Livres da CPMF desde janeiro de 2008, os brasileiros deixaram de pagar R$ 134 bilhões ao governo federal - uma média de R$ 705 per capita em 44 meses. Mas a economia feita a cada movimentação bancária tem tudo para acabar: no dia 28 os deputados federais começam a votação em plenário do projeto de lei regulamentando a Emenda 29 - que trata dos gastos com a saúde e traz em um de seus artigos a criação da Contribuição sobre a Saúde (CSS), que vai tirar do bolso do contribuinte 0,20% do saldo bancário. A oposição promete barrar o novo imposto, mas vai estar diante de uma base aliada orientada a garantir a fonte de arrecadação a todo custo.
O que ninguém se lembra de dizer é que o bolso dos correntistas não será penalizado em apenas 0,20% de tudo que movimentar em banco. "Na época da CPMF, quando a alíquota era de 0,38%, o reflexo para o consumidor chegava a 1,7%. É preciso lembrar que a contribuição é embutida na cadeia de produção, e o consumidor final é quem paga, pois não tem para quem repassá-la", explicou o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), João Eloi Olenike. A pedido do Estado de Minas, o IBPT fez a projeção de arrecadação da CPMF se ela ainda estivesse em vigor e a média arcada por cada um dos brasileiros.
Na avaliação de Olenike, a aprovação da CSS deve trazer de volta um fenômeno vivido durante a CPMF: muitas pessoas vão evitar movimentar seu dinheiro em banco. Mas nem todo mundo tem essa alternativa, como por exemplo a grande maioria dos trabalhadores, que recebem o salário via instituição financeira. Pode haver ainda uma explosão de repasse de cheques de terceiros para quitar dívidas. O IBPT é contrário a qualquer tipo de contribuição similar à CPMF, até porque, de acordo com João Eloi, a sua defesa pelo governo é um atestado de que está administrando ;mal; os recordes de arrecadação anunciados a cada dia pelo Palácio do Planalto.
Na avaliação do presidente da Engenheiros Financeiros e Consultores (EFC), Carlos Coradi, o ideal seria o corte de gastos com a máquina pública, sobrando mais verbas para outros setores. "Mas como essa história de reduzir despesas é um sonho de uma noite de verão, ou se desiste de dar mais dinheiro para a saúde ou cria-se um imposto", lamentou. E como mais uma vez o brasileiro será o maior penalizado, ele avalia que o povo deveria se mobilizar para cobrar mais eficiência do governo.
Alternativas A discussão sobre a CPMF esquentou na quinta-feira, quando a presidente Dilma Rousseff (PT) afirmou que a saúde "precisa de mais dinheiro". Em entrevista a duas emissoras de rádio de Belo Horizonte, a petista argumentou que são necessárias novas fontes de recursos para cobrir os gastos com a saúde conforme determinado pela Emenda 29. "Quem negar essa necessidade mente para o povo", disse ela, completando que o problema da CPMF foi o desvio do dinheiro para outras áreas. Ela assegurou que se a contribuição for recriada, vai ;lutar; para que cada real arrecadado vá para o setor. Entre alternativas defendidas pela presidente para bancar os gastos está a aplicação de recursos do Fundo Social do Pré-Sal.
O projeto de lei que regulamenta a Emenda 29 começou a ser votado há três anos. Para finalizar a discussão, falta a votação de um destaque feito pelo DEM, eliminando a base de cálculo da CSS. O líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), já anunciou que no dia da votação vai se manifestar pela derrubada do destaque dos democratas. "Nossa posição de governo é de que a quantidade de recursos que a simples aprovação da Emenda 29 concede não é suficiente para resolver os problemas da saúde", ponderou. A estimativa do governo é de que são necessários R$ 30 bilhões para o setor, dinheiro que não virá apenas com a CSS.
Uma alternativa para tentar convencer os contrários a votar a favor da matéria é a criação de uma CSS "diferenciada" para rendas maiores e ainda o possível abatimento dos valores pagos no Imposto de Renda. Há ainda discussões para repasse de parte do arrecadado com o Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (Dpvat) e a legalização dos jogos de azar, com a destinação de percentual do valor movimentado para a saúde. Nos bastidores, há quem defenda a votação da legislação sem a CSS, deixando o debate para o Senado - para onde a matéria vai logo que passar pelo plenário da Câmara.