O tema reforma da previdência social é um tabu para o novo governo empossado ontem. Escolhido para assumir a pasta, o novo ministro da Previdência Social, Garibaldi Alves, pregou a continuidade das medidas de gestão como forma de manter o deficit do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sob controle. Mas esse diagnóstico, na visão dos especialistas, está equivocado. Medidas de gestão são importantes e contribuem para a boa saúde do sistema, mas são insuficientes para enfrentar o desafio de um sistema já desequilibrado, de alto custo fiscal para o país e que tem pela frente a perspectiva de pagar aposentadorias e pensões por períodos cada vez maiores, simplesmente porque a população está vivendo mais.
A reforma da Previdência Social sempre foi um tema politicamente espinhoso. Diante do desafio da longevidade, a boa técnica ensina que não existem muitas opções: ou se aumenta o tempo de contribuição ou a idade mínima para concessão do direito. Na verdade, a regra geral é uma combinação das duas coisas, podendo haver a opção de um benefício antecipado, nesse caso, com redução do seu valor.
O governo Lula sofreu na pele o desgaste que uma reforma acarreta. Os servidores públicos não ficaram nada satisfeitos com as novas regras e houve uma corrida para a aposentadoria antes da entrada em vigor da emenda constitucional. Países europeus, às voltas com grave crise fiscal, estão enfrentando forte oposição da população, por causa da ampliação da idade e, consequentemente, do tempo de contribuição.
O Brasil, que poderia estar numa situação mais confortável ; a maioria de sua população é jovem, mas a taxa de envelhecimento é galopante ;, está deixando a reforma para um futuro incerto quando, irremediavelmente, as novas regras terão que ser muito duras.
Lição de casa
Enquanto o Brasil corre o risco de perder o bonde da história da previdência, seus vizinhos fazem a lição de casa. Tanto o Chile quanto a Argentina, que promoveram reformas na década de 1980 e 1990, embarcaram recentemente em um novo movimento, desta vez para corrigir erros do passado e cuidar de incluir mais pessoas na proteção social.
Na década de 80 o Chile trocou o sistema até então existente, de previdência pública, pelo regime de capitalização individual. Apesar dos benefícios desse tipo de sistema, o tempo acabou por provar que ele foi inadequado. Um grande número de pessoas ficou fora do sistema porque não tinha renda suficiente para poupar. Uma nova reforma foi então aprovada no governo de Michelle Bachelet e, dessa vez, tratou de integrar ao sistema as pensões solidárias, uma espécie de benefício social, não contributivo, destinado aos 60% mais pobres do país.
Um dos idealizadores da mudança chilena, o professor adjunto do departamento de Economia do Chile, Alberto Arenas de Mesa, conta que o segredo para o sucesso foi deixar de lado a ideologia e partir para um diagnóstico técnico, aprovado mediante consenso. O Chile sancionou uma lei de responsabilidade fiscal e cumpriu à risca a constituição de um fundo de reservas de pensões e, antes de a nova reforma ser implementada, já existiam os recursos suficientes para bancá-la. Já a Argentina, que tinha privatizado seu sistema de previdência, optou pelo retorno ao sistema público, de repartição.
Fábio Bertranou, especialista em Mercado de Trabalho e Proteção Social da Organização Internacional do Trabalho (OIT), explicou que um dos motivos para a volta do sistema de repartição foi a precária situação fiscal do país, a partir de 2003. Com a reforma dos anos 1990, o país não apenas perdeu contribuição como também o Estado teve que continuar bancando as aposentadorias e pensões de quem já estava em gozo do benefício. Essa perda foi camuflada pelos anos de crescimento econômico, mas voltou a aparecer com força na crise de 2008.