Jornal Correio Braziliense

Economia

Imposto maior para os ricos brasileiros começa a ser discutido

Manifestações de endinheirados dos EUA e da Europa em favor de aumento na carga tributária sobre eles despertam debate no Brasil para elevar contribuição dos que têm mais

Mesmo vivendo num país em que o Imposto de Renda (IR) tem 12 alíquotas, que vão de 5% a 57% paras as pessoas físicas, 16 megaempresários de gigantes franceses, como SA Peugeot-Citro;n, Danone, Orange, Accor e L;Oreal, reconheceram que recolhem poucos tributos e anunciaram a disposição de pagar mais, para ajudar a França a sair do atoleiro econômico em que está mergulhada. Enquanto isso no Brasil, país com um dos sistemas tributários mais injustos do mundo, onde os pobres sofrem muito mais o peso dos impostos que os ricos proporcionalmente e a alíquota máxima do IR é de 27,5%, ninguém se mexeu, apesar da ideia de taxação dos milionários brasileiros ser bastante antiga.

A cobrança de tributo sobre grandes fortunas está prevista na Constituição Federal, de 1988. Mas, passados 22 anos, até hoje não saiu do papel. Ela é fruto de uma emenda proposta pelo então senador Fernando Henrique Cardoso, que teve dois mandatos presidenciais para colocar em prática o que idealizou anos antes, mas nada. Nem mesmo o governo de Luiz Inácio Lula da Silva se empenhou em aprovar a taxação sobre os mais ricos para aliviar a carga nas costas do seu principal eleitorado, as classes C e D. Há oito projetos tratando do tema parados no Congresso.

Mea-culpa
;É difícil taxar os ricos porque eles é que mandam no Brasil e no mundo;, sentencia o renomado jurista Hugo de Brito Machado. Pelo menos um outro milionário resolveu fazer a mea culpa. Nos Estados Unidos. megainvestidor norte-americano Warren Buffett, dono da terceira maior fortuna do mundo, reconhece que paga menos tributos que os compatriotas com patrimônio bem menor. ;Parem de mimar os super-ricos;, escreveu Buffett em artigo publicado no diário The New York Times, ao criticar os que tentam barrar a iniciativa do presidente Barack Obama de taxar as grandes fortunas, proposta que não faz o menor sucesso entre os congresssistas.

A surpreendente movimentação dos milionários em favor de pagar mais impostos acontece em países em que o sistema de tributação já é mais justo. Na França e nos EUA, a taxação sobre o patrimônio e a renda é progressiva, ou seja, a alíquota sobe conforme aumenta o valor dos rendimentos ou dos bens, e é maior do que aincidente sobre o consumo. Na terra de Obama, a alíquota do IR chega a 40%. No Brasil, é o contrário: a carga tributária é muito alta sobre a comercialização de produtos e sobre os serviços ; os chamados tributos indiretos ; e baixa sobre a renda e patrimônio. Com isso, os mais pobres têm maior fatia da renda comprometida com impostos.

;É notório que o sistema brasileiro é um dos mais injustos do mundo e nada se faz para mudar isso;, afirma o tributarista Heleno Torres, vice-presidente regional da Associação Brasileira de Direito Tributário (Abradt) e professor da Universidade de São Paulo (USP). Ele lembra que 40% do valor recebido pelos beneficiários do programa Bolsa-Família retornam aos cofres público em forma de impostos. ;O mais urgente é resolver essa taxação injusta sobre os pobres;, conclama Torres.

Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) revela que os 10% mais pobres da população tem 33% da renda abocanhada por esses tributos indiretos e os mais ricos, apenas 22,7%. Quando isso deveria o ser inverso. Um outro levantamento, do Banco Mundial, mostra que da carga tributária brasileira, 55% vêm de impostos sobre consumo, 31,5% sobre a renda e apenas 13,5% sobre o patrimônio.

A situação é tão grave que a Organização das Nações Unidas (ONU) repreendeu o governo Lula no ano passado, mesmo reconhecendo os avanços no combate à pobreza e à fome no Brasil. Relatório do órgão avisou que a reforma para tornar a tributação progressiva é tão imprescindível quanto outras transformações estruturais que incidem sobre a concentração da riqueza e da terra no país.