Mais de 60 mil poupadores já se cadastraram na plataforma digital criada para quem deseja aderir ao acordo relacionado às perdas sofridas em planos econômicos das décadas de 1980 e 1990. De acordo com estimativas da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a expectativa é de que até 3 milhões de pessoas possam ser beneficiadas com o acerto entre instituições financeiras e os depositantes. São cerca de um milhão de ações na Justiça envolvendo o tema. O pagamento dos prejuízos poderá injetar R$ 12 bilhões na economia ao longo de pouco mais de dois anos.
A medida beneficia pessoas que perderam dinheiro na poupança com a mudança monetária dos planos Bresser (1987), Verão (1989) e Collor 2 (1991). Alguns poupadores entraram há mais de 20 anos na Justiça para se recuperar do prejuízo. Com a demora de resposta do Judiciário, entidades representativas de bancos e de consumidores chegaram ao acordo, com mediação da Advocacia-Geral da União (AGU). O trato estabelece que os pagamentos serão feitos mediante um fator de correção para cada plano.
Até a manhã de ontem, 60.719 pessoas haviam se cadastrado na plataforma de adesão. A Febraban avalia que há uma tendência de ;intensificação; no ritmo do cadastramento. Só na última semana, por exemplo, foram feitos cerca de 1,5 mil pedidos. A expectativa do presidente da Frente Brasileira pelos Poupadores (Febrapo), Estevan Pegoraro, é de que, até o fim do ano, entre 300 mil e 500 mil pessoas terão aceitado o acordo.
;A aceitação foi muito boa. A grande maioria ficou muito satisfeita com o acordo. O que nós estamos ouvindo é que estão todos se preparando para se cadastrar, juntando a documentação necessária, que exige tempo, inclusive;, disse Pegoraro. O cadastramento termina em dois anos. O portal www.pagamentodapoupanca.com.br está disponível desde maio aos interessados.
Acerto benéfico
O administrador Fernando Oliveira, 50 anos, foi um dos que aceitaran o trato. O pai dele, que era titular da conta de poupança, faleceu. A mãe, que seria a beneficiária natural, tem mais de 90 anos e precisou da ajuda do filho para os trâmites burocráticos. Eles entraram com ação na Justiça em 2007 e, desde então, aguardavam uma decisão favorável. Com a notícia do entendimento entre bancos e poupadores, decidiram abreviar o processo. ;Fizemos logo a adesão ao acordo e já recebemos o pagamento;, disse Oliveira. ;Minha avaliação é de que foi um acerto benéfico. Sabe-se lá quando nós receberíamos o valor a que tínhamos direito;, observou.
O dentista Waldo Antônio Nahur, 80 anos, espera uma decisão da Justiça sobre as perdas financeiras há mais de 20 anos. O administrador Wagner Nahur, 53 anos, filho dele, que o representa, disse que o prejuízo foi grande. Eles também já receberam o valor e avaliam que, apesar de ele ser menor que o pleiteado, foi a melhor opção. ;Foi um presente de aniversário para o meu pai, no último dia 27. Ele teria que receber R$ 20 mil, mas o acordo permitiu receber R$ 9 mil. Foram anos de espera. Hoje ele usa para pagar o plano médico;, afirmou.
A advogada de Waldo Nahur, Michele Siqueira, o aconselhou a aceitar o acordo. ;A orientação ocorreu por conta do lapso temporal. Não temos previsão de como andaria a processo na Justiça, e, por conta da idade e das circunstâncias, optamos por aceitar;, explicou.
Efeitos
A economista-chefe da Serviços de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), Marcela Kawauti, afirmou que o impacto esperado de R$ 12 bilhões em dois anos será benéfico para a economia. ;Qualquer tipo de liberação de recursos ajuda a recuperação econômica. Sabemos que não haverá um efeito imediato muito grande, mas parte do que já está sendo liberado será convertido em consumo neste ano;, explicou. ;Outra parte será usada para organizar o orçamento e pagar dívidas. No caso de quem não tem conta em atraso, o dinheiro pode ser utilizado para fazer uma poupança. É importante ter organização financeira preventiva;, completou.
A expectativa das entidades envolvidas na negociação é de que 60% das pessoas tenham R$ 5 mil a receber, montante que pode ser sacado à vista. Valores acima disso são parcelados: de R$ 5 mil a R$ 10 mil, em uma prestação à vista e duas semestrais (com desconto de 8%); de R$ 10 mil a R$ 20 mil, em uma prestação à vista e quatro semestrais (com desconto de 14%); acima de R$ 20 mil, uma prestação à vista e quatro semestrais (com desconto de 19%). O acordo só vale para quem entrou na Justiça, de forma coletiva ou individual. As instituições financeiras vão bancar os honorários dos advogados.
Para acessar a plataforma, é preciso criar um login (com o número do CPF e e-mail) e uma senha. O advogado ou o defensor público deve fazer as habilitações ao acordo de seus clientes. No caso das ações coletivas, esse papel pode ser executado pelas entidades que ingressaram com a ação.
Cuidados
O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) alertou para os cuidados necessários na aceitação do acordo envolvendo bancos e poupadores. ;A adesão à plataforma e ao acordo é totalmente gratuita. Se alguém lhe cobrar qualquer valor (transferência, adiantamento, etc.) para dar início ao acordo, você está sendo vítima de fraude;, informou a entidade, em nota. ;Não assine qualquer documento que lhe for entregue sem antes mostrá-lo ao seu advogado de confiança ou à instituição que promoveu a execução em seu nome;, completou. Até o momento, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) não recebeu nenhuma notificação sobre problemas envolvendo advogados.