Para complicar o quadro, além de estarem mais endividadas e com problemas mais graves, Amazonas Distribuidora de Energia, Boa Vista Energia, Centrais Elétricas de Rondônia (Ceron) e Companhia de Eletricidade do Acre (Eletroacre) precisam da aprovação do Projeto de Lei n; 10.332/2018 para que as operações sejam viabilizadas. Aprovado na Câmara, o PL foi encaminhado ao Senado. No entanto, a liderança da Casa anunciou, na quarta-feira passada, que ele não será votado antes das eleições .
A decisão jogou um balde de água fria na Eletrobras, que precisa se livrar das distribuidoras para se tornar atrativa ao mercado, pois também está no Plano Nacional de Desestatização (PND). O conselho da estatal determinou a liquidação das companhias caso não sejam vendidas, o que pode tornar o cenário ainda mais dramático nos estados atendidos.
[SAIBAMAIS]Para o presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Júnior, nada muda, por enquanto. ;O leilão continua agendado para 30 de agosto e qualquer mudança será informada ao mercado;, diz. Porém, para o bolso do consumidor, o impacto pode ser imediato. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) abriu audiência pública para discutir uma proposta de revisão do orçamento de 2018 da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que prevê aumento de R$ 1,446 bilhão nas cotas anuais a serem pagas pelas concessionárias de distribuição de energia elétrica, com recursos recolhidos dos consumidores.
Para o presidente do Instituto Acende Brasil, Cláudio Sales, um dos motivos da insuficiência orçamentária da CDE diz respeito aos recursos da Reserva Global de Reversão (RGR). ;Isso é consequência direta do fato de a privatização das distribuidoras da Eletrobras não ter ocorrido no prazo previsto, porque elas estão se financiando com a RGR;, explica.
Apesar do quadro indefinido, o presidente da Eletrobras ainda espera vender as cinco distribuidoras. ;Talvez não consigamos as cinco por conta da Ceal, que depende do STF. Se não houver solução para isso, pode sair um leilão com as outras quatro;, garante. Ele também não considera ruim que a Cepisa tenha recebido apenas um lance. ;Os contratos estabelecem um conjunto de compromissos, como redução das interrupções de fornecimento de energia ao longo de cinco anos. O investidor teve de capitalizar a empresa no dia, com 30% dos investimentos do período, injetou R$ 721 milhões na companhia;, argumenta.
Descontos
Nos leilões, vence quem mais reduz a tarifa atual. No caso da Cepisa, a Equatorial Energia ofereceu desconto de 8,5%. ;Como é necessário um depósito em garantia para participar, a disputa se dá reduzindo tarifa, aumentando outorga e assumindo dívida de RGR;, explica Ferreira. Apesar do valor simbólico de R$ 50 mil para cada empresa, a Equatorial ofereceu R$ 100 milhões para o governo como bônus de outorga, e ainda assumiu uma dívida com a RGR de mais R$ 800 milhões.
Com a venda da Ceal suspensa pelo STF, o foco são as quatro empresas que dependem da aprovação do projeto de lei. Sales, do Acende Brasil, observa que nenhum dos ativos que estão sendo leiloados é ;fácil;. ;As empresas foram destruídas pela péssima gestão e pelo uso político. Chegaram a uma situação em que quase não têm valor. São ativos muito complexos. Não se trata de um leilão que terá multidão, como os de transmissão têm sido;, avalia.
;A Cepisa foi arrematada por uma empresa que tem sinergia, com ativos no Maranhão, estado vizinho. Isso talvez possa se repetir com as demais;, aposta Sales. Do ponto de vista da Eletrobras, a necessidade do leilão é evidente. ;O cenário alternativo, de liquidação, é o mais dantesco. A Aneel teria de leiloar a concessão limpa dos ônus da empresa;, estima.
Na opinião da advogada e economista Elena Landau, ex-conselheira da Eletrobras, o temor do mercado é compreensível dados os imbróglios jurídicos. ;A Ceal é tão atrativa quanto a Cepisa, mas criou-se uma insegurança, porque Alagoas quer receber R$ 1,7 bilhão. Eu, particularmente, acho que o estado não tem nada a receber. O governo fez uma venda em 1998 e o leilão deu vazio, porque as empresas foram passadas para a União em 1996. Não houve mais interessados e, a partir daí, foi tudo para a Eletrobras: investimentos e prejuízos;, conta. ;As outras quatro distribuidoras pertencem a uma região complicada e dependem do PL 10.332;, acrescenta.
Segundo a especialista, a distribuidora Amazonas é integrada (tem ativos de geração, transmissão e distribuidora) e, para que a distribuição seja privatizada, é preciso fazer uma cisão. ;O PL permite a desverticalização, então, precisa ser aprovado o mais rapidamente possível para permitir que a cisão seja feita a tempo;, avalia.
Elena lembra que o discurso contrário à privatização só causa prejuízo ao país. ;O discurso de que a privatização vai piorar o serviço é vazio. O consumidor já está malservido. As perdas da Amazonas chegam a 44%;, alerta. ;O que existe é um lobby de empregados e políticos, que querem manter o cabide de empregos. A Eletrobras tem salários três vezes maiores do que o setor privado;, revela.
O presidente da estatal admite a disparidade salarial. ;Claro que os empregados da Eletrobras são contra a privatização, porque a média salarial do mercado é de R$ 4,3 mil e eles ganham R$ 11,7 mil;, afirma. No caso da Cepisa, compara Ferreira, 3 mil empregados podem ter ficado insatisfeitos com a venda, mas 3 milhões de piauienses foram beneficiados com desconto de 8,5% na tarifa de energia elétrica.
Para o especialista em infraestrutura Miguel Neto, sócio do Miguel Neto Advogados, a liminar do STF que suspendeu a venda da Ceal promove insegurança. ;A Cepisa era a joia da coroa e teve só um interessado. Mesmo assim, acredito que o leilão das demais vai ocorrer. O governo vai seguir em frente porque o risco é a decepção de não vender. Mas não aposto em grande concorrência.;
No entender do especialista em energia Rodrigo Leite, da Leite e Roston Advogados, falta equilíbrio em relação à solvência e atratividade das empresas. ;Depois da Cepisa, vai ficar cada vez mais difícil. Provavelmente, a Amazonas não terá interessados porque é a mais problemática, mais endividada, coleciona mais passivos;, afirma. ;O investimento precisa ser grande para rentabilizar a empresa;, completa.