Jornal Correio Braziliense

Economia

Carga tributária cai por reflexo da crise, mas não alivia orçamento

A mesma recessão que assolou as economias mundo afora também fez a carga tributária cair no Brasil em proporção à soma de riquezas, produtos e serviços produzidos em 2009 no país. O peso dos impostos sofreu um ligeiro recuo, passando de 34,41% para 33,58% do Produto Interno Bruto (PIB), a primeira queda em três anos, de acordo com a Receita Federal. Os brasileiros, no entanto, não têm motivos para comemorar, já que a redução em nada tem a ver com o alívio no bolso. ;É preciso deixar claro que não houve, de fato, uma queda na carga tributária, mas no montante arrecadado. Para muitos produtos, os consumidores simplesmente não pagaram menos;, destacou Jorge Lobão, consultor tributário do Centro de Orientação Fiscal (Cenofisco).

Para o especialista, os números não refletem a realidade com muita precisão, já que para aqueles que não compraram um carro ou uma geladeira no período não houve redução de impostos. Além da demanda externa em queda, que afetou os exportadores e a restrição de crédito, o recuo nos tributos também mostrou impacto indireto das desonerações feitas pelo governo para combater a crise. O Imposto sobre os Produtos Industrializados (IPI), reduzido a zero em alguns casos, como na produção de automóveis flex, foi o principal instrumento utilizado. O tributo apresentou o maior recuo (0,34 ponto percentual) em proporção ao PIB.

Temporária
Entre os entes da Federação, a União foi a que apresentou a maior redução da carga tributária (0,67 ponto percentual), mas também trata-se da esfera que arrecada um número mais diversificado de tributos. Nos estados, o volume recolhido em Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) encolheu 0,14 ponto percentual e foi o responsável por quase toda a queda entre os governos regionais. A crise só não afetou o recolhimento de contribuições para o Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) e para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Os descontos mantiveram-se elevados por estarem relacionados à massa salarial, um dos principais pilares do aumento da arrecadação no ano passado.

O economista Felipe Salto, da consultoria Tendências, reforça a avaliação de que o consumidor pode deixar a comemoração de lado e destaca que a carga menor, temporária, deve voltar ao patamar superior aos 34% já neste ano. ;Essa queda não reflete nenhuma alteração de estrutura e veio como consequência de um período ruim, de crise. A tendência de crescimento é clara;, considerou. Apesar de o governo trabalhar com uma estimativa de avanço econômico mínimo de 6,5%, o subsecretário de Tributação e Contencioso da Receita, Sandro Serpa, diz que não é possível prever o comportamento dos impostos. ;Com os dados que a Receita controla, não podemos inferir que haverá aumento. Há tributos estaduais, municipais e o FGTS, que não podemos estimar;, justificou.

Baixo retorno
Os analistas são unânimes na avaliação de que, apesar de ter uma carga menor do que outros países-membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil ainda mantém um pesado fardo em tributos a sua população, na comparação com o volume de serviços e infraestrutura que oferece. ;Claro que o tamanho do poder público de cada país influencia na necessidade de impostos, mas, no nosso caso, os recursos continuam sendo muito mal administrados;, observou Lobão.

Nos países que mais cobram tributos, como a Dinamarca, os impostos são justificados pelo atendimento que o Estado proporciona aos cidadãos em educação, saúde e investimentos.


E EU COM ISSO
O governo ludibria os contribuintes quando exige o pagamento de pesados impostos e contribuições, mas não entrega os serviços garantidos pela Constituição Federal. Segundo levantamento divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) esta semana, apenas 57% dos domicílios no Brasil, até 2008, eram considerados adequados para moradia por terem, simultaneamente, abastecimento de água potável, esgotamento sanitário e coleta de lixo. Apesar da arrecadação de impostos recorde e do gasto exorbitante do Estado, a precariedade se repete nas áreas de segurança, educação e saúde.