O deficit primário do setor público chegou a R$ 23 bilhões em fevereiro, o pior resultado para o mês desde o início da série histórica do Banco Central (BC) em 2001. A necessidade de financiamento, somada ao pagamento de juros de R$ 29,7 bilhões, levou o rombo nominal do país a R$ 638,5 bilhões nos últimos 12 meses. O buraco nas contas públicas equivale a 10,75% do Produto Interno Bruto (PIB), conforme dados divulgados ontem pela autoridade monetária.
Com o deficit nominal em patamares elevados ; somente no primeiro bimestre a alta foi de R$ 81,1 bilhões ;, a dívida bruta do governo chegou a 67,6% do PIB, e a tendência é de elevação ao longo do ano. O BC projetou que o indicador alcançará 67,9% em março e 71,6% no fim de 2015, se o setor público conseguir um superavit primário de R$ 2,8 bilhões, como consta de projeto encaminhado pelo governo ao Congresso.
O chefe do Departamento Econômico da autoridade monetária, Tulio Maciel, explicou que, no cenário do mercado, que estima um deficit primário de 1,5%, a dívida bruta pode alcançar 73,2% do PIB. Segundo ele, o rombo fiscal é reflexo do descompasso entre receitas e despesas, principalmente do governo federal, além da recessão na economia. ;Tivermos um deficit elevado em fevereiro, o maior da nossa série, porque as receitas recuaram entre 12% e 13%, refletindo em grande parte o ciclo negativo da atividade econômica. Apesar do esforço de contenção, as despesas obrigatórias seguem crescendo, e isso repercutiu nos resultados apresentados;, afirmou.
Maciel também destacou que a crise afetou a arrecadação dos estados e dos municípios, que devem dar contribuições menores para o esforço fiscal do setor público. Em janeiro, governos regionais contribuíram com superavit de R$ 7,9 bilhões, valor que despencou para R$ 2,7 bilhões no mês passado. Ele ressaltou que os resultados positivos foram sustentados pelo aumento nominal de 3% na arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e pela alta de 3,5% nas transferências da União. Entretanto, ele avaliou que o cenário será desafiador nos próximos meses. ;Dado o quadro ruim da atividade econômica, será um ano difícil também para os entes subnacionais;, disse.
De acordo com Maciel, as oscilações nas despesas com juros terão efeito sobre o deficit nominal, sobretudo pelos resultados das operações de swap cambial do BC, que equivalem a vendas de dólares no mercado futuro. Em janeiro, os gastos financeiros chegaram a R$ 56,3 bilhões, dos quais R$ 27,3 bilhões correspondiam a prejuízos com as intervenções da autoridade monetária no mercado de câmbio. Em fevereiro, com a desvalorização da divisa norte-americana, os swaps geraram ganhos de R$ 11,7 bilhões e as despesas com juros diminuíram para
R$ 23 bilhões. Nas contas do órgão, em março o resultado positivo com as operações de swap deve chegar a R$ 40 bilhões.
Crise
O economista Pedro Schneider, do Itaú Unibanco, afirmou que o deficit público em fevereiro foi influenciado pelos aumentos das despesas discricionárias, aquelas que o governo pode ou não realizar, e dos gastos com abono salarial, seguro-desemprego e benefícios previdenciários, menos passíveis de controle. Schneider ainda comentou que o resultado de fevereiro reforça o cenário desafiador para 2016, com redução da receita, aumento das despesas obrigatórias e espaço limitado para redução dos gastos. Ele destacou que, com a previsão de frustração na arrecadação, o Executivo anunciou uma flexibilização adicional da meta fiscal, prevendo até R$ 96,6 bilhões de deficit, equivalente a 1,55% do PIB, para o governo central. ;Esperamos um deficit primário consolidado de 1,6% do PIB em 2016;, detalhou.
Para o economista-chefe da Opus Investimentos, José Márcio Camargo, o deficit primário ultrapassará os R$ 97 bilhões em 2016. Ele destacou que isso deve ocorrer porque o governo Dilma Rousseff está disposto a abrir os cofres para conseguir o apoio de deputados do baixo clero para barrar o processo de impeachment. Camargo explicou que não há qualquer possibilidade de o Executivo conseguir conciliar essa agenda com a missão de recuperar a credibilidade da política fiscal e econômica. ;Teremos mais desemprego, mais recessão, e a confiança dos investidores permanecerá nos piores níveis. Com isso, a economia não crescerá, a arrecadação continuará em baixa e a trajetória de deficit permanecerá;, comentou.
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