O anúncio de acordo costurado pelo Governo Federal com nove entidades que representam caminhoneiros, na noite desta quinta-feira (24/5), não foi suficiente para encerrar o movimento da categoria. No Distrito Federal, as ambulâncias do Samu só têm combustível para rodar até a noite de sábado (26/5). Já as caldeiras dos hospitais têm óleo para fazê-las funcionar até entre segunda (28/5) e terça-feira (29/5). Os ônibus também circulam com horário reduzido no DF hoje. Aeroportos estão sem combustíveis, voos seguem com atrasos e cancelamentos, e não há previsão para que a rotina de abastecimento seja retomada.
Em um posto de gasolina da Asa Sul, por exemplo, a Polícia Militar precisou ser acionada para intermediar e intervir em uma confusão entre motoristas. A briga começou quando motoristas passaram a chegar a pé, com galões em mãos, pedindo que os funcionários coloquem combustível.
No acordo anunciado ontem pelo Planalto, estão a diminuição da alíquota da Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre o diesel a zero e a redução de 10% nos preços do combustível nas refinarias por 30 dias seguidos, por meio de contrapartida entre a União e a Petrobras. "A Petrobras cumprirá esse compromisso por 15 dias. A partir do 16;, a União pagará por meio de um programa de subvenção econômica até completar um mês", disse o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia. Esse acordo mantém a política de preços da Petrobras e onera a União em cerca de R$ 350 milhões.
Apesar do anúncio, no pontos de paralisação o comunicado é visto pelos caminhoneiros como uma farsa. "Eles querem abaixar o preço do diesel por um tempo curto e ninguém vai cair nessa. Isso é uma mentira, queremos uma redução definitiva no preço para ficar compatível com o valor do frete", diz o caminhoneiro Paulo Roberto, 42 anos, que há 10 trabalha dirigindo caminhões e atualmente é dono de um caminhão tanque, que carrega diariamente combustível da Refinaria Gabriel Passos (Regap) para os postos da Grande Belo Horizonte.
Laurimar Mattar Pereira, de 52 anos, é motorista especializado em combustíveis e produtos perigosos há 22 anos e não classifica o anúncio do governo como um acordo. "Isso é um termo que foi colocado, mas que em momento algum é acordo com a categoria. Ele é completamente insuficiente diante das nossas demandas. Precisamos de uma política que possa atrelar o preço do diesel ao valor cobrado pelo frete, pois dessa forma está ficando inviável o transporte rodoviário de carga no Brasil", diz Laurimar, que também é vice-presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Combustível e Derivados de Petróleo do Estado de Minas Gerais (Sindtanque-MG).
Para o caminhoneiro Éder Maciel dos Santos, 37 anos, as entidades que assinaram o acordo não representam os caminhoneiros. "São pessoas que não são da classe e pelo que estou vendo o movimento vai continuar. O movimento é feito por pessoas que não são representadas por nenhum sindicato ou entidade. Essa proposta foi maliciosa para desestimular o movimento", afirma.
O arrocho nas contas dos caminhoneiros por conta da alta do óleo diesel e a discrepância em relação ao valor recebido pelos condutores pelo frete fez o motorista Ademir Santos, de 53, tirar a filha mais velha do curso de enfermagem que fazia na PUC/Minas. "Não dei conta de pagar. Não tem jeito, esse acordo anunciado não resolve nosso problema. Precisamos de anúncio que abaixe o preço a longo prazo. Em um ano o aumento que tivemos que arcar do diesel é muito alto, não tem nenhuma condição de trabalhar de forma digna desse jeito", diz ele.
O que dizem as entidades que assinaram e que não assinaram o acordo
Entre as nove entidades que assinaram o acordo com o Governo Federal, uma delas é a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA). Em nota, a CNTA informou que jamais aceitou pressões para suspender a paralisação e o documento com o governo só foi assinado para garantir que as propostas seriam mantidas caso a categoria as aceitasse. ;Diante disso, as entidades que assinaram o documento assumiram um único compromisso, de apresentar as propostas à categoria que está mobilizada nas rodovias para que cada local decida se isso é suficiente para suspender o movimento ou de continuar;, informou a entidade.
A instituição também disse que dentre as várias reivindicações que ainda persistem, destacam-se quatro mais urgentes: redução do ICMS sobre o diesel pelos estados, suspensão da cobrança de pedágio sobre eixo suspenso de caminhões vazios, votação no Senado do projeto de lei que trata sobre a pauta mínima do frete e também a votação o mais rápido possível do projeto para extinguir a cobrança de PIS/Confins sobre o óleo diesel.
Também em nota, o presidente da Associação Brasileira de Caminhoneiros (Abcam), José da Fonseca Lopes, que não assinou o acordo, disse que repudia o documento e, ao contrário de outras entidades, não trairá o movimento. Ele diz que a Abcam iniciou a mobilização pela paralisação após a falta de ações do Governo Federal em cima da demanda da categoria. ;Continuaremos firmes com pedido inicial: isenção da alíquota PIS/Cofins sobre o diesel, publicada no Diário Oficial da União;, afirma o presidente da entidade.
Veja o que foi anunciado pelo Governo Federal
Além da redução do valor pago pelo litro de óleo diesel por um período de 30 dias, o Planalto se comprometeu a assegurar a previsibilidade em eventuais reajustes para pelo menos 30 dias de antecedência. A tabela de frete será reeditada a cada três meses e não haverá reoneração da folha de pagamento do setor de cargas. Ações judiciais e multas aplicadas aos caminhoneiros em decorrência da paralisação também serão negociadas.