O Natal está chegando. O aviso aflito e em público da ministra do Planejamento, Miriam Belchior, na última terça-feira, teve como alvo o ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Wagner Bittencourt, durante a apresentação do balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A cobrança da ministra é apenas um aperitivo amargo do que os passageiros deverão enfrentar neste fim de ano nos aeroportos, que não estão preparados para encarar o movimento recorde esperado no período ; acima de 16 milhões de passageiros. Entre 23 dezembro, uma sexta-feira, e 2 de janeiro, segunda, deverão passar pelos balcões e pontes de embarques das companhias pelo menos 10% mais de clientes do que os 14,7 milhões no ano passado, conforme estimativa da Infraero, que administra 66 aeroportos no país.
Para evitar o temido caos e as cenas dramáticas de anos anteriores, com filas intermináveis, atrasos e clientes desesperados por causa da perda de conexões, o governo e as companhias aéreas pretendem anunciar nesta semana planos especiais para desafogar o atendimento. No pito público, a ministra do Planejamento cobrou do colega na SAC rapidez nas obras do terminal remoto do aeroporto de Guarulhos, o maior e o mais sobrecarregado do país. Bittencourt disse que a conclusão da obra de R$ 86 milhões estava prevista para fevereiro. Mas Belchior retrucou dizendo que o ideal é que comece a funcionar antes, para enfrentar o grande movimento esperado do final de ano.
Enquanto os membros do governo tentam tocar a mesma toada, é gritante o descompasso entre a demanda e a disponibilidade dos serviços, de equipamentos e de espaço físico nos aeroportos, da pista das aeronaves ao estacionamento, onde motoristas de carros e vans disputam vagas em locais irregulares.
A Infraero e a SAC descartam o colapso aéreo, apostando em medidas preventivas como aumento do número de funcionários e mais coordenação entre órgãos e empresas do setor. O ministro-chefe da SAC assegura que o governo já tem esquema para garantir pontualidade e qualidade no atendimento aos passageiros no período de festas. ;Estamos desde julho elaborando, com as companhias aéreas, um planejamento para a ação de fim de ano que vai fazer com que tenhamos uma operação sem problemas;, assegurou.
Mas, como a própria ministra Belchior, os especialistas e passageiros não comungam da mesma convicção da Infraero e da SAC. ;Embora seja difícil ocorrer uma tragédia como a de dezembro de 2007, o contingenciamento das companhias e da SAC não resiste ao mau tempo, por exemplo;, alerta André Castellini, especialista em aviação da consultoria Bain & Company. Naquele ano, o atendimento e os voos entraram em colapso. Os principais aeroportos, afirma ele, já operam muito acima de sua capacidade instalada, realidade que saltará aos olhos nas vésperas de Natal e do réveillon, quando todos os voos terão 100% de ocupação.
O militar Estelvio Luiz Souza da Silva, 47 anos, e a mulher, Deilde Costa, 41, cobram respeito ao passageiro. ;Pagamos caro por um atendimento que deveria ser pelo menos bom. Não é o que vemos;, critica Estelvio. Eles quase perderam um voo para Porto Alegre semana passada em razão da lentidão das filas numa quarta-feira de pouco movimento e ainda reclamam da falta de fraldários. Para o final de ano, quando pretendem viajar novamente, já estão apreensivos pelo que os aguarda.
Sorte
Para o consultor da Bain & Company, a prevenção foi razoavelmente eficaz nos últimos dois anos, com aeronaves e tripulações extras e revisões técnicas antecipadas. ;Mas boa parte do sucesso contra overbooking e outras distorções deveu-se à sorte. Um atraso de quatro horas numa decolagem do Galeão (RJ) pode tumultuar outros terminais;, explica. Na sua opinião, o gargalo está mesmo na falta de lugares de embarque. Nesse sentido, a expansão prevista pela Infraero ;é para ontem;, alerta Castellini.
A obra em Guarulhos vai desafogar o aeroporto ao ampliar sua capacidade anual em mais 5,5 milhões de passageiros, abrangendo operações de check-in, embarque e desembarque, além de dois estacionamentos com 600 vagas e respectivas vias de acesso. No ano passado, o movimento de passageiros no aeroporto foi de 26,7 milhões. Segundo o próprio balanço do PAC, 83% do terminal estava concluído até setembro e o ritmo da obra é considerado adequado. Mas a data prevista para a conclusão, 26 de janeiro de 2012, não coincide com a fixada pela ministra para início da operação ; 20 de dezembro de 2011.
Ritmo de tartaruga
No aeroporto de Brasília, chama a atenção dos passageiros e funcionários os tapumes de uma obra que se arrasta há meses. Os banheiros em construção no local ainda se resumem a buracos e não há perspectiva para conclusão. Quem vê reclama do ritmo lento dos trabalhos e receia pela Copa de 2014. Amanhã, a presidente Dilma Rousseff assina em São Gonçalo do Amarante (RN) o contrato de concessão do primeiro aeroporto leiloado no país, durante concorrida cerimônia.