Sai Lula, entra Dilma Rousseff, mas os problemas para os trabalhadores de empresas terceirizadas continuam. Na Esplanada dos Ministérios, empregados convivem diariamente com o desrespeito aos direitos trabalhistas, o atraso no pagamento dos salários, do 13; e das férias, entre outras irregularidades. A administração pública paga as companhias, mas elas não repassam o dinheiro aos trabalhadores. Muitas vezes, fecham as portas e desaparecem. Uma das campeãs de reclamações é a Visual Locação de Serviços e Construção Civil, que presta serviços de limpeza e conservação para o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).
Contratada pela Visual, a auxiliar de serviços gerais Sônia P.*, 40 anos, ainda não recebeu o salário de dezembro. Há um ano e 11 meses no cargo, não tirou férias e nem sequer consegue uma resposta satisfatória da empresa. No fim do ano, ela foi a unidades do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da Caixa Econômica Federal e descobriu que, embora seja descontada todo mês no contracheque, a contribuição previdenciária não é repassada ao governo. O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) nunca foi depositado. ;Está tudo irregular. Temos problemas todos os meses para receber o vale-alimentação e o vale-transporte. Minhas faturas do cartão de crédito, contas de água e de luz estão atrasadas;, reclamou.
Indignada com a situação, Sônia e cerca de 30 colegas foram à Delegacia Regional do Trabalho (DRT) na segunda-feira. ;Eles prometeram que mandariam um fiscal aqui, mas ainda não vimos movimento;, disse. Atualmente, na Justiça do Trabalho da 10; Região, que abrange o Distrito Federal e Tocantins, há cerca de 410 processos contra a Visual, 3,5 mil contra a Fiança e 5,4 mil contra a Conservo. A situação dos empregados ficou mais complicada depois que, em novembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) desobrigou União, estados e municípios a arcar com os custos trabalhistas que não são pagos pelas empresas terceirizadas.
Sem caixa
Na prática, a decisão do STF restringe as possibilidades de conquista dos direitos trabalhistas por parte de empregados como a auxiliar de serviços gerais Carlita T.*, 54 anos. Ela é contratada pela Visual há cinco anos e foi transferida do Ministério da Fazenda para o MCT. ;Estou há dois anos sem tirar férias. A empresa simplesmente diz que não tem dinheiro em caixa;, queixou-se. A auxiliar Renata S.* também foi conferir a situação do depósito do FGTS e descobriu que ele está irregular. ;Somos mais de 60 pessoas nessa situação;, denunciou.
O Correio tentou entrar em contato com os representantes da Visual, que não atenderam as ligações. A reportagem foi ao escritório da empresa, no Núcleo Bandeirante, mas não foi recebida. Um aviso fixado na parede dizia: ;Atendimento de segunda a sexta-feira somente mediante agendamento e só para funcionários;. De acordo com moradores da região, muitas pessoas procuram a unidade para fazer cobranças e, por isso, os administradores mantêm as portas fechadas. ;Eles já devem para muita gente, inclusive da vizinhança;, disse um deles.
A Coordenação-Geral de Recursos Logísticos do Ministério da Ciência e Tecnologia informou que tem tomado providências para evitar que o serviço de limpeza seja suspenso. Para isso, ;tem conversado com a empresa responsável pelos terceirizados para tentar resolver o impasse, mas considera que cabe à Visual resolver a questão;, segundo comunicado enviado por e-mail ao Correio.
Não apenas no MCT a Visual causou problemas. No Ministério da Fazenda, onde era responsável pela conservação e limpeza até o ano passado, funcionários reclamam que a empresa não repassou à Previdência os valores relativos ao recolhimento do INSS, além de não ter pagado o FGTS. Uma funcionária da área de limpeza, de 35 anos, que só aceitou falar por telefone, relatou que os funcionários da Visual foram orientados a abrir mão de 20% do valor devido pela empresa, mediante a promessa de recontratação pela Condon, terceirizada que a substituiu no fim do ano passado.
;O acordo foi feito direto com a empresa, mas achamos que tinha o aval do sindicato. Quando chegamos ao sindicato, eles não sabiam de nada;, disse a funcionária. Além de terem de abrir mão dos direitos sob pena de perder o emprego, os recontratados foram ameaçados de demissão sumária, caso acionassem a Justiça para requerer os benefícios. ;Fomos avisados que, no fim do nosso contrato, que deve durar mais quatro meses, seremos mandados embora. Só estou esperando isso para reclamar na Justiça.;
Bagunça
Os atrasos nos salários dos terceirizados da Esplanada são comuns. ;Agora, com os novos contratos, está tudo certo. Mas sempre ouvimos sobre pessoas que não recebem o salário há meses. A antiga empresa, Conservo, sempre atrasava;, disse uma funcionária do Ministério das Comunicações. ;Essas empresas são uma bagunça mesmo;, completou outro trabalhador, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
Amedrontados, os funcionários preferem não se identificar. ;É um direito nosso. Mas, se mostrarmos a cara para reclamar, vamos para o olho da rua;, lamentou Maria J.*, auxiliar de serviços gerais da Fazenda.