São Paulo ; A direção da Estácio, segundo grupo de ensino do país, passou as últimas semanas gastando sola de sapato com outro tipo de educação: a de seus próprios investidores. O balanço do primeiro trimestre revelou uma nova política de preços ; com as primeiras mensalidades a R$ 49 ;, que estremeceu a confiança do mercado na rentabilidade do grupo. No começo de maio, as ações da Estácio chegaram a cair mais de dois dígitos.
Agora, o CEO Pedro Thompson está tentando convencer os investidores de que eles entenderam tudo errado. O pomo da discórdia atende por DIS, sigla para ;Diluição Solidária;. Com o fim da farra do Fies e o consumo ainda fraco, captar novos alunos está cada vez mais difícil, o que tem levado todo o setor a adotar preços mais agressivos para atrair calouros.
Como as matrículas se estendem até março ; e neste ano, por conta de atrasos no Fies, invadiram o mês de abril ;, virou praxe a isenção ou a cobrança de tarifas módicas para as duas ou três primeiras mensalidades, que se referem a janeiro, fevereiro e março. Sem a colher de chá, o valor retroativo a ser pago na entrada seria muito alto, dificultando ainda mais as matrículas.
Foi nesse contexto que a Estácio anunciou sua nova política para este ano. Cerca de 75% dos calouros entraram pagando apenas R$ 49 nas primeiras mensalidades. O saldo restante referente a esses primeiros meses será parcelado ao longo do curso e corrigido apenas pela inflação.
Funciona assim: considerando um tíquete médio de R$ 800 e o prazo médio de duração dos cursos de 48 meses, quem entra em março e paga R$ 49 pelas mensalidades de janeiro e fevereiro tem um saldo restante de R$ 1.502 a quitar. Essa diferença é parcelada em 46 meses e a mensalidade passa a ser de R$ 832,70 (o saldo é corrigido apenas pela inflação).
As ações da Estácio despencaram mais de 5% no dia seguinte à divulgação. ;Na verdade, essa política de preços cria valor, mas só ficou claro desde o início para quem acompanhava bem de perto a companhia;, diz um gestor do mercado. ;Eles pecaram na comunicação.;
O problema foi ainda maior porque, pelas regras de contabilidade, a Estácio é obrigada a reconhecer o valor cheio dessas primeiras mensalidades ; o que inflou a receita e poluiu todas as métricas de comparação. O DIS respondeu por 14% da receita no primeiro trimestre, ainda que esse valor esteja longe de virar caixa.
;Houve uma desconfiança de que eles estavam criando uma falsa sensação de melhora, inflando as matrículas num período em que está muito difícil captar alunos;, diz outro investidor.
Tíquete médio
Num intervalo de 10 dias úteis, o CEO Pedro Thompson e a equipe de Relações com Investidores do grupo participaram de uma conferência do Itaú, de um almoço promovido pelo BTG e de conversas com analistas. A mensagem básica: a nova política de preços captura uma receita que vinha sendo deixada na mesa e adiciona 5% ao tíquete médio quando as parcelas são trazidas a valor presente.Uma das principais preocupações do mercado diz respeito à qualidade da base que está sendo atraída pelos preços baixos: quando a empresa começar a cobrar o valor cheio, o aluno não vai desistir do curso?
A empresa diz que não, e prova com dados do ano passado. Pouca gente havia se dado conta mas, em 2017, a Estacio já havia cobrado R$ 59 nas primeiras mensalidades na campanha de captação do primeiro semestre ; e sem parcelar o valor restante, simplesmente abrindo mão da receita. E a evasão, como mostram os balanços desde então, diminuiu.
Outra dúvida diz respeito ao provisionamento da inadimplência das mensalidades. A Estácio separou 15% da receita com o DIS, com base no histórico dos alunos que costumam abandonar o curso no primeiro ano e na probabilidade de recuperação dos créditos. Alguns analistas apontam que esse valor deveria ser mais próximo de 25% a 30%. A companhia disse que fará um acompanhamento mensal e ajustará as provisões se a inadimplência ficar maior do que o esperado.