;Belíndia; ; termo elaborado pelo economista Edgar Bacha para designar o Brasil como uma nação desigual, com características, simultaneamente, de país desenvolvido e de terceiro mundo.
;Não dá para fazer tudo, então é preciso priorizar a partir da demanda. Há estradas que não têm movimento, não é preciso investir ali. É necessário, isso sim, elevar a qualidade de rodovias mais importantes, e apenas tapar buracos nas que não têm movimento;, disse. Assim, dos quase 200 mil km de rodovias, 80 mil estão em estado péssimo, mas não têm um volume de demanda que justifique investimentos pesados. ;É preciso concentrar esforços nos outros 120 mil km e elevar o nível de serviço das rodovias com mais tráfego;, destacou.
O professor explicou que a PILT trabalha o conceito de corredor logístico, considerando um crescimento de demanda de 43% até 2035. ;A ideia é focar custo-benefício. Em infraestrutura, o setor público prioriza o benefício e o setor privado, o custo. A nossa plataforma considera os dois, sendo o benefício monetário e de eficiência;, afirmou.
As comparações do estudo avaliam um cenário pessimista, se nada for feito, um moderado, a partir dos projetos previstos até 2025, e um otimizado, considerado o melhor. Esse último prioriza onde está a demanda, o que permite reduzir a representatividade do modal rodoviário de 56,6% para 47,7%, e aumentar a participação das ferrovias, de 17,3% para 36,7% (veja quadro).
Outro lado
O secretário adjunto do PPI, José Carlos Medaglia Filho, disse que, embora a Fundação Dom Cabral declare usar a base de dados produzida pela EPL, não pode afirmar que suas conclusões estejam corretas, uma vez que a entidade pode estar usando premissas diferentes, e ainda não apresentou o trabalho para apreciação completa dos técnicos da empresa. ;De qualquer forma, não podemos opinar sobre estudos que utilizem outras metodologias, desconhecidas por nós. Nós conhecemos e confiamos no PNL para a aperfeiçoar, a longo prazo, a infraestrutura do país;, afirmou.Procurada, a EPL disse não ter tempo hábil para explicar por que o PNL não contempla a manutenção da infraestrutura existente. A ANTT ressaltou que é responsável por fiscalizar e regular um universo bem menor do que os 200 mil km avaliados, de apenas 10 mil km. E o Ministério dos Transportes informou que o PPI responderia pela pasta.