Não dá mais para disfarçar. A cada dia, fica mais visível a piora das contas externas do país. Com governo, empresas e população gastando sem parar, não restou ao Banco Central (BC) outra alternativa a não ser rever, para o ano, vários itens do balanço de pagamentos ; uma conta que detalha todas as transações com o exterior. Na projeção para o ano que vem, o BC elevou de US$ 49 bilhões para US$ 60 bilhões o deficit esperado para transações correntes, parte importante do balanço geral e que abrange o resultado do comércio internacional, a conta serviços e o dinheiro que os brasileiros remetem de fora para o país. Será o pior resultado da série histórica iniciada em 1947.
Contribui para o aumento de US$ 11 bilhões no deficit um saldo de apenas US$ 11 bilhões para a balança comercial ; para 2010, o BC elevou a previsão de US$ 13 bilhões para US$ 15 bilhões ; além de um aumento considerável nas despesas com serviços, que, no ano que vem, chegarão a US$ 75 bilhões. O chefe do Departamento Econômico do Banco Central (Depec), Altamir Lopes, classificou a deterioração das transações correntes como ;o preço do sucesso;. Como o país está bem, os gastos aumentam.
Com emprego garantido e renda no fim do mês, os brasileiros estão viajando como nunca ao exterior. O mesmo não acontece no sentido inverso. Vindos de países que ainda não conseguiram sair da crise, os estrangeiros estão gastando bem menos no Brasil. As despesas com serviços crescem em períodos de prosperidade porque as empresas brasileiras precisam de mais equipamentos para produzir e é intenso o fluxo de comércio, o que obriga o país a fretar navios.
Investimento direto
É a crise ainda forte lá fora que também jogou para baixo a expectativa de investimento direto para o ano. Até o mês passado, o BC esperava um ingresso de US$ 38 bilhões. Na nova projeção para 2010, o investimento estrangeiro direito caiu para US$ 30 bilhões. ;O crescimento mundial está inferior ao que imaginávamos;, admitiu Lopes. Para 2011, no entanto, o BC estima ingressos de recursos nessa conta da ordem de US$ 45 bilhões.
A necessidade de dinheiro externo para financiar o balanço de pagamentos está aumentando. Para o BC, no entanto, o crescimento é gradual e não explosivo. Mas existe uma diferença que o BC vem tentando amenizar. Até o ano passado, todo o deficit em transações correntes era coberto, com folga, com o ingresso de recursos para investimento direto. Este ano e no próximo, isso não acontecerá. O dinheiro que falta para fechar a conta virá de aplicações em títulos e ações no país, que podem sair a qualquer momento.
Segundo os números divulgados ontem pelo BC, o resultado em transações correntes foi negativo em US$ 2,86 bilhões no mês passado. É o maior valor para meses de agosto de toda a série. Para setembro, o BC estima um deficit de US$ 3,8 bilhões. No ano, o buraco já alcança US$ 31,122 bilhões, chegando, em 12 meses, a US$ 45,8 bilhões, o equivalente a 2,32% do Produto Interno Bruto (PIB, a soma de todas as riquezas geradas no país). É a pior relação com o PIB desde 2002.