Não importa se você está no parque, no trabalho, no trânsito ou em casa. É praticamente certo que, ao seu redor, há diversos aparelhos eletrônicos ligados. Esses dispositivos estão cada vez mais presentes na vida do brasileiro, graças a um perfil mais jovem da população ativa no mercado de trabalho, que não pensa duas vezes antes de adquirir um novo produto. Não por acaso, o Brasil foi considerado, em 2010, o lugar do planeta onde se vendeu o maior volume de celulares, câmeras digitais, televisores de alta definição e netbooks. Pesquisa realizada pela consultoria Accenture aponta que mais de 40% dos consumidores desembolsaram, em média, entre R$ 800 e R$ 2,6 mil em tecnologia no ano passado ; e a expectativa é de que esses números sigam em forte expansão.
A mudança de patamar do Brasil ocorreu graças à melhoria de renda das famílias e à ascensão social dos consumidores, ao passo que, no mesmo período, as potências tradicionais atravessaram ; e ainda atravessam ; complicadas crises econômicas. Lá, evitar gastos considerados supérfluos virou prioridade. Aqui, trilha-se o caminho contrário. O resultado acompanhou o forte desempenho econômico brasileiro em 2010, ano em que o consumo das famílias puxou o crescimento, de 7,5%, do Produto Interno Bruto (PIB).
;Tivemos um contingente enorme de brasileiros que passaram a ter disponibilidade para consumir eletrônicos;, ressalta Marcelo Fortes, coordenador do grupo de mídia e tecnologia da Accenture. Para ele, é interessante destacar as diferenças de comportamento do consumidor entre mercados emergentes e maduros. ;Grande parte da população brasileira é jovem, entrou há pouco no mercado de trabalho e está em idade produtiva;, explica, comparando com países do velho continente, que têm uma maior média etária. E as perspectivas são otimistas para essa indústria no Brasil: ;Acredito que teremos pelo menos duas ou três décadas com o consumo elevado;, prevê.
Desejo reprimido
Desde a ditadura militar e as crises posteriores, o brasileiro precisou aprender a poupar, sempre na expectativa de que dias piores poderiam chegar. Com a abertura econômica e a estabilidade trazida pelo Plano Real, em 1994, o consumidor pôde começar a se preocupar também com produtos considerados secundários, voltados ao bem-estar, ao entretenimento e ao lazer. Esse processo foi consolidado nos últimos anos, com a melhoria de renda da população fazendo com que os gastos com eletrônicos disparassem.
;Ficamos reprimidos durante muito tempo, mas sempre nos espelhamos na sociedade de consumo norte-americana. Quando a classe C entrou forte no mercado, houve essa explosão nas compras;, afirma Márcio Rolla, professor de comportamento do consumidor da Escola Superior de Propaganda e Marketing do Rio de Janeiro (ESPM-RJ). Ele destaca que esse consumo, geralmente, também agrega status ao comprador. ;Ao que parece, nada deve atrapalhar tal movimento, pelo menos nos próximos cinco anos;, afirma.
Mas, se há 15 anos esses aparelhos eram considerados de segunda ordem, o brasileiro de hoje ; especialmente os mais jovens ; possui uma dependência muito grande dos dispositivos eletrônicos. Um simples telefone celular quebrado, como aconteceu recentemente com a publicitária Débora Nogueira, 23 anos, pode causar muitos transtornos. ;Fiquei uma semana sem celular e foi complicado. Não via e-mails em qualquer lugar, todos reclamavam que não conseguiam falar comigo. Eu me senti como se estivesse ficando para trás;, revela.
Entretanto, ela sabe que essa angústia em ficar incomunicável é típica das pessoas de sua faixa etária. ;Meus pais são de uma geração diferente, acho que por isso não sentem tanta falta. Mas eu tive que me virar pra comprar um novo rápido;, contou. Mesmo assim, como os gastos saem do seu bolso, Débora avalia bem antes de optar por um novo dispositivo. ;Normalmente, faço um bom investimento por ano. Quando quero muito um produto, procuro saber se ele foi testado por outras pessoas. Só levo para casa se ele estiver com um bom preço e for me trazer um benefício concreto;, destaca.
Apesar de impulsionar o consumo de eletrônicos, o jovem brasileiro tende a pesar prós e contras na balança antes de ir às compras. ;Antigamente eu queria me atualizar sempre, comprar os aparelhos mais modernos, mas vi que não é bem assim. Hoje, só compro quando o que tenho estraga ou se chamar muito minha atenção;, diz o estudante universitário Vicente Ramos, 19 anos. Apesar das ponderações, engana-se quem pensa que eles não são verdadeiros aficionados por tecnologia. ;Há pouco tempo, fui para o interior de Goiás, e lá não tinha sinal de internet. No começo fiquei tranquilo, mas depois de alguns dias eu já não aguentava mais;, confessa.
Gastos com eletrônicos
Confira os produtos mais adquiridos em 2010
Telefone celular
Brasil: 53%
Média mundial: 33%
Câmera digital
Brasil: 28%
Média mundial: 20%
Televisores de alta definição
Brasil: 29%
Média mundial: 24%
Netbooks
Brasil: 23%
Média mundial: 17%
Fonte: Accenture