Jornal Correio Braziliense

Economia

Republicanos e democratas não chegam a acordo para cortar despesas

O fracasso das negociações entre democratas e republicanos com o objetivo de fechar um acordo para cortar US$ 1,2 trilhão do Orçamento dos Estados Unidos nos próximos 10 anos aumentou ontem o nervosismo dos mercados, já abalados pela persistência da crise na Europa. Receosos de que o impasse político acabe por resultar em um novo rebaixamento da nota da dívida norte-americana, como aconteceu em agosto, e aumente as dificuldades para que a economia do país saia da virtual estagnação em que se encontra, os investidores fugiram das aplicações de risco, levando as principais bolsas de valores a fechar em baixa.

Em Nova York, o Índice Dow Jones terminou o dia em queda de 2,11%. O Standard & Poor;s 500 caiu 1,86% e a bolsa de tecnologia Nasdaq recuou 1,92%. Na Europa, onde o ambiente já estava carregado com a ameaça de contágio da França e da Espanha, além da interminável onda de preocupações gerada pela Grécia, o principal índice das ações europeias ; o FTS Eurofirst 300 ; atingiu o nível mais baixo em sete semanas, com queda de 3,11%. No Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) não escapou do clima negativo. O Ibovespa chegou a apresentar queda de 2,16%, mas se recuperou parcialmente e terminou o dia em baixa de 0,79%.

Os cortes deveriam ser indicados por uma comissão paritária criada em agosto para viabilizar o acordo que permitiu a elevação do teto de endividamento do governo e evitou uma inédita moratória do Tesouro norte-americano. O controle teria o objetivo de frear o crescimento exponencial da dívida federal, que já ultrapassa US$ 15 trilhões, mas não houve entendimento a respeito das despesas que seriam podadas. ;Após meses de trabalho duro e deliberações intensas, chegamos à conclusão de que não será possível apresentar ao povo qualquer acordo bipartidário antes do prazo final do comitê;, afirmou a senadora democrata Patty Murray e o deputado republicano Jeb Hensarling em comunicado conjunto.

Acusações
Nos últimos dias, membros dos dois partidos já vinham trocando acusações sobre os motivos do impasse. Na verdade, desde que as negociações começaram nenhum dos lados parece ter cedido. Os republicanos não concordam com aumentos de impostos e os democratas não aceitam cortes em programas sociais. A falta de acordo pode pode
permitir que os US$ 1,2 trilhão sejam cortados automaticamente a partir de 2013, metade em despesas militares e outra metade em programas domésticos.

Isso daria tempo para que as negociações prosseguissem, mas a indefinição política foi o suficiente para azedar o humor nos mercados, por evidenciar a rígida divisão política existente nos Estados Unidos e aumentar as dúvidas sobre a saúde da economia do país, que enfrenta baixos níveis de crescimento e altas taxas de desemprego sem que, até o momento, tenha sido formulada uma estratégia viável para reativar os negócios. ;É um fator negativo. Há muitas perguntas a serem feitas ; se a Moody;s e a Fitch, por exemplo, agirem para rebaixar os EUA;, disse Garry Evans, diretor global de estratégia do HSBC.

Deterioração
O que assusta os mercados é principalmente a incapacidade demonstrada pelos governos e os líderes partidários de encaminhar decisões que possam pelo menos estancar a deterioração do cenário econômico. ;Existe uma ausência crônica de liderança política dos dois lados do Atlântico. Eles estão mostrando que não estão à altura das tarefas;, disse o diretor de estratégia de investimentos da Kames Capital, Bill Dinning, em Edimburgo, na Escócia.

O comportamento das principais bolsas europeias, já enfraquecidas pelos problemas da Zona do Euro, refletiu o aumento da incerteza. Houve fortes baixas em Londres (-2,62%), Frankfurt (-3,35%), Paris (-3,41%), Milão (-4,74%), Madri (-3,48%) e Lisboa (-2,08%). Mais cedo, a onda de pessimismo já havia derrubado as praças da Ásia, com desvalorizações em Tóquio (-0,32%), Hong Kong (-1,44%) , Seul (-1,04%) e Cingapura (-1,19%).

Dólar dispara
A aversão ao risco fez disparar as cotações do dólar no Brasil, que ultrapassou a barreira de R$ 1,80. A moeda norte-americana subiu 1,68% e fechou em R$ 1,813, a maior cotação desde 5 de outubro. Em novembro, a divisa acumula alta de 4,72% e no ano, de 7,02%. As moedas de outros países emergentes, como o peso mexicano e o dólar australiano, também tiveram perdas superiores a 1% por causa do aumento da insegurança dos investidores no mercado global.

Moody;s ameaça rebaixar a França
A alta nas taxas de juros sobre a dívida do governo francês e os prognósticos de crescimento mais fraco da economia podem ser negativos para a perspectiva do rating de crédito da França, alertou ontem a agência de classificação de risco Moody;s, em um relatório divulgado para investidores que ajudou a aumentar o nervosismo nos mercados. Os papéis da França possuem classificação ;AAA;, a mais elevada concedida pelas agências, mas dúvidas sobre a sobre a solidez fiscal do país têm sido cada vez maiores. ;A persistente elevação nos custos de financiamento por um período prolongado amplificariam os desafios fiscais que o governo francês enfrenta, em meio à perspectiva de deterioração do crescimento, com implicações negativas ao crédito;, disse Alexander Kockerbeck, autoridade sênior de crédito da Moody;s.

Promessa por escrito

Bruxelas ; O primeiro-ministro da Grécia, Lucas Papademos, afirmou ontem que seus aliados de governo cumprirão com as exigências da União Europeia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI) e se comprometerão por escrito com a aplicação das medidas de rigor impostas em troca de um novo programa de resgate da economia do país.

Os ministros das Finanças dos países da Zona do Euro pediram compromissos por escrito ao governo grego de união nacional para garantir cumprimento das medidas de austeridade e as reformas estruturais exigidas. Essas são as condições para a aplicação de um segundo plano de resgate da economia grega e, a curto prazo, para a liberação de uma parcela da ajuda de 8 bilhões de euros até meados de dezembro. ;Não há dúvidas de que o novo governo oferecerá esse compromisso por escrito;, disse Papademos em entrevista coletiva de imprensa, após se reunir em Bruxelas com o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso.

O comprometimento ;é necessário para eliminar as incertezas e as ambiguidades sobre as ações futuras;, ressaltou. ;Para que a UE e o FMI apoiem a Grécia, é preciso ter certeza de que o esforço será mantido a longo prazo, que não valerá apenas para um futuro imediato e deste governo, mas também aos governos futuros;, insistiu Barroso, por sua vez.

Objeção
O partido ultradireitista Laos, membro da coalizão governamental grega, retirou no domingo suas objeções sobre ao compromisso escrito exigido pelos credores. Contudo, Antonis Samaras, líder do partido conservador Nova Democracia, negou-se a assinar qualquer documento. Segundo ele, a participação de sua agremiação no governo de Papademos já é suficiente.

O presidente da UE, Herman Van Rompuy, também se reuniu com Papademos em Bruxelas ontem à tarde. Ao final do encontro, ele divulgou um comunicado no qual se mostra otimista em relação ao desbloqueio do lote de 8 bilhões de euros de ajuda à Grécia. ;Reafirmei que a Zona do Euro está disposta a continuar apoiando os esforços de ajuste da Grécia. O Eurogrupo pode dar sua aprovação ao pagamento do sexto lote de empréstimo à Grécia em sua próxima reunião;, prevista para 29 de novembro, disse.