Jornal Correio Braziliense

Economia

Vale busca no mercado nome de novo presidente: salário de R$ 12 mi por ano

Novo presidente terá o desafio de conduzir a reestruturação societária da maior produtora mundial de minério de ferro. Conselho de Administração busca nome no mercado, mas possibilidade de nomeação atender a interesses políticos não está descartada



Maior produtora de minério de ferro do mundo, a Vale está à caça do executivo de R$ 12 milhões por ano. O atual presidente da companhia, Murilo Ferreira, deixará o cargo em 26 de maio, quando termina seu contrato. O Conselho de Administração já anunciou a contratação de uma head hunter, empresa internacional de seleção, para encontrar um substituto. Em nota, o colegiado destacou que o nome será definido em linha com as atuais regras de governança corporativa. O salário milionário se justifica, dizem especialistas, pelo tamanho do desafio do próximo comandante da empresa, que terá que conduzir a reestruturação societária da Vale.

O processo, porém, pode não correr como previsto. Apesar de se tratar de uma empresa privada, o governo indica os presidentes porque detém uma golden share, que lhe confere poder decisório ; e é acionista majoritário ao participar da Valepar, holding que controla a Vale, com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e os fundos de pensão de estatais (veja a composição acionária no quadro ao lado). Se a sinalização do conselho se confirmar, o executivo de R$ 12 milhões pode ser o primeiro presidente nomeado sem interferência política. Mas, se pesarem mais as pressões da base aliada, sobretudo do PMDB mineiro, que quer mais espaço no governo Temer, ele poderá ser o último indicado pelo presidente da República.

[SAIBAMAIS]O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, chegou a afirmar que defende um executivo ligado ao mercado e sem ligações políticas diretas, como os presidentes da Eletrobras, Wilson Ferreira Júnior, e da Petrobras, Pedro Parente. O próprio presidente Michel Temer disse que não vai interferir na troca de comando da Vale. Nos bastidores, porém, comenta-se que o presidente está inclinado a escolher um executivo que trabalha na mineradora. Nesse caso, os nomes de Clóvis Torres, diretor de Recursos Humanos, de Luciano Siani, diretor Financeiro, e Peter Poppinga, diretor de Ferrosos, estariam no páreo.

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Para o mercado, no entanto, outros três nomes são mais fortes: Pedro Cafarelli, presidente do Banco do Brasil, Marcos Falcão, ex-executivo do Icatu, e Rômulo Dias, atual CEO da Cielo. Cafarelli é defendido por Benjamin Steinbruch, Falcão é o preferido de Rodrigo Maia e Dias tem o apoio do Bradesco, sócio na Vale.

No entender do economista-chefe do Home Broker Modalmais, Álvaro Bandeira, a Vale sempre foi a mais privada das empresas estatais. ;Sempre teve vida própria, mesmo quando era 100% estatal. A contratação de uma head hunter sinaliza que vai ser uma decisão de mercado e não de governo;, aposta. Bandeira considera a mudança muito importante para a companhia. ;Isso significa que vai abrir mais informações. Ela passou por um processo de venda de ativos que reduziu o endividamento;, lembrou.

Com mais governança corporativa, a empresa vai recuperar o valor de mercado mais rapidamente. ;O minério de ferro já esteve a US$ 180 a tonelada, caiu para US$ 30 e chegou a US$ 92 na semana passada. O mundo está em processo de recuperação econômica, e isso significa maior demanda por minério e commodities. A Vale é absolutamente competitiva em termos globais. Em breve poderá começar a estabelecer política de dividendos mais consistente;, avaliou Bandeira.

Na opinião de Marcelo Godke, sócio do escritório Godke Silva & Rocha Advogados, ;o salário do presidente não é problema numa empresa do tamanho da Vale, porque a missão dele será espinhosa;. ;Apesar da privatização, em 1997, o governo nunca perdeu influência na Vale. O ex-presidente da companhia Roger Agnelli (morto em um acidente de aviação em março do ano passado) entendia que não deveria entrar em outras atividades, como aço. Perdeu a queda de braço e saiu;, assinalou.

O especialista disse que, se a companhia quer empreender uma reestruturação de mercado, isso deve passar pelo fim da golden share, porque os interesses de governo não focam apenas em gerar lucro para os acionistas. ;Ela passa a ter função social, sofre pressão política quando demite para cortar custos;, enumera. Godke afirma que, se a Vale se tornar uma corporação realmente, terá um futuro brilhante pela frente. ;O conselho sinalizou a ida para o Novo Mercado (mais alto nível de governança corporativa da Bolsa de Valores de São Paulo);, destacou.

Para entrar no Novo Mercado, alertou o analista, será necessária uma incorporação reversa (quando a controladora é engolida pela subsidiária). ;Algumas questões não foram respondidas. Como serão adquiridas as ações preferenciais para serem transformadas em ordinárias (que dão direito a voto)? Na minha opinião, vão fazer uma oferta pública. Enquanto existir uma ação preferencial no mercado, a empresa não pode migrar para o Novo Mercado;, disse.

A missão espinhosa a que se refere Godke é justamente a compra das preferenciais. Tudo vai depender de quanto será pago por elas. ;A briga pode ocorrer sobre o preço. Pode haver conflito, reclamação na CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Se for do jeito que estão comentando, de pagar ágio de 10% para os majoritários, vai haver uma diluição injustificada dos minoritários. Isso é uma prática muito ruim. (O novo presidente) Já vai começar errando;, alerta.