Jornal Correio Braziliense

Economia

Reformas e ajuste fiscal determinarão crescimento da produção em 2019

A seriedade de como o ajuste fiscal será tratado pelo novo presidente e o ritmo das mudanças nas regras tributária e da Previdência determinarão o investimento e o crescimento do setor produtivo no próximo ano, segundo especialistas

Independentemente de quem vencer as eleições, o cenário para a economia em 2019 ainda é incerto. As previsões para a taxa de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) do próximo ano começam a minguar aos poucos, porque o ritmo de retomada da atividade continua lento e abaixo da média de crescimento global. Atualmente, as projeções dos analistas ouvidos pelo Correio variam de 1,2% a 2,7%, ante os 3% do inicio do ano. E a maioria ainda deve reduzir as estimativas, como fez o Fundo Monetário Internacional (FMI), que diminuiu a projeção do PIB de 2,5% para 2,4% e pode não parar por aí.

Os analistas esperam o resultado das urnas para começarem uma nova rodada de ajustes. Na opinião dele, será preciso incluir na conta a forma como cada candidato trata a questão fiscal, que será fundamental para prever os rumos da economia. Resolvê-la é o principal problema do próximo governo, e, nesse sentido, a reforma da Previdência é considerada a prioridade zero para conter o ritmo de crescimento da dívida pública. Pelas estimativas do FMI, o gasto deverá chegar a 90,5% do PIB neste ano ; acima da previsão anterior, de 87,3% ;, patamar insustentável para países emergentes, cuja média deve ser inferior a 50% do PIB.

A agenda de reformas, avisam, é o que vai estimular ou não investidores e o setor produtivo, que continuam sem confiança na capacidade do governo em reequilibrar as contas. Vale destacar que apenas o saldo negativo do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) previsto para 2018 é de R$ 202 bilhões, valor crescente, e é bem maior do que a meta fiscal do governo federal deste ano, de deficit primário de até R$ 159 bilhões.

Para especialistas, mesmo se o governo cortar todos os gastos não obrigatórios daqui para frente, o que pararia a máquina pública, não cobrirá esse rombo nos próximos anos. Especialistas estimam que o ajuste fiscal que precisará ser feito pelo novo governo gira em torno de 5% do PIB. Para se ter uma ideia, a soma do deficit dos regimes de aposentadorias público e privado em 2017 foi de R$ 267 bilhões, ou 4,1% do PIB, e, neste ano, será bem maior, em torno de R$ 300 bilhões.

Na avaliação da economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, o PIB corre o risco de encolher no ano que vem se a agenda de reformas for abandonada pelo próximo presidente. Ela lembra que a melhoria nas expectativas dos empresários e do mercado é que definirá o ritmo de retomada nos investimentos, principal motor para o crescimento econômico sustentável. Um consenso entre especialistas é que a taxa de investimento em relação ao PIB no Brasil, de 16%, é muito baixa, pois, para o país conseguir crescer acima de 5% ao ano, seria necessário que esse indicador ficasse acima de 25% do PIB.

Para Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim, qualquer que seja o presidente da República terá que fazer reforma para estabilizar o crescimento da dívida pública. ;Se isso não acontecer, ele jogará a economia em uma nova crise que pode levar até cinco anos. O incentivo para a reforma é esse. O que vai ser diferente é como o candidato vencedor vai apresentar essa agenda e como o mercado vai reagir a ela;, alerta.

;O cenário está muito aberto no momento. Se o próximo presidente não conseguir aprovar a reforma da Previdência logo no primeiro semestre, isso vai gerar muita instabilidade, com um novo patamar para o câmbio, para a Selic, por exemplo;, explica Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos. Para ela, mesmo se houver a possibilidade de mudança no sistema de aposentadoria ao longo de 2019, não há garantia de que haverá uma estabilização das pressões no câmbio e nos juros ao longo do próximo ano, o que pode comprometer o crescimento. ;O quadro, no momento, está muito aberto e muito dependente do timing da reforma da Previdência. Se não houver aprovação no próximo ano, o quadro pode ficar bastante dramático para o Brasil;, completa.

Desfecho

Braulio Borges, economista da LCA Consultores, avisa que só mexerá nas previsões depois de 28 de outubro, mas adianta que o viés é de queda. ;Certamente vamos revisar nossas previsões para baixo, mas vamos esperar o desfecho do segundo turno. Está muito difícil fazer projeções no momento atual. Tudo pode mudar em uma semana ou em 15 dias;, resume ele, que, por enquanto, está com previsão de alta de 2,1% no PIB do ano que vem. Ele reconhece que a piora nas expectativas de curto prazo em função das eleições e a política interna é que vai ditar os rumos do mercado doméstico nas próximas semanas. A atual polarização entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), segundo estudos da LCA, parece elevar o risco de que a tensão nos mercados domésticos possa perdurar para além do período eleitoral.

