Correio Braziliense: O Correio recebe, diariamente, dezenas de dúvidas de leitores. Por que a declaração do Imposto de Renda gera tantos questionamentos? Por que é tão complicado?
Joaquim Adir: As pessoas têm dificuldade porque existem muitas situações individuais que são tratadas pela legislação para diferentes rendimentos. Há regras específicas, por exemplo, para trabalho assalariado ou sem vínculo empregatício, aluguéis, aplicações financeiras. Além disso há a complexidade com relação às deduções: o que inclui, o que pode ser deduzido, quem pode ser considerado como dependente ou o que fazer com a situação individual de cada um dos dependentes.
CB: O que a Receita tem feito para diminuir essa complexidade?
JA: A Receita apresenta um programa autoexplicativo. Por isso, dificilmente a pessoa erra por preenchimento, o que pode acontecer é errar por falta de informação. O Fisco disponibiliza no programa uma ajuda para cada situação que o contribuinte venha a ter. Além disso, no site da Receita há também um ;perguntas e respostas; para esclarecer todas as dúvidas individuais. Então, se a pessoa tem uma dúvida, é interessante que ela procure esse espaço porque, ao longo do tempo, as perguntas vão ser selecionadas para esclarecer todas as particularidades.
Por isso mesmo acreditamos que é totalmente viável e recomendável que o contribuinte faça a sua própria declaração. Todas as informações constam nos programas da Receita e o órgão também ajuda nos casos específicos, como de preenchimento mensal, por meio do carnê-leão, para quem é autônomo, ou como o programa próprio para o cálculo do ganho de capital na venda de imóveis.
CB: A partir de 2014 o Fisco vai entregar ao contribuinte uma declaração pré-preenchida. O senhor acredita que isso vai diminuir o volume de dúvidas e as dificuldades dos declarantes?
JA: A Receita procura trazer cada vez mais um programa amigável, no sentido de que o contribuinte não tenha dúvidas, mas é muito difícil atingir esse objetivo. Não há outro meio que não o de pegar a experiência de fatos já ocorridos com contribuintes em anos anteriores e expor no site. É muito difícil a Receita conseguir acabar com as dúvidas na declaração mesmo considerando que em 2014 alguns dados já virão preenchidos.
CB: A declaração pré-preenchida é a única mudança para 2014?
JA: Por enquanto só temos esse plano. Nós temos ainda algumas situações que devem ser resolvidas, de como o contribuinte vai obter essa declaração, por exemplo. Temos vários desafios ainda a serem vencidos até lá. Portanto, falar em mudanças além dessa é difícil, já que a própria declaração ainda está sendo estudada.
CB: Por que tanta gente cai na malha fina? Como não ter problemas com a Receita?
JA: Normalmente quem faz a declaração correta não fica retido na malha fina. A maioria das pessoas que que ficaram retidas ; mais de 80% ; faz uma declaração retificadora e resolve a pendência. O que nos faz perceber que muitos contribuintes ainda prestam informações erradas, preenchem os dados de forma incorreta. Nesse caso é importante que ele procure, antes dos últimos dias, tirar todas as dúvidas e ler as informações do programa. Dessa forma, certamente ele não deve errar e não vai cair na malha fina.
CB: A Receita espera 26 milhões de declarações neste ano, um recorde. Esta é a tendência, que o Leão abocanhe cada vez a renda de mais pessoas?
JA: Sim, porque existe um crescimento vegetativo da população e de empregos, o que faz com que as pessoas passem a ter um rendimento maior e, consequentemente, passam também a ter que declarar e pagar imposto.
CB: Então o senhor atribui esse aumento de contribuintes mais à elevação da renda do que uma defasagem da tabela?
JA: Atribuo mais ao crescimento vegetativo. A população cresce, portanto, a quantidade de trabalhadores cresce e a renda também. É um resultado do crescimento total da economia como um todo, da população, de postos de trabalho. É o crescimento dessa linha que leva ao aumento de contribuintes.
A exceção é quando, em algum momento, o Fisco muda um pouco as regras. A Receita, há três anos atrás, por exemplo, mudou as regras com relação a valores de bens a declarar, tirou também desse universo de obrigatoriedade aqueles que prestavam contas só por serem sócios de empresa e aumentou o limite para a declaração. A não ser que, para frente, façamos outras mudanças e excluamos da obrigatoriedade outras pessoas, esse número vai continuar crescendo. Quem sabe pode haver também, no futuro, uma mudança de legislação que nos encaminhe para a diminuição desse número.
CB: Uma matéria do Correio mostrou que a carga tributária de 2012 foi a maior dos últimos cinco anos e, ainda, que o imposto de renda sobre trabalho mais que dobrou em uma década. A que isso é atribuído? A tendência é que a carga tributária fique mais pesada?
JA: A Receita não tem esse poder de decidir o tamanho da carga tributária. Isso é reflexo de um conjunto de fatores, é a sociedade que define essa carga. Nós temos uma demanda muito grande para o governo redividir a renda, dar educação, saúde, melhorar todos esses atendimentos e isso depende de toda a sociedade pagar os recursos destinadosa melhorar a qualidade de vida da população.
CB: Os especialistas citam a defasagem da tabela do imposto de renda como um dos principais culpados;
JA: É porque os especialistas tratam individualmente a tabela do imposto de renda, não pode tratar isoladamente. É preciso considerar o contexto da sociedade, do sistema tributário e do sistema de distribuição de renda. Se há essa defasagem, é por uma necessidade do governo em arcar com os compromissos assumidos.
CB: O senhor fala do interessa do governo em redistribuir a renda para investir em serviços básicos como saúde e educação. Não há aí uma falha de gestão já que a qualidade desses serviços não condiz com a carga tributária elevada?
JA: Não, de forma alguma. A gestão está perfeita. O sistema tributário brasileiro é um sistema social, de atendimento à população. Se a Receita não arrecada, o governo pode dar benefícios, como a previdência social que o governo paga a muitos aposentados. É muito dinheiro. No Brasil, mesmo sem contribuir a pessoa, a partir de determinada idade, acaba tendo benefícios do governo, e muitos brasileiros sem renda também têm um retorno, que é o caso clássico do bolsa família.
CB: O senhor ocupa o cargo de supervisor nacional do Imposto de Renda da Receita Federal há 11 anos. O que mudou nesse período?
JA: Mudou tudo, você não tem ideia. Há 11 anos, eram aproximadamente 3 milhões de contribuintes. A declaração era em disquete, não era transmitida via internet. O brasileiro tinha que ir entregar na Receita, era um verdadeiro drive thru para entregar o disquete, filas enormes de carros. Os funcionários da Receita ficavam até tarde recebendo isso. Havia uma mobilização muito maior com um número menor de contribuintes.
A declaração também evoluiu, temos uma ferramenta de ajuda ao contribuinte no próprio programa.A restituição também é muito mais rápida, mesmo com todo esse volume. O processamenta, a rapidez, em termos de dados, então, evoluiu de uma forma imensurável. Antes você não consultava a declaração, hoje você pode ir lá e corrigir. Antes, você esperava pela restituição e só ia ter notícia quatro anos depois, quando a Receita de tintimava, até porque não tinha essa integração do órgão com o contribuinte.