Jornal Correio Braziliense

Economia

Entrevista com economista e cientista social Marcos Troyjo

"Brasil arrisca-se a ficar caro demais para competir com os mais pobres"

De muitos desperdícios no Brasil, talvez o mais grave deles seja o do bônus demográfico, momento único em que a maior parte da população está apta para o trabalho. Esse período na história, em outras nações, foi aproveitado para galgar degraus no desenvolvido e alançar o posto de país rico. Segundo Marcos Troyjo, professor de economia e diretor do BRICLab na Universidade Columbia, em Nova York, pondera que o Brasil não tem a infraesturutra necessária para usufruir desse benefício.

As maiores barreiras a impedir que o país aproveite plenamente esse momento, porém, estão na educação e na baixa qualificação dos brasileiros. "Temos uma parcela importante da população econômica ativa chegando a seu primor. No entanto, sua produtividade é afetada sobremaneira pelo reflexo de nossos déficits educacionais", argumenta o professor. Em entrevista ao Correio, Troyjo faz um alerta: "Com nossos conhecidos obstáculos burocráticos, trabalhistas e fiscais, corremos o sério risco de nos aprisionarmos na armadilha da renda média".

O Brasil tem a infraestrutura necessária para aproveitar o bônus demográfico?


Não. Há muitas deficiências. Temos uma parcela importante da população econômica ativa chegando a seu primor. No entanto, sua produtividade é afetada sobremaneira pelo reflexo de nossos déficits educacionais, seja no nível superior, seja no patamar da formação técnica. Para não mencionar o baixo volume de capital alocado para infraestrutura logística e produtiva, resultado de múltiplos anos em que o montante de investimento como percentual do PIB tem se mantido abaixo dos 20%.

Até quando ainda estaremos no bônus?

Tecnicamente até cerca de 2022, temos portanto pouco menos de uma década. Mas isso é flexível. Profissões de maior valor agregado e portanto geradoras de maior produtividade demandam uma entrada -- e portanto uma saída -- mais tardia no mercado de trabalho. Será mais comum as pessoas passarem mais tempo estudando e se preparando e daí ingressando no campo do trabalho com mais de 25 anos de idade -- e depois trabalhando até os 70. Assim, as balizas de entrada e saída do bônus demográfico são também determinadas por quão avançada está aquela sociedade no âmbito da chamada "economia do conhecimento".

Por que o Brasil do pleno emprego e do bônus demográfico continua a gerar empregos de baixa qualificação?


Justamente pela falta de qualificação. Ainda é pequeno o número de postos relacionados a temas como design ou intensivos em P (pesquisa e desenvolvimento). Ainda é relativamente restrito o número de empresas de pequeno ou grande porte intensivos em tecnologia. Isso representa um paradoxo. A sociedade brasileira é bastante criativa (tem muitas ideias e iniciativa), porém pouco inovadora (pois gera pouco número de produtos capazes de se destacarem no mercado por seu conteúdo de ineditismo tecnológico).O teto portanto é baixo e às vezes muitas posições que exigem mais qualificação permanecem sem ser preenchidas.

O Brasil vai sair do bônus demográfico como um país rico?


Depende essencialmente do que se fizer nos próximos 5 a 10 anos. Com nossos conhecidos obstáculos burocráticos, trabalhistas e fiscais, corremos o sério risco de nos aprisionarmos na armadilha da renda média. Ainda mais com esses novos arranjos em termos de comércio, investimento e cadeias produtivas que devem associar, por um lado, EUA e Europa e, por outro, EUA e países banhados pelo Pacífico na América Latina, Ásia e Oceania. Para não falar da própria transição da China rumo a um modelo de maior incorporação de valor à produção. Chamo esse conjunto de novas dinâmicas de "Reglobalização". E, nesse novo quadro, o Brasil arrisca-se a ficar caro demais para competir com os mais pobres e vagoroso demais para equiparar-se aos mais eficientes.

MARCOS TROYJO, 46, economista e cientista social, é diretor do BRICLab na Universidade Columbia, Nova York