Alessandra, da Tendências, lembra que o cenário mais pessimista traçado no início do ano está se concretizando, com a polarização entre a esquerda e a direita nas pesquisas. Ela reconhece que o risco de a economia não deslanchar é maior com a possibilidade de vitória de Haddad, se o programa defendido pelo PT for implementado. ;A previsão do nosso cenário base, que apostava em uma vitória de um candidato de centro, está cada vez menos provável e agora temos um viés de baixa. Em um cenário sem reformas alguma, é possível até que o PIB caia;, completa.

Conforme o levantamento feito pela Tendências sobre as possibilidades dos candidatos à frente das pesquisas no primeiro turno, a taxa de crescimento do PIB no ano que vem pode variar entre 0,6% e 1,7% (veja quadro). Pelas contas de Alessandra, a única certeza em 2019 é que a economia continuará crescendo abaixo do PIB potencial, que atualmente é inferior a 2% ao ano, pelas contas dela. Zeina também demonstra preocupação com a falta de coerência entre o discurso e o programa dos candidatos Bolsonaro e Haddad. ;Há muito ruído entre os candidatos e suas propostas, o que aumenta as incertezas sobre a retomada da economia;, lamenta.

Apesar de estar entre os mais pessimistas em relação ao crescimento do PIB no ano que vem, a economista-chefe da Rosenberg Associados, Thais Zara, acredita que o futuro presidente vai fazer alguma reforma, qualquer que seja o partido. ;A recuperação da economia será em ritmo mais lento nos próximos anos do que inicialmente estava sendo previsto. Estamos trabalhando com dois cenários. O primeiro, com alta de 1,5%, considera a aprovação de reformas de forma mais gradual. Mas, se a reforma da Previdência for aprovada ainda este ano, o resultado do PIB no ano que vem pode ser bem melhor, com alta de 2,5% a 3%;, explica.

Tripé

Para ela, o presidente eleito não poderá ignorar a necessidade de fazer reformas para equilibrar as contas públicas e, para isso, precisará manter o tripé macroeconômico, que consiste nas metas de inflação e de superavit primário; e no câmbio flutuante, sem querer inventar a roda. ;O risco maior do próximo governo está em fazer ou não as reformas. Se o novo governo não mantiver o tripé macroeconômico e não fizer o ajuste fiscal, o país volta para um quadro mais crítico. Acredito que todos os candidatos têm essa percepção de que o problema fiscal precisa ser solucionado;, destaca Thais.

Padovani, do banco Votorantim, também acredita que o próximo presidente não vai poder abandonar a agenda de reformas e o aumento do risco está condicionado à continuidade dela ou não, como destacou bem o cenário apresentado pelo Banco Central no Relatório Trimestral de Inflação (RTI) na última quinta-feira, reduzindo de 1,6% para 1,4% a previsão para o PIB deste ano, e colocando uma estimativa de expansão econômica de 2,4% para 2019. As incertezas em relação às eleições continuam minando a confiança do setor produtivo. Conforme dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o processo de recuperação do otimismo da indústria da construção que é um dos que ainda não conseguiram sair totalmente da recessão. O processo de retomada da confiança desse segmento, iniciado em junho, foi interrompido em setembro, recuando 1,2 ponto, para 50,4 pontos.

Jankiel Santos, economista-chefe do banco Haitong, defende que o próximo presidente vai ter um comprometimento com reformas e apresentará ;medidas críveis;, seja qual for o vencedor. ;Quero acreditar nisso. Se o cenário para o reforço na recuperação econômica vai ser baixo, o efeito estatístico pode ajudar a destravar alguns planos de investimentos que estão suspensos neste ano por conta da indefinição das eleições. Não é impossível crescer mais que este ano no ano que vem;, aposta.

;O risco maior do próximo governo está em fazer ou não as reformas. Se o novo governo não mantiver o tripé macroeconômico e não fizer o ajuste fiscal, o país volta para um quadro mais crítico;
Thais Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados

;Se o próximo presidente não conseguir aprovar a reforma da Previdência no primeiro semestre, isso vai gerar muita instabilidade, com um novo patamar para o câmbio para a Selic, por exemplo;
Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos