Jornal Correio Braziliense

Economia

Previsão de alta dos alimentos e economia aquecida abrem subida dos juros

O mercado financeiro estima que o custo de vida vai se tornar mais caro até o fim do ano. As altas nos preços devem ser repassadas ao bolso do consumidor, especialmente onde elas mais incomodam: nos alimentos. Esse prognóstico indigesto, registrado pelo Boletim Focus do Banco Central, aponta para uma inflação de 5,01% em 2010. Na semana passada, a expectativa estava em queda. Era de 4,97%. As projeções para o aumento do Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas as riquezas do país) também foram recalculadas para cima. Subiram de 7,42% para 7,47%. Resta saber se, combinados, os dois dados serão capazes de acionar novo sinal de alerta no BC e justificar uma retomada do aumento dos juros.

O forte consumo no país, com lojas cheias, é um dos fatores que têm obrigado especialistas a rever diariamente seus números para o PIB. Em consequência, todo esse aquecimento da economia tem gerado inflação. Para 2011, o mercado espera preços em alta. Há um mês, os analistas acreditavam que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficaria em 4,86% no ano que vem. Nesta semana, aumentaram a projeção para 4,95%.

;Ainda é cedo. O BC não vai tomar nenhuma decisão sem antes ter uma tendência bem definida. Vai avaliar primeiro se esse aumento das expectativas é permanente ou temporário;, opinou o ex-diretor do Banco Central Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC). Mas, mesmo descrente em uma reviravolta, admite a possibilidade. ;O fato de o relatório Focus ter mudado a inflação para este ano e para o próximo acende um sinal amarelo para a autoridade monetária.;

No bolso
Entre os itens que devem ficar com preços mais salgados, está o feijão. No curto espaço de 10 dias, a saca do produto encareceu quase 100%. E, segundo Marcelo Eduardo Lüders, operador da Correpar Corretora de Mercadorias, o preço vai subir a níveis nunca antes registrados. ;Raras vezes nos últimos 10 anos, houve uma alta tão continuada como a que estamos vendo. Essa valorização irá refletir no bolso do consumidor, que deverá pagar mais pelo quilo do grão nas prateleiras dos supermercados;, sentenciou. Com a quebra da safra de trigo, na Rússia, derivados do produto, como o tradicional pãozinho francês, também deverão registrar alta.

O preço da soja também disparou no pregão de Chicago, um forte balizador para os preços ao produtor em solo brasileiro. Problemas de clima na China e no Brasil vêm reduzindo ainda a oferta e impulsionando o valor do produto. ;Há espaço para mais surpresas na inflação. É natural o repasse do atacado para os preços ao consumidor, ainda mais em um cenário de economia aquecida;, afirmou Eduardo Otero, economista da corretora Um Investimento. ;No caso da nova projeção para o IPCA do ano que vem, o cálculo se explica ainda por que o mercado continua desconfortável com o BC, por ele ter interrompido a alta de juros;, disse o economista-chefe do Banco Schahin, Silvio Campos Neto.

Dissonância
A despeito de toda essa pressão no custo de vida, os especialistas acreditam que o Banco Central não vai iniciar um novo aperto monetário neste ano, deixando a Selic estável nos atuais 10,75% ao ano. O professor de Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) Samy Dana é uma das poucas vozes dissonantes. Para ele, essa pressão sob os alimentos deve obrigar o Banco Central a iniciar novo ciclo de aumento de juros. ;Acredito que subirá 0,5 ponto percentual até o fim do ano. No entanto, penso que esse aumento será dividido em duas altas de 0,25, sendo a primeira na próxima reunião do Copom;, disse. O economista Carlos Thadeu de Freitas rebate. ;Tendo em conta que nos próximos 12 meses há uma expectativa de uma inflação razoavelmente abaixo da meta, não creio em aumento da Selic.;