Jornal Correio Braziliense

Economia

Cego desde a infância, Fernando tornou-se professor de matemática

O pedagogo Fernando Rodrigues tinha apenas 6 anos de idade quando, devido a um descolamento de retina, perdeu completamente a visão. O preconceito logo foi sentido dentro do próprio lar. "Meu padrasto não queria que eu continuasse a estudar. Para ele, deficiente visual tinha de ficar em casa ou pedindo esmola", lembra. Quatro anos depois, a mãe dele, Ana Rodrigues Neto, o matriculou em uma escola especial. Os estudos continuaram e, em 2003, durante o terceiro semestre da graduação em pedagogia na Faculdade da Terra, Fernando foi aprovado no concurso para professor de matemática no Centro de Ensino Especial de Deficientes Visuais (CEEDV), da rede pública de educação do Distrito Federal. "Eu e mais três pessoas formamos um grupo e estudávamos todos os dias" diz. Como era o único deficiente visual da turma, os outros integrantes liam para ele.

Passar no concurso não foi o fim das dificuldades para Fernando. "Eram 72 vagas para deficientes, mas apenas 30 pessoas tinham ficado acima da média. Dessas, só 15 tinham sido convocadas. Então eu fui ao Ministério Público, levei o edital da prova e questionei porque não havia sido chamado%u201D conta. O requerimento acabou dando certo e ele foi nomeado em 30 de dezembro de 2004. Desde então, ele ensina aos matriculados na escola localizada na 612 Sul a usarem o Sorobã, um ábaco adaptado para cegos. Atualmente com 33 anos, ele é casado, tem uma filha e é pós-graduado em metodologia do ensino superior, também pela Faculdade da Terra. Fernando acabou se tornando referência para seus estudantes. %u201CEles falam para os amigos que têm um professor cego e que, se ele conseguiu, outros também podem", orgulha-se o pedagogo.

Antes de optar pelo concurso do CEEDV, Fernando queria ser juiz, mas na época o ingresso de cegos na magistratura era dificultado. Decidiu então ser professor. Para ele, %u201Ca educação torna o deficiente visual autônomo, o faz ser útil para a sociedade%u201D . Como não quer ficar longe de seus alunos, o pedagogo nem pensa em participar de outras seleções. "Por enquanto, minha missão é educá-los para a vida e para o mercado de trabalho", afirma.

No futuro, a escola pretende incluir Fernando em um projeto que orientará alunos a arranjar um emprego ou a ser aprovado em um concurso. "Um emprego público acaba sendo uma boa alternativa para o deficiente visual, mas isso não quer dizer que ele terá boas condições de trabalho", alerta. Ele diz que é preciso provar que, apesar da falta de visão, é possível ser útil. Segundo Fernando, o preconceito e o descaso acabam sendo os principais obstáculos para o deficiente que quer passar em um concurso público. Porém a situação está mudando. Ele lembra que, quando se tornou cego, era muito mais complicado encontrar livros em braile. Além disso, os programas que permitem ler telas de computador ainda não existiam. Mas o esforço foi recompensado. "Estudar é bom demais. O estudo torna a pessoa independente", comemora Fernando.

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