Deflagrada em março de 2017, a Operação Carne Fraca flagrou fiscais do Ministério da Agricultura recebendo propinas de frigoríficos e colocou em xeque a credibilidade da inspeção sanitária do Brasil, afetando principalmente as exportações. Até hoje, a imagem do País está arranhada. E, pior, não se descarta uma nova etapa da operação, sobre irregularidades cometidas antes da primeira ação da Polícia Federal.
Desde o ano passado, a pasta implementa um programa de compliance (conjunto de normas e procedimentos para evitar desvios de função) para reduzir os riscos de corrupção. É o primeiro do gênero a ser adotado por um ministério que interage diretamente com empresas, informou ao jornal O Estado de S. Paulo o secretário executivo, Eumar Novacki. No momento, está em curso uma auditoria sobre R$ 45 milhões em multas que foram canceladas ou reduzidas sem justificativa aparente. E 62 servidores foram flagrados batendo o ponto e saindo em seguida. Abaixo, os principais trechos da entrevista:
Um ano e sete meses depois da Operação Carne Fraca, em que pé está o programa de compliance do ministério?
Quando veio a operação, o programa já estava em processo de amadurecimento. Tivemos de adiantar. É o primeiro compliance na atividade "finalística" da administração pública. Ele é um dos pilares do nosso programa de governança e vem para deixar claro qual a política do órgão, nossos valores e as funções que temos a desempenhar. Criamos o código de ética do servidor, que diz como deve ser a relação dele com as empresas. Estabelecemos um canal para receber denúncias, inclusive de forma anônima. E estamos fazendo um mapeamento de riscos de corrupção.
Onde estão os pontos de vulnerabilidade?
Por exemplo, na aplicação de multas. Essa foi a primeira correção que fizemos, porque o sistema era falho. O fiscal podia lançar a multa e depois cancelar, e não ficava rastro. Se algum fiscal multou e depois negociou para tirar a multa, a chefia não tinha nem como saber. Ainda estamos aperfeiçoando, mas já detectamos uma inconsistência. Nesse momento, está em curso uma auditoria em algo em torno de R$ 45 milhões em multas que foram canceladas ou drasticamente reduzidas sem justificativa.
O mapeamento achou alguma outra área sensível?
Tem fiscais que estão há 20 anos no mesmo posto e, com o tempo, é inevitável criar relações com as empresas locais. Além disso, o trabalho cai na rotina e o fiscal não se prende mais a detalhes. Haverá uma recomendação para que haja rodízio. Isso é algo que vai desagradar, vai tirar pessoas da zona de conforto, mas vai dar mais eficiência e fortalecer o ministério. Na área administrativa, mapeamos problemas na emissão de diárias e gastos com combustível.
Há rumores no mercado de que existe uma lista de funcionários do ministério envolvidos em irregularidades, que teria sido entregue numa delação.
Não é segredo que as investigações continuam. O ministério tem fornecido todas as informações à Polícia e ao Ministério Público. O que vai ser e quando, não temos acesso. Precisamos é estar preparados.
Como?
Se tivermos de afastar, de tirar servidor, estamos nos preparando para não permitir que os frigoríficos parem. Isso de fato nos preocupa. E o nosso programa de compliance pretende evitar que novos casos aconteçam. O que aconteceu no passado não tem volta. Mas, se alguém cometeu erros vai pagar por eles.
E o caso dos servidores?
Quando implantamos o programa de compliance, começamos a receber denúncias que servidores vinham para cá, batiam o ponto e iam embora. Cruzamos os dados do ponto eletrônico com os da catraca na entrada do ministério. E encontramos 62 casos em que as ausências durante o expediente não se justificavam ou se justificavam parcialmente. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.