O dólar em baixa e a concorrência de carros ; baratos e completos ; das chinesas Jac Motors e Chery e da coreana Hyundai fizeram com que os preços de veículos novos fabricados no Brasil despencassem. Alguns modelos tiveram até 13,79% de queda. É o caso do Siena, da Fiat, que, no início do ano, valia R$ 33 mil e, agora, é vendido por R$ 29 mil. A baixa foi motivada pelo próprio consumidor, que passou a comparar os valores e a exigir descontos. O Honda Fit fabricado aqui é vendido por, no mínimo, R$ 59 mil. No México, o mesmo veículo pode ser encontrado por menos da metade, R$ 25 mil. Para segurar o cliente, as montadoras tiveram de recuar.
A queda já se refletiu na inflação do país. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo ;
15 (IPCA-15), prévia do indicador oficial, mostrou que, no acumulado do ano, os veículos novos ficaram 2,29% mais baratos. Em 12 meses, o recuo chegou a 5,03%. Apenas em junho, os preços dos carros novos caíram 1,71%. Em consequência, automóveis nacionais e importados ficaram mais acessíveis ao consumidor. O motorista Rafael Alves dos Reis, 25 anos, sentiu no bolso o efeito positivo da mudança. Ele conseguiu comprar um Siena novo por quase R$ 4 mil a menos. ;Vinha pesquisando e notei que estava mais barato. Aproveitei o momento;, comemorou.
O diretor comercial da Estação Fiat, Fernando Moreira, confirmou a redução dos preços em sua loja. ;A concorrência realmente gerou uma baixa nos valores cobrados pelos carros da nossa marca. Isso não ocorre só em veículos de modelo antigo. Os lançamentos também vieram mais baratos;, disse. Ele frisou que outros fatores estão relacionados com a queda. ;Houve uma restrição de crédito e algumas mudanças nos critérios de financiamento. Os autônomos não têm como comprovar renda e agora não conseguem parcelar. Isso nos fez perder alguns clientes. Além disso, o fim da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis flexpower ajudou;, completou.
Outro modelo que sofreu redução expressiva foi o Voyage, da Volkswagen. O preço do carro teve queda de 11,17%. Com direção hidráulica e vidros elétricos, passou de R$ 38.010 para R$ 34.690 nas últimas semanas. ;Nesse caso, fizemos uma promoção para aumentar a rotatividade e queimar o estoque;, esclareceu Hélio Aveiro, diretor da Brasal, revendedora da Volks em Brasília, e do Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos do Distrito Federal (Sincodiv). Com tantas opções nos pátios das concessionárias, o consumidor não pode se intimidar. Deve negociar, ao máximo, preços melhores.
Credibilidade
Embora a maior competição entre as montadoras tenha gerado ganhos para o consumidor, as marcas importadas ainda não conquistaram a confiança do brasileiro. Os chineses, recém-chegados ao Brasil, geram desconfianças no motorista Rafael Reis. ;É preciso esperar para ver o desempenho deles, que ainda não têm credibilidade;, completou. O dentista Clayton Cantaren, 26 anos, não abre mão dos modelos nacionais. ;Tive um importado e fiquei insatisfeito. A manutenção é mais cara;, argumentou. Ele destacou que a baixa dos preços não é a única vantagem do aumento de concorrência. ;O consumidor também tem mais opções;, observou.
Para o diretor da Nara Mistubishi Roberto Carvalho, os importados têm qualidade: ;O comprador descobre que o carro que vem de fora é melhor e acessível;. Sua dica para as montadoras brasileiras é não remar contra a maré. ;O consumidor regula o mercado;, ensinou.
Financiamentos de R$ 8,7 bilhões
A despeito das tentativas do Banco Central de frear a venda de carros no país, o brasileiro tem comprado como nunca. Apenas em maio foram R$ 8,7 bilhões destinados ao financiamentos de automóveis. Comparado a igual mês do ano passado, houve um incremento de 10,9% nessa modalidade de crédito; frente a abril, 14,7%. Segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), em maio, chegaram às ruas 318,5 mil veículos novos, volume 26,9% superior ao mesmo mês de 2010. A fatia de importados também aumentou, passou de 22,2%, em abril, para 23,5% no mês seguinte, num claro reflexo do dólar mais baixo reduzindo preços no país.
Na visão de Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), além do dólar, a chegada de uma marca chinesa no mercado brasileiro, a Jac Motors, balançou a concorrência, que se viu obrigada a baixar preços para não perder a clientela. ;A concorrência aumentou, então, nos últimos meses observamos uma série de promoções e liquidações para atrair o consumidor. Com isso, o volume de financiamento de veículos cresceu bastante;, avaliou.
As regras do BC que tornaram menos acessíveis os parcelamentos de veículos, na visão de alguns especialistas, estão sucumbindo à guerra entre as montadoras por vendas. As empresas reduzem a margem até o limite para garantir que os consumidores não parem de comprar carros novos. No acumulado do ano, as vendas de automóveis alcançaram 1,41 milhão de unidades, 3,7% mais que em igual período de 2010.
Dólar cai ao nível de 1999
O dólar derreteu ontem, pelo quarto dia seguido, e fechou o primeiro semestre do ano a R$ 1,562, com queda de 0,64%, no menor patamar desde 19 de janeiro de 1999, quando foi negociado a R$ 1,559. Apenas seis dias antes, em 13 de janeiro daquele ano, o governo havia mudado o sistema cambial brasileiro, de fixo para taxas flutuantes. Segundo os analistas, a aprovação do arrocho fiscal na Grécia e a decisão dos países europeus em estender as mãos aos gregos reduziram o nível de ansiedade dos investidores, que se sentiram mais à vontade para assumir riscos. Com isso, tanto o real quanto o euro apontaram valorização. No acumulado do ano, o dólar aponta baixa de 6,2%, apesar das constantes intervenções do Banco Central no mercado comprando os excessos de divisas (ontem, foram duas).
Para os turistas que pretendem ir ao exterior, o dólar mais barato representa um incentivo a mais ; neste ano, por sinal, os brasileiros deverão fazer um estrago nas contas externas, ao deixarem um rombo de US$ 15 bilhões com os gastos em viagem. Do ponto de vista da indústria, no entanto, o real supervalorizado representa uma ameaça e tanto, pois incentiva a importação de todos os tipos de bens de consumo. Não à toa, o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, expressou toda a preocupação do governo com o tema durante almoço com empresários portugueses em São Paulo.
Ele jogou, porém, parte da culpa pela forte alta do real frente ao dólar para o BC, que vem aumentando a taxa básica de juros (Selic) desde janeiro último para conter a escalada da inflação. ;No longo prazo, só tem uma forma de barrar a entrada de recursos no país: reduzir a taxa de juros;, afirmou. Pelos seus cálculos, mais de US$ 40 bilhões ingressaram no país nos primeiros seis meses do ano, o que tem empurrado a moeda norte-americana ladeira abaixo. ;Temos de recuperar nossa competitividade sem contar com a ferramenta do câmbio. O jeito é aproveitar os nossos recursos naturais e a inovação.;
Derretimento
Os analistas estão convencidos de que, tão cedo, não haverá reversão no derretimento do dólar. A mudança só acontecerá quando os Estados Unidos aumentarem as taxas de juros, o que deve ocorrer apenas em meados do ano que vem. ;Enquanto os juros continuarem muito baixos nos países ricos, os investidores vão aceitar um pouco mais de risco. E isso tem impacto sobre a cotação do dólar e sobre as bolsas de valores;, avaliou Márcio Cardoso, diretor da Título Corretora de Valores.