A imprevisibilidade faz parte da dinâmica do mercado financeiro. Mas os investidores sabiam que ontem seria uma sexta-feira mais agitada do que o normal. Na noite anterior, a Petrobras havia anunciado que não divulgaria o balanço do terceiro trimestre no prazo determinado. Algo raro. O adiamento, por si só, já era motivo para uma dose extra de pressão sobre os papéis da estatal. Logo no início da manhã, o cenário já ruim ficou ainda pior. A Operação Lava-Jato, comandada pela Polícia Federal (PF), prendeu executivos da Petrobras e das maiores empreiteiras do país, sacudiu a bolsa, fez o dólar disparar e selou um dia de muita apreensão, na política e na economia.
Antes de a lista de presos ser divulgada ; incluindo ex-diretores da estatal ;, a cúpula da Bolsa de Valores de São Paulo (BM) percebeu a tensão e, em atitude tomada somente em casos extraordinários, decidiu segurar o início da venda de ações da Petrobras. Era preciso avaliar com cuidado as condições dos negócios envolvendo os papéis daquela que, antes de se perder nos escândalos de corrupção, ostentou o título de maior empresa brasileira. Uma hora e meia depois da abertura do pregão, com os ânimos menos afoitos, as negociações foram iniciadas.
Mau humor
Após forte queda de mais de 5% no fim da manhã, as ações da Petrobras chegaram ao fim da sessão com recuos mais sóbrios: as ordinárias caíram 2,67% e as preferenciais, 2,94%. O valor dos papéis sem direito a voto fechou a R$ 13,20 ; menor até do que os de muitas petroleiras de médio porte ; com desvalorização de 39% em um mês. O mau humor dos investidores também puxou para baixo ações importantes na composição do Ibovespa, o principal índice da bolsa brasileira, como as da Eletrobras (-4,88%) e as do Banco do Brasil (-1,49%).
Ainda ressacados pela baixa do preço do minério, os papéis da Vale conseguiram respirar (2,40%), depois de repetidas perdas. O bom desempenho atrelado à mineradora foi fundamental para salvar o dia, compensando o desastre da Petrobras e fazendo a bolsa registrar, no fim da sessão, uma leve queda, de 0,14%. Na semana, porém, o freio foi bem mais significativo, de 2,72%.
Sobram motivos para o mercado andar desconfiado com os rumos econômicos do país, com reflexos evidentes do comportamento da bolsa e do câmbio. Por ora, ninguém arrisca bater o martelo sobre os nomes do novo ministro da Fazenda e do presidente do Banco Central. O ex-chefe do BC Henrique Meirelles teria dito em reunião com executivos do Banco Original na última terça-feira, em São Paulo, que não deve aceitar a indicação para a Fazenda. Se confirmada a recusa, diante das possibilidades atuais, sobraria Nelson Barbosa na lista de cotados para o cargo.
Enquanto não ficar claro como a economia do país será conduzida no segundo mandato da presidente reeleita Dilma Rousseff (PT), os dias seguirão agitados no mercado financeiro, sustentou o economista-chefe da CMA, Carlos Lima. Tão importante quanto à definição da equipe, acrescentou ele, será compreender melhor até onde vão os desdobramentos das investigações na Petrobras. ;O adiamento do balanço foi extremamente negativo. Uma empresa tão estratégica para o Brasil, do porte da Petrobras, deveria dar o exemplo. O momento segue sendo de extrema cautela;, afirmou.
A tenebrosa situação da estatal vai acelerar o rebaixamento do grau de investimento do Brasil por parte de agências de classificação de risco, na opinião do economista da Planer Consultoria, Demetrius Lucindo. ;É uma situação inédita: ninguém tem coragem de assinar o balanço de uma das maiores empresas do mundo. Isso é muito ruim para o país;, comentou ele, prevendo, ainda, uma debandada do capital estrangeiro. A Petrobras informou que na segunda-feira apresentará os resultados operacionais, sem o aval da auditoria; em 12 de dezembro, será a vez dos demonstrativos financeiros. O balanço em si, no entanto, continua sem data de divulgação. ;A situação está bem pior do que a desenhada pelo mais pessimista;, completou Lucindo.
De todo modo, embora o pessimismo siga prevalecendo, as prisões e os mandados de busca e apreensão realizados ontem transpareceram um avanço no desmanche do esquema de corrupção na Petrobras. ;Foi a agradável surpresa ver a extensão da Operação Lava-Jato. Parece que estamos diante de um marco na melhoria das instituições, o que fará muito bem ao Brasil;, disse o presidente da Macroplan Consultoria, Claudio Porto.
Disparada
Em meio ao nervosismo do dia, para tentar segurar o dólar, o Banco Central interveio de maneira mais incisiva. Injetou mais dinheiro e conseguiu conter a tendência de disparada. A moeda norte-americana fechou o pregão cotada a R$ 2,60 ; depois de bater R$ 2,63 ;, alta de 0,23% consolidando o maior patamar desde abril de 2005.
Acreditando que dias ainda mais difíceis virão, Demetrius Lucindo, da Planer, preocupa-se com as intervenções do BC. ;Nossas reservas estão sendo comprometidas. A guerra nem começou e já gastamos metade das munições.;