Jornal Correio Braziliense

Economia

Empresa contratada pela Novacap usa a mão de obra de um adolescente

De forma irregular, empresa contratada pela Novacap usa a mão de obra de um menor no plantio do gramado em frente ao Palácio do Alvorada. O Ministério Público vai investigar o caso, atribuído pelo patrão à iniciativa do pai do menino


O Ministério Público do Trabalho (MPT) vai instaurar inquérito para investigar o trabalho ilegal de um menor em frente à residência oficial da presidente Dilma Rousseff. Na última terça-feira, um jovem de 15 anos foi fotografado entre os terceirizados que plantavam o gramado da área de estacionamento do Palácio da Alvorada. Informada da irregularidade, a Novacap, estatal do governo do Distrito Federal responsável pelo serviço, cobrou explicações da pequena empresa contratada, O Cravo e a Rosa Urbanização, que tratou logo de tirar o menino dos canteiros. Ele teria ganho R$ 50 pelo serviço do dia. O Correio procurou a Presidência da República sobre o caso, mas a resposta foi que o episódio deve ser explicado pela Novacap.

;O caso é uma excrescência em frente a um símbolo nacional;, afirmou o procurador do MPT Rafael Dias Marques, coordenador nacional de Combate ao Trabalho Infantil. A Constituição Federal proíbe o trabalho de pessoas com menos de 16 anos. Maiores de 14 até podem ser admitidos, mas somente na condição de aprendiz. Por considerar que houve evidente desrespeito à lei e ;ameaça à saúde do adolescente;, Marques acionou o procurador do MPT-DF Valdir Pereira da Silva para apurar os fatos.

A situação se agrava, segundo ele, pelo fato de o Brasil ser signatário da Convenção n; 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que lista as piores atividades de trabalho infantil. Em decreto presidencial assinado em 2008, há três itens que proíbem tarefas a céu aberto para menores de 18 anos. ;Além de multa, a infração contra a lei federal pode até motivar uma ação por danos morais coletivos ao expor o país no plano externo, justamente no momento em que as iniciativas brasileiras são consideradas modelo;, acrescentou Marques. Na sua opinião, cabe ao empregador completa vigilância sobre o cumprimento das normas do trabalho.

Autora da denúncia, a secretária-executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPeti), Isa Maria de Oliveira, considera o caso do Alvorada emblemático por ter ocorrido numa área de segurança máxima e diante da residência da presidente. ;A omissão revela alguém que deveria estar frequentando a escola e contrasta com elogios feitos ao Brasil em fóruns internacionais de combate à exploração de crianças e adolescentes;, protestou. Para ela, o flagrante tem o agravante do tipo de trabalho executado. ;Trata-se de uma atividade com potenciais danos à saúde em razão da postura corporal e da exposição a mudanças atmosféricas, como sol e chuva intensos.;

Isa lamenta que eventos como esse ainda ocorram à luz do dia em grandes centros, apesar dos importantes avanços obtidos para o combate de abusos nos últimos 20 anos, com a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e do Peti, além do crescente envolvimento de sindicatos e organizações civis no combate a abusos. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estima que existam 4,25 milhões de trabalhadores crianças e adolescentes no país. Até setembro, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) identificava 819 mil, que passaram a ser assistidos pelo Bolsa Família. No DF, o cadastro do Peti aponta 615, número que pode ser quatro vezes maior.

;Equívoco;
Marco Aurélio Amaro da Silva, dono da empresa terceirizada, reagiu enfaticamente à denúncia e garantiu que só emprega ;maiores de 18 anos e capazes;. Ele disse desconhecer a presença do menor no gramado e ressaltou que o contrato com a Novacap exigiu dele uma declaração na qual se compromete a não confiar tarefas a menores de idade. ;Somos fiscalizados diariamente pelo GDF e por nosso próprio pessoal. Está tudo regular;, garantiu.

Luiz Amaro, encarregado do serviço iniciado na última semana de outubro, também assegurou que a empresa nunca permitiu mão de obra infantojuvenil em suas turmas. Mas admitiu o problema, que classificou como isolado e momentâneo. ;Assim que a Novacap nos questionou, corrigimos o equívoco;, revelou ao Correio. Segundo ele, o problema resultou da iniciativa isolada de um funcionário que levou espontaneamente o filho para ajudar no trabalho. Ele tentou se justificar com a escassez de mão de obra no DF: ;Está difícil encontrar gente para trabalhar oferecendo só salário mínimo;.

Na manhã de ontem, havia apenas três serventes colocando grama no local, na reta final dos 3 mil metros quadrados confiados à empresa. Os empregados, um deles idoso, não usavam uniformes que identificassem a companhia ou os órgãos ligados à empreitada. Nem mesmo o veículo usado para fazer o acompanhamento trazia qualquer referência à contratada, como logotipo ou telefone de contato. O Departamento de Parques e Jardins da Novacap alegou que envia diariamente um fiscal ao terreno em frente ao Alvorada, para acompanhar os trabalhos. A estatal avisou que não faz parte de sua política revelar a lista de empresas licitadas para executar a manutenção do Plano Piloto. (Colaborou Guilherme Amado)