Jornal Correio Braziliense

Economia

Real valorizado provoca recuo na atividade industrial em dezembro

Avaliação foi feita na comparação com o mês anterior. Em 2010, alta foi de 10,5%

Puxada pela forte demanda interna, a produção industrial brasileira avançou 10,5% no ano passado em relação a 2009, registrando a maior taxa de expansão em 24 anos. Apesar disso, os dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o real valorizado acabou impondo uma desaceleração do setor nos últimos seis meses. A atividade industrial subiu 2,7% em dezembro ante igual mês do ano anterior, mas teve redução de 0,7% sobre novembro.

O recuo de dezembro foi o
pior resultado para a produção industrial na comparação de mês contra mês anterior desde junho de 2010, quando caiu 1,2% ante maio. O expressivo crescimento anual mostrado pela pesquisa reflete também a base fraca de comparação com 2009. No ano do auge da crise global houve retração de 7,4%, a maior em 19 anos. Em 1986, ano de vigência do Plano Cruzado, representou, por sua vez, o maior crescimento da produção industrial: 10,9%.

Enquanto isso, estimativas do mercado financeiro apontam crescimento menos expressivo da produção industrial neste e no próximo ano, de 5%, cerca da metade de 2010, acompanhando o ritmo da expansão da economia.

Fôlego menor
Segundo André Macedo, gerente da Coordenação de Indústria do IBGE, com exceção dos bens intermediários, todos os segmentos industriais perderam fôlego no segundo semestre de 2010 em razão do câmbio, com substituição por importados. ;A queda mais acentuada foi verificada nas linhas de fabricação de equipamentos eletrônicos e de comunicações, sobretudo celulares e aparelhos de TV;, destacou.

Para o especialista, observada a evolução da atividade industrial por trimestres, houve uma curva descendente ao longo de 2010. Na comparação com o trimestre imediatamente anterior, a produção subiu 3,1% no primeiro; desacelerou para 1,1% no segundo; caiu 0,6% no terceiro; e, por fim, recuou 0,1% no último. ;O bom desempenho anual compensou perdas de 2009 e foi praticamente sustentado pelo salto do seu primeiro trimestre;, sublinha.

Os melhores desempenhos de 2010 foram, por sua vez, favorecidos por desonerações fiscais e outros incentivos, tendo à frente a redução temporária do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), como foram os casos dos bens de consumo duráveis e dos bens de capital. Houve expansão em 23 das 25 atividades pesquisadas, sendo que a dos veículos automotores (24,2%) representou o maior impacto no índice global.

Medidas fiscais
O auge histórico da produção ocorreu em março de 2010, quando o setor ainda se valia dos reflexos positivos das medidas fiscais do governo para estimular ramos como automotivo, construção civil e linha branca de eletrodomésticos.

José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, afirma que os dados de dezembro do IBGE ficaram bem abaixo da média das projeções e mostram ;claro arrefecimento na atividade;, considerando uma produção mensal já praticamente estagnada há três meses e uma base de comparação baixa no último mês de 2009. Ele ressalta ainda que só a produção de bens intermediários ficou estável, havendo quedas em bens de capital (0,5%) e de consumo (0,9%).


Importados avançam

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) prefere não comentar os dados da pesquisa do IBGE sobre a produção industrial em 2010, mas analistas ligados à entidade reforçam a análise em levantamentos internos. Para eles, há um processo de encolhimento em segmentos mais expostos à concorrência internacional. E o termo desindustrialização catalisa, desde 2010, um crescente debate entre empresários, economistas e governo sobre a competitividade dos manufaturados brasileiros.

Para a CNI, passada a euforia da recuperação nos primeiros meses de 2010, a produção caminha para ter desempenho igual ao do Produto Interno Bruto (PIB), de 4,5% este ano. Flávio Basílio, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), acredita que a indústria está mudando de perfil, tirando espaço para a transformação e ampliando a de montagens, a partir de componentes importados.

;O crescimento expressivo de 2010 precisa ser analisado nos detalhes, onde estão colocadas as questões do câmbio e da desindustrialização;, resume. Ele lembra que a indústria vem perdendo participação no PIB nos últimos seis anos. Relatório do HSBC confirma que os números de dezembro ficaram mais fracos do que o esperado, mas em nada altera a percepção de consumo aquecido no país. O Santander vê o recuo acima do esperado sem pessimismo e lembra que 15 de 26 segmentos continuaram aquecidos em dezembro. (SR)


Imposto pode subir

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Gabriel Caprioli

Apesar de publicamente sustentar que o Brasil não embarcará na onda de protecionismo comercial, a equipe econômica trabalha internamente para tentar diminuir a invasão de produtos importados. Ao chegar à primeira reunião do Grupo de Avanço da Competitividade (GAC) ; fórum composto por empresários e membros do governo ; da gestão de Dilma Rousseff, o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, afirmou que há estudos para elevar o Imposto de Importação sobre alguns produtos, nos casos de concorrência predatória.

Pimentel não deu exemplos, mas afirmou que a revisão de tarifas não será adotada como forma de política industrial. ;Pode ser necessário (elevar o imposto), mas como uma ação de defesa comercial, principalmente nos casos em que ficar comprovado que há importação acima das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC);, afirmou.

As compras externas estão entre os principais alvos de reclamações dos empresários no encontro do GAC. O presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato, pediu o aumento de 12% para 35% em média do imposto de importação sobre equipamentos para geração e transmissão de energia. ;É uma proposta compensatória para o problema cambial.; Para o presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, o equilíbrio da balança comercial é necessário para evitar uma dependência dos investimentos externos nas contas públicas. ;Não podemos depender dos aportes estrangeiros diretos, temos que reconstruir a capacidade de gerar saldos comerciais positivos;, afirmou.