São Paulo ; O economista Tony Volpon contava, faz tempo, com a dificuldade que o país enfrenta para a retomada do crescimento econômico. Isso se deve, na avaliação dele, a um erro fundamental na política econômica do governo do presidente Michel Temer: política monetária relativamente apertada e política fiscal frouxa.
Essa combinação impede, ele explica, que as empresas e os consumidores se livrem do endividamento que acumularam quando Dilma Rousseff estava no poder. E, nessa situação, não há investimentos nem compra de bens duráveis.
Volpon admite que o governo pode não ter espaço para o mix inverso, de aperto fiscal com cortes mais fortes de juros. ;Então, esta é a recuperação que vamos ter: lenta;.
Ele foi diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos do Banco Central (BC) entre abril de 2015 e julho deste ano. No próximo mês, concluirá a quarentena e poderá voltar ao mercado. Na última quinta-feira, ele concedeu ao Correio a primeira entrevista desde que saiu do BC.
Volpon participará no próximo dia 14 do Correio Debate ; Desafios para 2017. Também falarão no evento o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, o secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimentos, Wellington Moreira Franco, o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas Gomes, e o ex-diretor do BC Carlos Eduardo de Freitas.
Os brasileiros se perguntam hoje por que o país não consegue retomar o crescimento. Qual a explicação?
Muito da frustração que as pessoas têm com o nível de atividade ocorre porque estão comparando o que está acontecendo com uma expectativa excessivamente otimista que se criou lá atrás, no momento do impeachment. Acredito que muitas pessoas, inclusive no mercado, acreditavam que a mera troca de governo, a colocação de uma nova equipe econômica, já colocaria as bases para uma rápida recuperação da atividade. É algo que se baseou muito na alta dos índices de confiança, que ocorreu na época, e também na melhora das condições financeiras. Isso é necessário para uma rápida recuperação, mas não suficiente. Na época do impeachment, não havia reconhecimento de que o dano causado no tecido econômico pela experiência heterodoxa do petismo tinha sido tão profundo, que a recuperação ia ser tão lenta. A frustração, portanto, se deve a uma expectativa irrealista.
O mercado erra tanto assim, de forma emocional?
Constantemente. Entra sobretudo o viés político. As pessoas do mercado eram majoritariamente contra os governos petistas, especificamente o governo Dilma. Então, na felicidade do impeachment, houve um componente psicológico forte. No mercado, não há deuses. Muito pelo contrário.
Quais os problemas reais que enfrentamos?
Os danos causados pelo petismo na economia foram vários. Podemos começar pelas agências reguladoras, totalmente desestruturadas e submetidas a decisões do Planalto. Pode-se falar do que aconteceu com a Petrobras, que acabou danificando a economia etc. Do ponto de vista macroeconômico, o dano maior, que está impedindo uma recuperação mais rápida, foi o patrimonial causado às empresas, aos consumidores e, como estamos vendo, aos estados. Isso ocorreu porque, no período de 2012 a 2014, houve muitos incentivos públicos para que eles se endividassem. Tivemos no Brasil uma coisa muito peculiar: uma bolha de crédito incentivada pelo governo. Isso não é muito comum. Em geral, como se viu nos Estados Unidos, bolhas de crédito vêm do próprio mercado, com excesso de otimismo. O crédito já havia subido, com bons fundamentos, nos 10 anos anteriores. Mas, naquele final de processo, o governo entrou com tudo, via bancos públicos. Todos se endividaram, e, frente ao que é agora o nível esperado de receita, há uma recessão de balanço. A experiência internacional mostra que a recuperação em recessões desse tipo é muito lenta.
Por que a lentidão?
Antes de a pessoa consumir ou de a empresa investir, eles têm que resolver o problema causado pelas decisões do passado. Não estão partindo do zero. A melhora das expectativas e das condições financeiras não passou para a economia porque os canais estão bloqueados. Se não limpa os canos, não passa nada. O plano fiscal gradualista do governo está fracassando. Podemos voltar a ter uma situação como a de 2015, em que o mercado não acredita mais na sustentação fiscal e há um processo especulativo em cima disso.
O que deve ser feito agora?
A proposta de política econômica da nova equipe tem um certo vício de origem. A presunção é de que o ajuste fiscal tende a ser lento. As projeções do FMI (Fundo Monetário Internacional) são de deficits primários de 2,7% do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano, de 2,3% em 2017 e de 1,3% em 2018. Só se apertam as condições fiscais em 2018. Do lado da política monetária, o que se está fazendo é o que a gente pretendia no BC, não mudou: trazer a inflação à meta em 2017. Essa escolha de fazer a política monetária atingir o alvo em 2017, mas só começar a apertar o fiscal em 2018, singnifica um mix de política fiscal relativamente frouxa e política monetária relativamente apertada. Como o principal problema para a economia foi o dano para as empresas, os consumidores e os estados, na verdade, deveríamos ter um mix de políticas oposto a esse, aliviando juros. Não há espaço fiscal para resolver problemas de balanço. Acho que seria necessária uma política fiscal mais austera, de aumento de receitas e queda de despesas, com CPMF (Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira), corte de subsídios e de despesas. Teria de cortar gastos e aumentar a receita ao mesmo tempo.
Mas essa austeridade fiscal seria sustentável politicamente hoje?
Estou falando do ponto de vista econômico. Se não é viável, então esta é a recuperação que vamos ter: lenta, com muita pressão sobre o BC para acelerar a queda de juros. E, se acelerar, não vai conseguir colocar a inflação na meta. A equipe está fazendo um belo trabalho, mas o mix de políticas é errado para a reestruturação patrimonial de empresas, consumidores e governo. Se acelerar o processo de convergência fiscal, há espaço para o BC fazer cortes de juros mais agressivos. O Ilan (Goldfajn, presidente do BC) já sinalizou por meio de entrevistas um corte maior de juros em janeiro.
A matéria completa está disponível aqui, para assinantes. Para assinar, clique aqui