São Paulo ; A agenda eleitoral e a burocracia vêm impactando o ânimo dos investidores do setor de infraestrutura. Ao todo, 101 projetos do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), o Avançar Parcerias, capitaneado pela Secretaria Especial do PPI, estão à espera de aprovações em diferentes esferas, como o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Congresso, para só então terem seus editais de concessão publicados.
Até agora, o PPI tem, segundo sua página oficial, 74 projetos concluídos e 101 em andamento. Desses, nove têm previsão de publicação do edital para no segundo trimestre de 2018 ; ou seja, dentro de mais 51 dias. No entanto, quatro deles ainda estão sob análise do TCU, em um processo que não tem data para acabar, o que torna a missão de cumprimento desse calendário muito difícil.
Mas não é só no curto prazo que há incongruências entre a meta do PPI e a sua viabilidade. Faltam 235 dias para terminar o ano. Nesse prazo, o governo espera esvaziar a pauta do PPI e colocar os 101 projetos nas mãos da iniciativa privada. O cronograma da Secretaria Especial do PPI começa com a fase de estudos, passa pela consulta pública, acórdão do TCU, publicação do edital, leilão, até chegar à assinatura do contrato de concessão.
Na primeira etapa do PPI, os investimentos foram de cerca de R$ 146 bilhões. Para este ano, prevê o governo, no caso de o calendário se confirmar, esse valor deve ser ligeiramente menor, de R$ 144,2 bilhões.
Para Maurício Endo, sócio-líder de Infraestrutura da KPMG para América Latina, 2018 será um ano de ;relativa frustração; para os investidores do setor. ;Este não será um ano totalmente perdido. Mas o volume de projetos será menor do que o registrado em 2017. Isso acaba sendo muito frustrante para os investidores que se prepararam para participar das concessões;, avalia o especialista.
O executivo explica que, para os investidores, é fundamental que o calendário de concessões seja ;mais confiável;. ;Eles olham oportunidades em vários países, montam suas equipes para acompanhar esses processos. Se o cronograma for alterado, eles podem perder o interesse e focar mercados com maior previsibilidade;, alerta.
Já o diretor executivo de Infraestrutura da EY, Gustavo Gusmão, avalia que os investidores contavam com a possibilidade de nem todos os projetos do PPI serem viabilizados em 2018. ;De certa forma isso estava precificado, mas não deixa de ser quase uma frustração não ter investido neste ano;, analisa. Diferentemente do executivo da KPMG, ele acredita que o Brasil não sairá do radar de quem tem dinheiro para colocar em projetos de infraestrutura por conta da velocidade aquém do esperado para o pacote de concessões do governo.
Atrativo
Pesquisa recente da própria EY apontou que o Brasil passou do oitavo para o segundo lugar entre os países com maior atratividade para os investidores. ;As empresas sabem que nessa área os projetos precisam de tempo para serem maturados, por isso esse atraso não vai comprometer os planos. Além disso, há a opção de elas escolherem outra forma de investir, por exemplo, por meio da aquisição de outras empresas;, explica. É o que se vê agora com o interesse de duas multinacionais ; Enel e Neoenergia ; pelo controle da Eletropaulo, distribuidora de energia com atuação na Grande São Paulo.
Segundo José Guilherme Souza, sócio da Vinci Partners, como a demanda por serviços de infraestrutura é muito grande no Brasil, ;faz todo sentido se debruçar sobre investimentos no setor, em especial no setor elétrico. Desde meados de 2017, temos percebido que os investidores estrangeiros estão colocando o país na lista de opções para o momento em que a poeira na política baixar, principalmente se o cenário for mais pró-mercado;, analisa.
Presidente da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Venilton Tadini lembra que algumas regulamentações que poderiam colaborar para um ritmo mais satisfatório no setor emperraram no Poder Legislativo. É o caso da medida provisória que prevê a devolução amigável de concessões, que ainda precisa de regulamentação sobre a forma como será feita a remuneração dos agentes. Ele cita ainda o caso da MP sobre a repactuação das rodovias e das outorgas dos aeroportos.
;Falta planejamento e clareza sobre a prioridade nos projetos de infraestrutura. Para piorar, o que já está na mão do Estado não vem sendo cuidado. Isso mata a competitividade;, analisa Tadini.
Segurança jurídica
Dono do maior volume de concessões do país, o Grupo CCR se mantém atento às oportunidades. Mas, segundo seu presidente, Renato Vale, além de recursos, é preciso contar com segurança jurídica. ;A infraestrutura representa o maior déficit de investimento no país e, na contramão dessa estatística, é, comprovadamente, necessário para que possamos voltar a registrar índices de crescimento na economia. Por esse motivo, acreditamos que promover recursos para projetos de infraestrutura é fundamental, porém, tão fundamental quanto é garantir segurança jurídica para os investidores, previsibilidade, cumprimento e transparência no marco regulatório e efetividade das políticas de investimento;, opina o executivo.
Segundo Endo, da KPMG, os investimentos em infraestrutura vêm encolhendo por falta de recursos do orçamento público. O ideal, segundo o Banco Mundial, é que 5% do Produto Interno Bruto seja destinado ao setor por ano. O Brasil já chegou a 2,4% entre 2014 e 2015. No ano passado o número foi de 1,5% do PIB e em 2016 foi de 1,7%, ou seja, os valores só encolhem. Para 2018, previsão é que fique entre 1% e 1,5% do PIB.
Por outro lado, tanto Endo quanto Gusmão acreditam que os projetos estaduais e municipais de infraestrutura poderão ganhar espaço em 2018 e 2019. ;Vemos a agenda municipal em andamento, mesmo que afetada pela agenda federal, com PPPs (parcerias público-privadas) de menor porte para projetos nas áreas de concessão de contratos de limpeza, transporte e iluminação;, diz o executivo da EY.
Consultada pela reportagem, a Secretaria Especial do PPI alegou indisponibilidade de agenda para atender ao pedido de informação.