Após quase seis anos à frente da Vale, o presidente da mineradora, Murilo Ferreira, anunciou ontem que deixará o cargo em 26 de maio, quando termina seu contrato. A sucessão coloca a mineradora no alvo de uma disputa política liderada pelo PMDB e o PSDB de Minas Gerais, Estado onde a companhia concentra boa parte de suas operações. A proliferação de notícias de que Ferreira estaria se movimentando nos bastidores para permanecer no cargo teria acelerado a saída do executivo.
"Posso garantir que nunca fiz incursões no meio político para preservar meu mandato", afirmou em conversa com jornalistas. "Felizmente não tenho a mosca azul do poder. Como diz a minha filha, a fila tem de andar". Segundo fontes, ele preferiu deixar a companhia antes de um desgaste maior, como ocorreu com seu antecessor, Roger Agnelli, falecido no ano passado, que viveu uma queda de braço com o governo do PT antes de deixar a Vale.
[SAIBAMAIS]A pressão em relação ao tema cresceu após o anúncio do novo acordo de acionistas, que pôs fim à Valepar, holding que controla a mineradora e reúne fundos de pensão estatais (capitaneados pela Previ), BNDES, Bradespar e Mitsui. A mudança tende a blindar a Vale, no futuro, de ingerência política. Por enquanto, porém, os sócios estatais ainda são majoritários, o que dá maior poder ao governo no processo. Segundo fontes, a busca por um substituto estaria sendo conduzida pelo presidente do BB, Paulo Caffarelli, e pelo presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco Cappi. A decisão final, entretanto, terá de passar pelo crivo do Planalto.
Visto como uma indicação direta da ex-presidente Dilma Rousseff, Ferreira ficou na berlinda desde o início de seu mandato, que coincidiu com um período de vacas magras para o setor. Em sua gestão, o executivo viu o preço do minério despencar de um patamar acima de US$ 100 para a casa dos US$ 30 a tonelada. Com a mudança de cenário, coube a Ferreira arrumar a casa, vendendo ativos e cortando custos (ver matéria ao lado).
Foi também na gestão de Ferreira que a Vale enfrentou sua maior crise, com o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, operada pela Samarco, joint venture com a BHP Billiton. O episódio gerou forte desgaste à imagem da companhia e, por tabela, à de Ferreira. No auge da tragédia ambiental, a Vale tentou se desvincular do acidente, alegando ser uma "mera acionista" da empresa.
Pouco antes, a passagem de Ferreira no conselho da Petrobrás já tinha gerado desconforto e questionamento de investidores. A relação do executivo com o governo federal também acabou arranhada quando ele decidiu abandonar o cargo na petroleira.
Comunicado assinado pelo presidente do conselho e da Previ, Gueitiro Genso, afirmou que o processo de escolha de um sucessor para o cargo terá o apoio de uma empresa internacional de seleção (headhunter), como previsto no atual acordo de acionistas. Na época da indicação de Ferreira, entretanto, o processo levantou a desconfiança do mercado pela rapidez com que foi executado. O martelo sobre o sucessor de Agnelli foi batido em 24 horas, prazo relâmpago em relação à média do mercado para esse tipo de seleção.
Jogo político
A bancada do PMDB de Minas Gerais defende o nome de Clovis Torres Júnior, atual diretor executivo de Recursos Humanos e Sustentabilidade da empresa e presidente do Conselho Diretor do Instituto Brasileiro (Ibram).
Parlamentares do PSDB, por sua vez, estão encampando o nome de Gesner Oliveira, ex-presidente da Sabesp e do Cade. No Ministério da Fazenda, foi também secretário de Acompanhamento Econômico e subsecretário de Política Econômica.
Na bolsa de apostas, vários nomes vêm sendo ventilados. Além de Torres, os diretores da Vale Luciano Siani (Finanças) e Peter Poppinga (Ferrosos) são cotados. A lista tem ainda Eduardo Bartolomeo, ex-Vale, contratado da Brookfield e conselheiro da Vale desde o ano passado por indicação do BNDES. Também estariam no páreo José Carlos Martins e Tito Martins, ambos ex-diretores executivos da Vale e candidatos ao cargo desde a saída de Roger Agnelli. O nome do diretor de estratégia da Petrobrás, Nelson Silva, que já esteve na divisão de ferrosos da Vale, também circula.
Esta semana, o vice-governador de Minas Gerais, Antônio Andrade (PMDB), relatou uma conversa com o presidente Michel Temer. "O presidente me disse que vai indicar um nome de mercado. Não vai ser um nome da bancada do PMDB, nem do Aécio Neves. Ou seja, não será ninguém partidário", afirmou.