A equipe do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que participou das negociações ocorridas em 2009 para a edição da Resolução n; 3.811 do Conselho Monetário Nacional (CMN), defendeu que o texto mencionasse expressamente que a liberdade de trocar de apólice durante a vigência do contrato habitacional valia para todos os mutuários, inclusive para aqueles com contratos anteriores à norma. Mas os representantes do Banco Central foram contra e venceram a batalha. Com isso, prevaleceu a ideia de vigência só para financiamentos feitos a partir da sua edição.
A redução do seguro habitacional ocorreu por pressão do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao lançar o Programa Minha Casa, Minha Vida, que ficou isento do pagamento. No início de 2009, ele foi informado pelos empresários da construção civil e por especialistas da área que o seguro habitacional era muito alto e correspondia, em muitos casos, a 30% da prestação. O Banco Santander Real foi um dos primeiros a reduzir o seguro, em fevereiro de 2009. A Caixa Seguros só passou a cobrar menos em agosto de 2009.
Embora leve o nome do banco federal, a Caixa Seguros é controlada pelo grupo francês CNP Assurances, com 51,75% do capital ; a Caixa Econômica Federal detém 48,1%. Até então, um dos seguros habitacionais mais caros do mercado era justamente da seguradora da qual o banco é acionista e que detém a maior parte desse mercado. No ano passado, a Caixa Seguros comemorou lucro líquido recorde da sua história, de quase R$ 500 milhões. Em setembro passado, reportagem da revista Época revelou que a seguradora bancou a viagem de 200 funcionários da Caixa para Paris e para o sudoeste da França, famoso por seus vinhedos.
Procurada pelo Correio na semana passada, a seguradora não quis se manifestar sobre a aplicação da resolução a todos os contratos nem informar o índice de sinistralidade da carteira, ou seja, do pagamento de indenização em relação aos valores arrecadados. A Caixa Econômica Federal informou que dados sobre o desempenho desse seguro devem ser fornecidos pelo mercado, a quem cabe os lucros e os prejuízos da comercialização do produto.
;É espantoso o que aconteceu. Os direitos foram violados, com a conivência do poder público. E pensar que, à época, o presidente Lula queria beneficiar as famílias brasileiras, ao exigir a redução do seguro e determinar maior concorrência de mercado;, afirmou a advogada Carla Buaiti. ;Não há argumento jurídico para excluir mutuários antigos que ainda têm a pagar 15, 20 anos de prestações. Até porque são eles que teriam mais motivos para trocar de seguradora, já que estão pagando muito mais caro, quando todo o mercado oferece preços menores;, diz a advogada Cristiane Passos.
Carteira lucrativa
A seguradora do Banco do Brasil, a Aliança do Brasil, divulgou que a sinistralidade, que já foi de 16% quando o total dos financiamentos era 25% menor que o de hoje, está em 6,5%. É uma carteira de empréstimos lucrativa. Como comparação, a ocorrência de sinistros no seguro de automóvel no setor em geral é de 68%, conforme dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep) de 2010.
A Bradesco Seguros admitiu que as novas regras foram aplicadas somente aos novos contratos. A seguradora do Santander Real alegou que a redução do seguro não foi estendida a todos os seus mutuários por ;se tratar de nova apólice equalizada por conta da integração dos dois bancos;. Mas informou que está preparada para atender eventuais casos de clientes e que a renovação pode ser feita a qualquer momento e não apenas anualmente.
Segundo advogados, está claro que a própria Caixa e outros bancos deveriam passar a cobrar o valor menor também dos mutuários antigos, sem necessidade de estes migrarem para outra seguradora, já que todas cobram preço de 40% a 50% menor desde o segundo semestre de 2009.