Jornal Correio Braziliense

Economia

BC abandona o combate implacável à inflação para permitir crescimento maior

Taxa de juros só deve ter mais uma elevação de 0,5 ponto

Antes de Alexandre Tombini assumir a Presidência do Banco Central, os analistas especulavam sobre se o novo comandante da autoridade monetária seria um técnico afinado com a administração anterior, de perfil mais ortodoxo, ou se dançaria conforme a música tocada pelo Ministério da Fazenda, considerado mais leniente com a inflação. Passados quase dois meses e meio da posse, o cenário está menos turvo. Na visão de atentos economistas, Tombini pode ser classificado como dovish, termo em inglês que significa dócil como um pombo ; ele já foi apelidado de Pombini. Em outras palavras, o BC teria se dobrado às pressões da Fazenda para aceitar um pouco mais de inflação em nome de um crescimento econômico maior.

Na avaliação dos analistas dos bancos JP Morgan, Barclays, Goldman Sanchs e Bank of America, assim como na de consultorias e corretoras de investimentos, a condução hawkish (implacável como um falcão) da política anti-inflação foi sepultada no governo Dilma Rousseff, após quase 12 anos de domínio. A impressão ficou mais forte com a publicação, anteontem, da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). No documento, os diretores do BC afirmaram que têm outros instrumentos, além da subida dos juros, para conter o aumento dos preços, cuja magnitude assusta.

O mercado recebeu a afirmação como um sinal de que haverá, no máximo, mais uma alta na taxa básica (Selic), de novo em 0,50 ponto percentual, com o encerramento do atual ciclo de aperto monetário. Os juros ficariam estacionados em 12,25% ao ano. Os próprios diretores do BC fizeram questão de reforçar essa sinalização em contato com analistas e com a imprensa. ;A ata veio suave demais frente à deterioração das expectativas e as pressões inflacionárias;, observou Gustavo Hon, da corretora Um Investimento.

Crédito
Para os economistas, o parágrafo 31 do documento evidenciou que o arrocho na Selic está sendo substituído por medidas prudenciais para segurar o crédito e o consumo.

Nas entrelinhas, a ata mostrou que o BC perdeu a autonomia operacional de que tanto se gabava para voltar a atuar como um mero apêndice da Fazenda, para a alegria de Guido Mantega e de seu secretário executivo, Nelson Barbosa. Todas as iniciativas adotadas no novo governo para manter a estabilidade passaram antes por seus gabinetes. Nesta semana, os diretores do BC Aldo Mendes (Política Monetária) e Luiz Awazu Pereira (Normas) foram ao ministério para preparar mais um pacote. Para alguns, a mudança de perfil, de falcão para pombo, marca a vitória dos desenvolvimentistas.

;A gente estava acostumado com uma autoridade monetária conservadora ao extremo. Agora, ela está assumindo mais riscos;, avaliou Felipe Tâmega, economista-chefe da Modal Asset. No novo modelo, o BC está disposto a sacrificar o combate à carestia em troca de mais expansão econômica, num raciocínio afinado com Mantega e Barbosa ; a Fazenda se preocupa com o impacto político de o país crescer apenas 3,5% ou 4% em 2011, após os 7,5% de 2010. Para permitir um alívio, a equipe de Tombini desistiu de perseguir o centro da meta de inflação, de 4,5%, e já se contenta em ficar dentro do teto permitido (6,5%). O BC não quis se pronunciar sobre o assunto.