Ninguém segura este país, pelo menos quando o assunto é alta de preços. O Banco Central (BC) apresentou ontem o Relatório de Inflação, com projeções mais elevadas do que na versão do trimestre anterior, divulgada em dezembro. E botou a culpa na deterioração das contas públicas. A expectativa predominante do BC é de que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) atinja 6,6% neste ano, ultrapassando, pelo segundo ano consecutivo, o teto, de 6,5%. Antes, a previsão era de 6,2%. Para o Produto Interno Bruto (PIB), a queda esperada é agora de 3,5% ; em dezembro, era de 1,9%.
;Tínhamos um cálculo de resultado fiscal em dezembro que apontava para a neutralidade. Quando recalculamos agora, caímos na faixa expansionista;, disse o diretor de Política Econômica do BC, Altamir Lopes, para explicar a mudança de expectativa do custo de vida. A esperança de superavit de 0,5% nas contas do governo, em dezembro, deu lugar à projeção de deficit de 1,6%, mas os números não constam do relatório.
As explicações não foram suficientes para convencer o mercado de que a autoridade monetária está fazendo o que lhe cabe para manter o poder de compra da moeda. ;A culpa é sempre dos outros, nunca do BC. É como um time de futebol dizer que não consegue ganhar o jogo porque choveu muito e a bola está pesada;, atacou o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor da instituição.
Pressões
O BC também procurou reforçar a ideia de que não vai baixar os juros se não houver condições para isso. No cenário de referência apesentado ontem, a Selic, a taxa básica estabelecida pelo Comitê de Política Monetária (Copom), continuará nos atuais 14,25% até o fim do ano. O documento menciona várias pressões de alta da carestia, além dos gastos públicos. ;O Comitê reitera que essas condições não permitem trabalhar com a hipótese de flexibilização monetária.;, diz o relatório.
A frase é mais forte do aquela usada na ata da última reunião do Copom. Não significa um compromisso de que não haverá alta, mas sugere que ela só ocorrerá se houver espaço para isso.
Na avaliação da economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, é necessário extremo cuidado com a política monetária. ;Ainda temos um paciente na UTI. A inflação cedeu um pouco, com serviços perdendo força e a ajuda do câmbio, mas é muito cedo para celebrar, sobretudo com a piora da situação fiscal;, afirmou. Para a economista, só será possível baixar os juros quando a inflação estiver em clara trajetória de queda, do contrário os preços poderão voltar a subir fortemente. ;O risco de cairmos em uma espiral inflacionária não está descartado, e é fonte de grande preocupação;, avisou.
Lopes, do BC, destacou a expectativa de queda de quatro pontos percentuais na inflação do ano. Ele também chamou a atenção para o fato de que os preços do setor de serviços demonstraram ;maior resiliência;, mas já estarem recuando. Ele disse ainda que espera contribuição mais favorável da taxa de câmbio. O BC projeta o dólar em R$ 3,70 no fim deste ano, menos do que os R$ 3,90 que imaginava há três meses. E não conta com variações muito significativas. ;Não esperamos volatilidade, e só isso já será positivo;, disse o diretor.
Expectativas
Para o economista Sidnei Nehme, presidente da NGO Corretora de Câmbio, não será fácil evitar que o dólar volte a subir fortemente. Na avaliação dele, a recente queda da moeda norte-americana, que perdeu 10% do valor frente ao real em março, se deve sobretudo a movimentos especulativos, e tende a ser revertida. Ele destacou a saída de US$ 16,4 bilhões do país nos três primeiros meses do ano.
Nehme duvida não apenas da previsão de câmbio apresentada pelo BC, mas das demais projeções. ;Não será possível termos inflação de 6,6% e uma recessão de 3,5%. Um dos dois números está errado. Para termos inflação de 6,6% será necessária uma recessão muito maior;, disse.
As expectativas de IPCA de 6,6% em 2016 e de 4,9% em 2017 são os pontos centrais dos cenários desenhados pelo BC para os dois anos. As chances de a inflação ultrapassar o teto da meta são de 55% em 2016. No próximo ano são de 25%. Só no primeiro trimestre de 2018 espera-se que a carestia chegue ao centro da meta, de 4,5%.
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