RIO DE JANEIRO, 8 Abr 2012 (AFP) - O Brasil aproveitou nos últimos anos o vácuo deixado pelos Estados Unidos na América Latina e consolidou sua liderança com o aumento do comércio e do financiamento da infraestrutura para a integração física da região, afirmam analistas.
O presidente americano Barack Obama receberá na segunda-feira na Casa Branca a presidente Dilma Rousseff, que governa a sexta maior economia mundial e que integra o bloco Brics de potências emergentes. Ambos voltarão a se encontrar no fim da semana em Cartagena, Colômbia, na Cúpula das Américas.
Rousseff, que recebeu Obama em Brasília ano passado, possui uma agenda menos ideológica com os Estados Unidos do que o antecessor Luiz Inácio Lula da Silva, e Washington começa a reconhecer o peso do país na região, que antes considerava como seu "quintal", segundo analistas.
Desde que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso convocou no ano 2000 a primeira reunião de cúpula sul-americana, o Brasil, que representa metade da América do Sul no PIB e em população, aumentou o financiamento de grandes obras de infraestrutura como uma estrada que liga o sul da Amazônia com portos peruanos no Pacífico.
"A interconexão dos países sul-americanos, a integração do comércio, do investimento, da infraestrutura, é o assunto mais sério da agenda regional do Brasil", disse à AFP Luiz Felipe Lampreia, ex-chanceler brasileiro.
Em menos de 10 anos, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aumentou em mais de sete vezes os empréstimos regionais para obras de infraestrutura.
A integração física do continente também é um dos principais temas da agenda oficial da Cúpula das Américas. Assim como os brasileiros, os chineses aproveitaram o esquecimento americano da região para financiar projetos de exploração de petróleo e de mineração no Brasil, Colômbia e Peru, além de uma ferrovia na Colômbia para ligar o Caribe e o Pacífico, entre outros.
Para a maioria dos países da América Latina, o maior sócio comercial não é mais a principal potência mundial, e sim Brasil ou China. O próprio Brasil tem a China como principal parceiro comercial e investidor estrangeiro.
"Há uma concorrência do Brasil com os Estados Unidos pela liderança regional, enquanto a China não aspira liderar, mas sim exercer uma influência na América Latina através do comércio, exportação e financiamento da infraestrutura", afirmou à AFP o professor David Fleischer, da Universidade de Brasília.
Washington também esbarra no maior grau de autonomia da região, como demonstram a criação de organismos como a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) ou a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), que deixam os americanos de fora.
"O peso dos Estados Unidos diminuiu muito na região. Estão desconcertados diante de uma América Latina mais assertiva, mais autônoma, com mais confiança em si mesma e com mais sócios como a China", afirmou Maurício Santoro, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas. "O Brasil é o país que preencheu este vácuo, sobretudo na América do Sul", completou.
Os dois países prosseguem com a política de relações cordiais, mas algo distantes, do governo Lula, mas Dilma Rousseff "é menos ideológica, mais pragmática", disse à AFP Rubens Barbosa, ex-embaixador brasileiro em Washington.
Do lado americano, Obama começou a diferenciar o Brasil e a considerá-lo como seu interlocutor na América do Sul. "A única diferença de política externa dos Estados Unidos (com a região) é que começaram a diferenciar o Brasil. O Brasil é mais ouvido e poderia passar a ser um grande fornecedor de petróleo dos Estados Unidos após as recentes descobertas de grandes reservas de combustível em águas ultraprofundas", completou Barbosa.
Obama e Rousseff talvez discutam a anulação de um contrato para a compra de 20 aviões brasileiros Super Tucano pela Força Aérea americana, que irritou o Brasil e pode afetar a decisão de Brasília na hora de escolher entre as ofertas dos Estados Unidos, França ou Suécia para a compra de 36 caças.
Dilma Rousseff também busca abrir as portas das melhores universidades americanas para mais brasileiros. Ela visitará na terça-feira a Universidade de Harvard e o Massachusetts Institute of Technology (MIT), em Boston, para estimular o programa "Ciência Sem Fronteiras", que aposta na formação de mais de 100.000 brasileiros no exterior nos próximos quatro anos.