São Paulo ; Às vésperas de completar 30 anos, Yonathan Yuri Faber tinha acabado de se mudar da Califórnia para Nova York e enfrentava problemas no casamento. Como a psicóloga que o atendia morava no Brasil, ele decidiu fazer as sessões por WhatsApp. A experiência deu tão certo que foi transformada em empreendimento. Três anos depois, o FalaFreud ; que conecta psicólogos e pacientes por texto, áudio e vídeo ; tem mais de 2 mil usuários pagantes.
No app, o usuário faz o teste com um robô para identificar o melhor tipo de tratamento, recebe uma lista de psicólogos disponíveis e escolhe o que considerar mais adequado. Por uma assinatura mensal de R$ 159, pode mandar mensagens 24 horas por dia, sete dias por semana ; o psicólogo não precisa responder de imediato. Por mais R$ 80 mensais, pode fazer sessões em vídeo.
O FalaFreud fica com 35% a 40% do valor e repassa o saldo ao parceiro. Um psicólogo na plataforma costuma atender de 20 a 30 pacientes ao mesmo tempo, e apurar remuneração média de R$ 4 mil por mês. A empresa não informa qual é o número de profissionais cadastrados, mas diz que há mais de 7 mil na lista de espera por uma vaga.
A plataforma acaba de receber aporte de R$ 2 milhões da Domo Invest, empresa gestora de venture capital que tem por trás nomes como Rodrigo Borges, fundador do Buscapé, Guga Stocco, ex-Buscapé e ex-head de inovação do Banco Original, e Gabriel Sidi, que foi da Odebrecht Realizações.
Esta é a segunda rodada de investimentos desde a criação do aplicativo. Parte do capital veio do 500 Startups, um fundo do Vale do Silício que colocou US$ 300 mil na empresa há cerca de um ano. Para dar o pontapé inicial, Faber colocou US$ 50 mil do próprio bolso.
Com os recursos da Domo, o FalaFreud quer investir em marketing e ingressar no mercado B2B (de empresa para empresa), entrando na rede de cobertura dos planos de saúde. ;Antes não tínhamos produto para chegar aos planos;, afirma Faber. ;Agora temos nome, dinheiro em caixa e informações de mais de 500 mil pessoas que já usaram o aplicativo.; Um usuário do FalaFreud costuma fazer tratamento de cerca de quatro meses na plataforma.
Nos Estados Unidos, diversas companhias já possibilitam, há anos, trocar o divã pela tela do computador ou do celular. Fundada em 2012, a TalkSpace já captou mais de US$ 60 milhões e está a caminho de abrir o capital na bolsa. A BetterHelp, que nasceu no ano seguinte, foi adquirida em 2015 pela Teladoc, que oferece atendimento médico por vídeo e já vale US$ 4,6 bilhões na Bolsa de Valores de Nova York.
O FalaFreud foi pioneiro no Brasil, mas puxou uma fila. Hoje, divide espaço com startups como a Luzz e a Orienteme, que também atuam no modelo de assinatura, e plataformas como a Zenklub, que vende as sessões de forma unitária.
;Além de ter uma escala bem maior, o grande diferencial da FalaFreud é que foca num método específico e não apenas em conectar psicólogo e paciente;, afirma Gabriel Sidi, da Domo Invest, que analisou outras sete empresas do segmento antes de investir na FalaFreud.
Tratamento
Apesar do nome, o FalaFreud não oferece sessões com psicanalistas. Todos os psicólogos cadastrados seguem a linha cognitivo-comportamental, com foco na observação do comportamento do paciente e não em entender sua ;psique; ; é quase o oposto da psicanálise freudiana.
Pedro de Santi, psicanalista e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), diz que, por ser uma linha mais objetiva e breve, a terapia comportamental tem uma conexão maior com o atendimento on-line. Ele afirma ainda que a conveniência e o preço podem engajar pacientes que não iriam ao consultório. ;Um atendimento só por escrito ou voz elimina o contexto do comportamento do paciente e impede, por exemplo, que o psicólogo observe a linguagem corporal, que às vezes ajuda a entender as emoções;, afirma o especialista.
Segundo o criador do FalaFreud, o processo de seleção dos psicólogos é rígido: há uma triagem inicial (feita on-line) para analisar requisitos mínimos como experiência profissional e formação acadêmica. Depois, uma entrevista com um dos psicólogos da plataforma. E, por último, é organizada uma conversa presencial com a psicóloga-chefe do aplicativo, que dá o carimbo final.
Em seus dois anos de vida, a própria empresa já teve que passar pelo divã. Quando o FalaFreud surgiu, regulação do Conselho Federal de Psicologia (CFP) impunha uma série de restrições ao atendimento on-line, por exemplo, o número máximo de 20 sessões por paciente nessa modalidade.
Para driblar o problema, o FalaFreud chegou a mudar a forma como chamava os profissionais para sua plataforma, substituindo o termo psicólogos por terapeutas. No início deste ano, o CFP redigiu regulação que retirou as restrições, o que deu mais segurança ao negócio.