Jornal Correio Braziliense

Economia

De dezembro de 2010 a abril, queixas contra planos de saúde duplicam

O índice oficial que mede o número de reclamações passou de 0,29 ponto para 0,62. Só no primeiro bimestre, foram 28.318 registros. Clientes e médicos aumentam a pressão para que a ANS aperte a fiscalização

A insatisfação dos consumidores com o mau atendimento dos planos de saúde não para de crescer. De janeiro e abril, o índice de reclamações medido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), mais que dobrou. Entre as empresas com mais de 100 mil clientes, ele passou de 0,29 ponto em dezembro de 2010 para 0,62 em abril deste ano. Só no primeiro bimestre, o número de queixas e de pedidos de orientação saltou de 14.372 em 2009 para 24.166 um ano depois, chegando a 28.318 em 2011. O problema mais comum é a negativa de cobertura, seguido de cláusulas contratuais abusivas e aumento injustificado da mensalidade. Diante do persistente desrespeito aos usuários, entidades médicas e de defesa do consumidor cobram uma ação mais rigorosa do órgão regulador para inibir as práticas irregulares.

O presidente do Procon do Distrito Federal, Oswaldo Morais, demonstrou surpresa com o aumento das reclamações na ANS. Ele orienta quem se sentir prejudicado a procurar o auxílio da instituição ; os dados serão usados no mapeamento dos problemas e repassados ao Ministério da Justiça para eventuais providências. ;A depender da gravidade, o Procon pode aplicar multas que variam de R$ 212 a R$ 3 milhões à prestadora que desobedecer o Código de Defesa do Consumidor;, explicou. Na visão do advogado João Tancredo, o baixo valor das indenizações aplicadas pelo Judiciário estimula as operadoras a continuar atendendo mal. Elas preferem pagar as multas a investir na melhora da qualidade dos serviços.

Armadilhas
A advogada Patrícia Caldeira considera que a recusa dos planos em atender consultas e procedimentos previstos em contrato é abusiva. ;Em casos assim, o beneficiário pode procurar a Justiça para fazer valer os seus direitos;, recomendou. Segundo Patrícia, os usuários devem prestar atenção ao contrato, que, em muitos casos, esconde armadilhas. ;É preciso comparar a cobertura oferecida com o rol de procedimentos obrigatórios determinados pela ANS. Se a empresa se recusar a oferecer o mínimo estipulado pela agência, o contrato também pode ser questionado judicialmente.;

[SAIBAMAIS]A recusa em prestar o atendimento ocorre exatamente nos procedimentos com maior custo para a operadora, como os de implantação de prótese, apontam dados do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). As queixas contra planos de saúde lideram o ranking do Idec há nada menos que 10 anos consecutivos. A entidade já chegou a mover uma ação civil contra a ANS, questionando a agência em relação à falta de transparência para definir os reajustes anuais que, invariavelmente, ficam acima da inflação oficial.

Cálculos feitos em uma parceria entre o Idec e o Procon de São Paulo demonstram que, caso a ANS continue a adotar a metodologia de reajuste atual de planos de saúde, que resulta sempre em índices acima da inflação, os clientes não conseguirão pagar a mensalidade no futuro. Daqui a 30 anos, os preços dos convênios terão subido 126,67% acima do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medida oficial do custo de vida no Brasil.

Insatisfação
Para chegar a essa conclusão, consideraram-se os reajustes autorizados pela ANS para planos de saúde individuais de 2000 a 2010, período em que eles subiram 31,36% além do IPCA, e a estimativa da taxa de inflação no patamar estabelecido pelo sistema de metas do governo (4,5% anuais). Um consumidor de 30 anos, de classe média, com salário mensal de R$ 3 mil, que contrata o plano de saúde e paga mensalidade hoje de R$ 180,74, em 2040 será um idoso de 60 anos. Seu plano custará R$ 6.088,44, mais da metade da renda corrigida pela inflação.

A insatisfação com os planos não é exclusividade dos conveniados. Em um movimento espontâneo na rede social Facebook, mais de 1,5 mil médicos de todo o país já confirmaram presença em manifestações em todas as capitais contra os baixos valores que as operadoras repassam aos profissionais ; eles recebem cerca de R$ 35 por consulta. Em Brasília, a categoria promete fazer um ato público, com passeata na Esplanada dos Ministérios e apoio de universitários. A concentração será em frente ao Memorial JK. O protesto ocorrerá de forma paralela à pauta de reivindicações das entidades que representam a classe. Oficialmente, a Federação Nacional dos Médicos (Fenam) ainda fará uma assembleia, no dia 30, para definir os rumos da categoria após a paralisação nacional de 7 de abril.