Açoitado pela inflação de alimentos em disparada e sem poder controlar os problemas climáticos, prejudiciais à safra, ou o avanço dos preços de commodities (produtos com cotação internacional) agrícolas, o ministro da Fazenda, Guido Mantega cobrou mais ação da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Para ele, a estatal poderia utilizar os estoques de grãos que mantém para contribuir mais com o governo no controle das pressões de custo, mas falha ao considerar o volume de reservas como único critério para os leilões.
A preocupação é justificável. Os alimentos foram os principais responsáveis pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ter avançado 5,9% em 2010. O grupo encerrou o ano com ajuste médio de preços de 10,39% e amplo fôlego para continuar a escalada em 2011. A carestia ameaça, principalmente, as famílias de baixa renda, nas quais as despesas dessa ordem ocupam boa parte do orçamento doméstico. Não bastasse isso, ainda há o temor de uma transmissão mais acentuada dos aumentos de preços para os serviços e tarifas ; movimento que já está em pleno vapor.
Para o sócio-diretor da consultoria empresarial de agronegócios Céleres, Anderson Gomes, a Conab tem pouco fôlego para fazer o papel de regulador inflacionário dos alimentos. ;Falta sincronia entre ela e o mercado e os últimos leilões de milho, por exemplo, não foram suficientes para reverter o preço, que continua nas alturas;, comentou. A limitação, segundo o analista, está ligada ao próprio volume de estoques da instituição, atualmente próximo de 7,9 milhões de toneladas. ;Em se tratando de inflação, a Conab poderia ajudar pouco, até porque as pressões do IPCA não se restringem a alimentos. Não sei se ela teria instrumentos para ser mais eficaz nesse aspecto;, concluiu.
Descompasso
Além de estoques pequenos, parte do mercado ainda enxerga um certo descompasso na atuação da Conab. ;Os leilões são importantes, principalmente, para escoar a safra excedente, mas todos os anos a instituição começa tarde demais, quando muitas vezes os agricultores já conseguiram vender a produção;, reclamou outro analista.
O viés econômico não é o único que preocupa Mantega. As críticas também escondem a disputa política pela Presidência da Conab. Ao sugerir para o cargo um nome ligado à economia, Mantega fortalece o petista Sílvio Isopo Porto, diretor da companhia desde o primeiro mandato de Lula e ex-presidente das Centrais de Abastecimento do Rio Grande do Sul (Ceasa), em Porto Alegre. O partido acusa o PMDB, que até o ano passado dividia o comando da instituição como PTB, de querer receber a empresa de ;porteira fechada;, ou seja, indicando todos os cargos de direção e assessoria.
Procurada pelo Correio, a Conab não respondeu à solicitação. Na semana passada, a companhia leiloou 30 toneladas de feijão em vários estados, além de anunciar que prepara uma oferta de 300 mil toneladas de milho em venda direta para os próximos dias. Posteriormente, fará pregões que somarão até 1 milhão de toneladas em uma modalidade com frete pago ao consumidor intermediário (frigoríficos, granjas e esmagadoras).
DÓLAR CAI 0,12%
; Em um dia fraco de negócios, pelo feriado em homenagem a Martin Luther King Jr., nos Estados Unidos, e sob o temor de novo swap cambial reverso (compra de dólares no mercado futuro) pelo Banco Central brasileiro, o dólar comercial encerrou o pregão em queda de 0,12%, cotado a R$ 1,683. Os investidores ficaram também de olho na reunião dos ministros de Finanças da Zona do Euro e nos dados do Boletim Focus, divulgado pelo BC, que sinalizaram, nas expectativas dos especialistas de mercado, alta na inflação de janeiro, apontando elevação de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros da economia (Selic), durante a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que começa hoje. O Ibovespa, índice que mede a lucratividade das ações mais negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo fechou em baixa de 0,47%, nos 70.609 pontos.
Volta às aulas mais cara
A inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S), calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV) continuou em aceleração e, na segunda semana do ano, registrou 1,06% de alta. Os principais impactos foram relacionados ao calendário escolar do início do ano, no qual as despesas com uniforme, matrículas escolares e papelaria têm aumento pontual.
O grupo Educação, Leitura e Recreação apresentou inflação de 2,43% no segundo levantamento do ano, ante 1,46% da primeira medição. Os itens alimentícios continuaram castigando o bolso do consumidor e compuseram o segundo conjunto de despesas que mais se elevou, segundo a FGV, com alta de 1,69%, seguidos dos dispêndios com transporte, que avançaram 1,49%.
Em outra pesquisa, também divulgada ontem pela FGV, as notícias para o consumidor não são melhores. O Índice Geral de Preços ; 10 (IGP-10), que considera a variação de custos entre o dia 11 de dezembro e 10 de janeiro, passou de 1,27% para 0,49%. O refresco foi acompanhado pelo recorte de preços ao consumidor, que cresceu 0,9% na última medição, ante 1,05%. Apesar da desaceleração do indicador cheio, há risco de novas altas nos preços para o consumidor, segundo o economista da FGV André Braz. ;O IPC tem espaço para subir porque o IGP-10 só captou um terço da alta prevista para os cursos formais, um pouco de transportes e tem efeito parcial dos in natura;, afirmou.
O arrefecimento do IGP-10 em janeiro, influenciado pelo recuo de preços de alimentos no âmbito da produção (Índice de Preços ao Produtor Amplo ; IPA), deve voltar a ser pressionado em fevereiro, com a retomada na atividade da cadeia agropecuária e pressões no varejo, prevê a FGV. (GC)