Jornal Correio Braziliense

Economia

'Crise política no Brasil é sobre dinheiro', diz presidente do Ipea

%u201CO tema da corrupção é posto de modo muito vago e impreciso para que possa ser usado quando for preciso%u201D, disse Jessé Souza

A crise política enfrentada no momento pelo Brasil é induzida por uma seleta elite econômica que busca ; por meio da compra de outras elites, de parte dos políticos e da mídia ; demonizar a política e o Estado, com o objetivo de tornar invisível sua própria corrupção, segundo análise feita pelo presidente do Instituto de Pesquisa Econômicas e Aplicadas (Ipea), Jessé Souza, em entrevista ao programa Espaço Público, da TV Brasil.

;Por que se demoniza o Estado? Porque tem os únicos cargos que em alguns momentos da história do Brasil se revelaram não compráveis;, disse o sociólogo. "A crise política que estamos vivenciando agora é uma crise sobre dinheiro", afirmou.

[SAIBAMAIS]Para Souza, autor de A Tolice da Inteligência Brasileira (Casa da Palavra, 2015), entre outras dezenas de livros, tal padrão de comportamento remonta ao passado escravocrata brasileiro, mas com o advento recente de ;uma tropa de choque, para dar uma aparência de apoio popular, que é a extrema direita da classe média;.

Levada por um preconceito classista oriundo do medo de uma competição vinda de baixo, essa fração mais conservadora da classe média encontraria vazão para seus temores em discursos de combate à corrupção aparentemente racionais, contudo seletivos: tal bandeira seria acionada sempre que surgisse, por meio do voto, alguma liderança capaz de conferir representação política às classes mais populares, que foram categorizadas na obra de Souza como a ;ralé;, diferenciada dos ;batalhadores; e da ;elite;.

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;O tema da corrupção é posto de modo muito vago e impreciso para que possa ser usado quando for preciso;, disse Souza. Se a pauta principal da atual crise política ;fosse o combate à corrupção, a gente não estaria fulanizando pessoas nem partidos, a gente estaria montando racionalmente uma nova estrutura para repensar o Estado e as relações do Estado com a economia. A grande ameaça a uma sociedade democrática é ela ser comprada pelo dinheiro, esse é o ponto, nenhum outro.;

Jogo do dinheiro

Na avaliação de Souza, uma elite econômica formada por poucas famílias deseja se valer de mecanismos oficiais e de mercado para se apropriar do orçamento do Estado e drenar para seus bolsos os recursos de toda a sociedade, visando o lucro selvagem imediato e desprezando as reflexões sobre como garantir a reprodução de tais riquezas a médio e longo prazo.

Para cumprir tal programa, essa elite exerceu seu poder econômico sobre as ciências sociais, para a construção de uma ideologia que demoniza o Estado, e também sobre a mídia, responsável por convencer a classe média através do discurso vago sobre a corrupção.

;A gente precisa saber que a ciência social brasileira montou um esquema liberal, de ataque ao Estado, um Estado que seria patrimonialista, que existiria uma elite dentro do Estado, que iria vampirizá-lo. Por quê? Porque se você diz que o mau está dentro do Estado, você torna invisível a real elite, a do dinheiro, que está fora do Estado;, disse o sociólogo. "Ninguém sabe o que é corrupção. Será que não são as taxas de juros que temos no Brasil, que são as maiores do mundo e representam uma drenagem gigantesca do produto do trabalho das pessoas para o bolso de meia dúzia? Isso é corrupção?", indagou.