Jornal Correio Braziliense

Economia

Por que o Facebook perdeu US$ 119 bilhões em um só dia?

Maior queda diária da história do mercado acionário dos EUA é resultado da combinação da crise de imagem causada pela onda de fake news com a divulgação de projeções de crescimento pessimistas


O Facebook perdeu US$ 119 bilhões em valor de mercado e se tornou a empresa com a maior queda diária da história do mercado acionário dos Estados Unidos. A baixa ocorreu na quinta-feira (27/7), depois da divulgação dos resultados do segundo trimestre, no qual a companhia anunciou projeções pessimistas para o crescimento da receita e do número de usuários, além de redução na margem de lucro.

O balanço, divulgado após o fechamento do pregão de quarta-feira, desencadeou uma onda de vendas que fez as ações caírem mais de 20%, reduzindo o valor da empresa em US$ 128 bilhões. Ao longo do pregão de ontem, porém, a rede social comandada por Mark Zuckerberg conseguiu recuperar parte do terreno, encerrando o dia cotada a US$ 510 bilhões, com desvalorização de 18,96%. Na véspera, o valor total das ações era de US$ 629 bilhões.

A queda fez evaporar, em apenas um dia, um montante muito próximo ao valor total atribuído a gigantes do mercado como Nike (US$ 125,1 bilhões) e General Electric (US$ 114 bilhões). A desvalorização, além disso, superou o Produto Interno Bruto (PIB) de 133 países, entre os quais Equador, Marrocos, Uruguai e Ucrânia.

Somente o presidente executivo do Facebook, Mark Zuckerberg, contabilizou um prejuízo de US$ 15,4 bilhões e viu sua fortuna ser reduzida para US$ 67,1 bilhões. Com isso, ele caiu duas posições no ranking dos mais ricos do mundo elaborado pela revista Forbes. Agora, Zuckerberg está em sexto lugar, tendo sido ultrapassado pelo megainvestidor Warren Buffett (US$ 82,6 bilhões) e pelo dono da rede varejista Zara, Amancio Ortega (US$ 72,3 bilhões). O mais rico continua sendo Jeff Bezos, presidente executivo da Amazon, com patrimônio avaliado em US$ 148,6 bilhões.

Onda de notícias negativas

O tombo do Facebook pode ser visto como um desdobramento do caso da consultoria Cambridge Analytica, que colocou em xeque a capacidade da rede social de proteger a privacidade dos usuários. A consultoria obteve indevidamente informações de 87 milhões de integrantes da rede. No auge do escândalo, no início deste ano, o valor das ações do Facebook chegou a cair US$ 95 bilhões. Antes disso, a companhia já havia enfrentado críticas por permitir a propagação de notícias falsas durante a campanha presidencial dos EUA, em 2016.

A onda de notícias negativas fez o Facebook mudar as políticas de privacidade e segurança. Mark Zuckerberg teve de dar explicações nos EUA e na Europa. O trabalho de contenção de crise parecia ter sido bem-sucedido ; em três meses, a empresa conseguiu recuperar o valor que tinha antes da crise. No entanto, a conta chegou agora. ;A credibilidade do Facebook com investidores foi afetada. Se os resultados e projeções fossem bons, o impacto poderia não acontecer. Mas não foi o caso;, disse o professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Pedro Waengertner.


Usuários crescem mais lentamente

No fim de junho, o Facebook atingiu 2,23 bilhões de usuários ativos ; aumento de 1,54% na comparação com o primeiro trimestre. Foi o menor ritmo de crescimento em três anos ; e metade da média do período, que ficou acima de 3% por trimestre. Em mercados desenvolvidos, o resultado foi ainda pior: nos EUA, o número de usuários ficou estável, em 241 milhões. Na Europa, onde uma nova legislação de privacidade de dados entrou em vigor em maio, a rede perdeu 1 milhão de usuários, caindo para 376 milhões de cadastros.

Aos olhos dos investidores, esses números pesaram mais do que os dados financeiros do balanço, que tampouco entusiasmaram os analistas de Wall Street. No segundo trimestre, a receita da companhia atingiu US$ 13,2 bilhões, um avanço de 42% que, apesar de robusto, ficou abaixo do ritmo dos últimos períodos ; no primeiro trimestre, a métrica subiu 50%, por exemplo.

E não há previsão de melhora no horizonte. O diretor financeiro da empresa, David Wehner, informou que a receita deve continuar se enfraquecendo nos próximos trimestres. ;É uma combinação de fatores, entre câmbio, foco em novas experiências, como (as mensagens efêmeras) Stories, e (medidas para) dar mais poder de privacidade aos usuários;, disse, em conferência com investidores na quarta-feira.

Os números decepcionantes do Facebook contaminaram ações de outras empresas de tecnologia e limitaram os ganhos dos mercados acionários norte-americanos. O índice S 500, que engloba as 500 maiores empresas dos EUA, encerrou o pregão em baixa de 0,30%. O Nasdaq, que reúne as companhias de base tecnológica, cedeu 1,01%.

Diversas techs foram contaminadas pelo tombo da companhia de Zuckerberg: a Amazon cedeu 2,98%, a Apple caiu 0,31% e o Twitter teve baixa de 2,89%. Alguns analistas veem no episódio uma dimensão mais profunda. ;Parece ser o começo do fim da era FAANGs;, disse o estrategista-chefe de mercados da JonesTrading, Mike O;Rourke, citando o acrônimo que representa gigantes do setor, como Facebook, Amazon, Apple, Netflix e Google.