Jornal Correio Braziliense

Economia

Mesmo com juro alto, consumidores continuam a tomar empréstimos e comprar



As famílias ignoraram as medidas do governo para conter o consumo, como o aumento dos juros básicos (Selic) e, em março, continuaram a ir às compras. Mesmo com a taxa no maior nível desde maio de 2009, chegando a 45% ao ano para os consumidores, os brasileiros financiaram R$ 71,8 bilhões no mês, um volume 5,7% superior ao de fevereiro. O cheque especial, modalidade de crédito que mais encareceu, está cobrando 174,6% ao ano ; ainda que o valor seja exorbitante, as pessoas não deixaram de usá-lo. No mês passado, os trabalhadores ficaram pendurados nesse ;limite especial; em R$ 24,8 bilhões, volume que cresceu 9,6%.

De seis tipos de crédito observados pelo BC, quatro ficaram mais caros e dois, mais em conta. Os financiamentos de veículos e bens duráveis subiram 2,5% na média. Quem deseja parcelar a compra de uma geladeira ou de uma televisão, por exemplo, irá arcar com cerca de 53,6% de juros se dividir um empréstimo bancário em 12 vezes. Na prática, vai pagar uma geladeira e meia. No crediário das lojas, seriam duas ; o comércio cobra, em média, 100% ao ano. Ainda assim, especialistas alertam, o brasileiro continuará a comprar. Ele não observa as taxas, mas apenas se a prestação cabe no bolso.

A auxiliar odontológica Neuzeli Aparecida Varaldi, 42 anos, admitiu ser uma dessas consumidoras. ;Mesmo com taxas altas, eu compro. O comércio facilita as prestações. As coisas estão caras, mas mais acessíveis por causa do crédito;, explicou. ;Meu marido até calcula os juros. Eu já não me preocupo tanto.; Assim como ela, a servidora pública Reny Sousa, 60, não tem o hábito de fazer esse tipo de conta. ;Prefiro pagar à vista, mas se o valor é elevado, como o de uma TV ou um carro, tenho de parcelar. Se eu quiser e precisar, compro sem ver;, disse. Amiga dela, a também funcionária pública Terezinha Araújo, 51, pensa diferente e tenta se esquivar do custo extra sempre que possível. ;Dependendo, até desisto da compra;, garantiu.

Dados do BC mostram que, em março, consumidoras como Reny e Neuzeli continuaram a buscar empréstimos. No crédito pessoal, foram R$ 14,8 bilhões entregues às famílias, volume 5,4% maior que em fevereiro. No ano, esse avanço é de 7,7%. O cartão de crédito também registrou incremento nas concessões, chegando a R$ 19,3 bilhões, com expansão de 4,3% no mês e de 7,7% no ano.

Moderação
A despeito desses avanços, o crédito total do sistema financeiro se elevou a uma taxa mais moderada: 1% entre fevereiro e março, alcançando R$ 1,752 trilhão. ;É um crescimento mais moderado, influenciado pelas políticas restritivas de crédito;, avaliou Túlio Maciel, chefe do Departamento Econômico do Banco Central. ;O volume de informações divulgadas sancionou a visão de que as medidas macroprudenciais adotadas continuam sendo efetivas em manter o crescimento do crédito em um ritmo menor por meio de condições mais apertadas;, disse Adriano Lopes, economista do Itaú Unibanco.

Para Emílio Aufieri, da Associação Comercial de São Paulo, o objetivo do governo é conter o consumo e a inflação sem dar um tranco forte na economia. ;O canal do crédito é bom para isso. É menos oneroso para o país do que apertar a Selic. Assim, as pessoas vão continuar a comprar e o crédito deve permanecer crescendo. Não vamos entrar em recessão;, argumentou Aufieri. Para ele, a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) vai diminuir o ritmo de consumo e manter o de investimentos. ;Funcionará como uma peneira.;

Dados parciais de abril, de oito dias úteis, registram esse movimento projetado pelo economista. Até o dia 12, as concessões para as famílias encolheram 5,4%. As empresas, porém, também foram afetadas. A liberação de recursos para elas despencou 8%. As taxas para os consumidores deram mais um salto, passando de 45% para 47,1%.