Colhendo os frutos do crescimento da internet no Brasil, a GVT vem seguindo a tendência das empresas de telecomunicações de compensarem as perdas de receitas oriundas de serviços tradicionais de ligações telefônicas por ganhos cada vez maiores nos planos de transmissão de dados. Enquanto em 2006 os negócios baseados em voz representavam 85,6% da receita total da companhia, no último ano essa fatia foi de 68,2%. Em contrapartida, a participação dos serviços de dados (residencial, empresarial e VoIP) subiu significativamente, de 14,4% para 31,8%. Para este ano, os ganhos conquistados a partir de conexões de internet tendem a aumentar. No fim do primeiro trimestre de 2010, a empresa atingiu 3,1 milhões de linhas em uso. Baseado nesses números, a companhia aposta cada vez mais na oferta de produtos que utilizem a banda larga de alta velocidade como plataforma. ;Vamos oferecer conteúdos diferenciados aos nossos clientes, como shows ao vivo e IPTV;, contou ao Correio o presidente da GVT, Amos Genish.
Ouça trecho da entrevista com o Amos Genish, presidente da GVT
Mas para continuar a crescer no país, a GVT aguarda uma resposta positiva de um processo movido na Comissão de Valores Mobiliários contra a Vivendi, grupo francês que comprou a empresa no fim do ano passado com a intenção de investir pesadamente no mercado brasileiro. A CVM questiona se, durante o período de aquisição, a controladora lançou informações erradas ao mercado, fazendo crer que já possuía a maioria das ações da operadora, tirando assim qualquer chance da concorrente Telefônica ganhar o controle da marca. ;Tudo se resume ao que se deveria divulgar na época da compra;, minimizou Genish.
Entrevista
A GVT aposta na oferta de conexões cada vez mais velozes para o cliente. O mercado já acompanha tanta banda ofertada?
Cada vez mais serviços vão chegar ao mercado, o que vai exigir velocidades maiores. Por exemplo, temos um projeto com a Universal Music para o fim do ano que vai permitir aos nossos usuários de internet acessar conteúdos, seja de áudio ou de vídeo, da produtora, incluindo shows ao vivo de artistas mundiais. Se a Lady Gaga fizer um show em Cingapura, por exemplo, o nosso cliente vai poder acompanhar em tempo real a apresentação pelo computador. Esse é um tipo de conteúdo bastante inovador e que apostamos para os próximos anos. Além disso, em 2011 temos a intenção de entrar no mercado de IPTV (sistema de TV que utiliza a internet para transmitir conteúdos). É um serviço que já está disponível no mundo, mas que ainda não tem força por aqui. Isso porque não há empresas que têm redes robustas o suficiente para esse tipo de aplicação.
Com a entrada da Vivendi, a GVT planeja ser uma empresa nacional?
Sim. Se repararmos, não temos uma companhia de telefonia fixa residencial com atuação em todo o país. A GVT vai ser a primeira empresa nacional de telefonia fixa a estar em todo o Brasil. Neste momento, com a entrada da Vivendi, consideramos que a companhia vive uma segunda transição. A primeira aconteceu em 2007, com a abertura do capital, onde conseguimos capturar R$ 1,1 bilhão para investir em redes e expandir nossa participação em outras capitais. Hoje, com a Vivendi, vivemos uma segunda fase, com a entrada de mais recursos que possibilitará uma maior atuação no país. Se olharmos o nível de investimentos, podemos ver como a empresa está apostando no futuro. Em 2008 e 2009, a média de investimentos foi de R$ 700 milhões por ano. Em 2010 vamos a chegar a R$1,5 bilhão. Com a Vivendi, vamos antecipar para o próximo ano todas as metas de expansão que programávamos para atingir somente em 2013.
A GVT vai entrar no mercado de TV por assinatura?
Teremos um serviço híbrido de TV, com satélites para TV aberta e IPTV para os serviços interativos. Por que vamos usar um modelo híbrido? Porque a lei ainda não permite a nossa entrada e não podemos ficar esperando a aprovação do PL n; 29 (Projeto de Lei de 2007 que abre espaço para as operadoras de telefonia oferecerem serviços de TV paga no Brasil). Teremos canais de assinatura tradicionais, como há na Net e na Sky, mas também vamos contar com a oferta de conteúdo interativo. Teremos ainda vídeos sob demanda, que é algo que não existe de forma séria aqui no Brasil. A Sky deve ter uns 20 ou 30 filmes disponíveis, o que não é muito. Com o IPTV, nós podemos oferecer até 3 mil títulos no catálogo para que o cliente escolha o que quer assistir em qualquer momento. Por isso apostamos muito na banda larga rápida, mas com conteúdo. O mercado de TV paga hoje me lembra o de banda larga de cinco anos atrás. Se olharmos bem, temos um duopólio com a Sky e a Net brigando por todo o mercado. Por isso temos preços altos. O mercado precisa de concorrência para ter serviços diferenciados e inovadores, com um custo/benefício satisfatório. A penetração da TV paga no Brasil, de apenas 12%, é a pior da América Latina. Acredito que, com a entrada das teles nesse mercado, muita coisa vai mudar e ele vai explodir, dobrando de tamanho em quatro anos.
Há algum tempo a GVT briga contra os altos valores cobrados pela VU-M (tarifa interconexão), que é parte importante das receitas das operadoras móveis. O senhor acredita que a redução do valor cobrado por essa tarifa poderia ter um efeito positivo no mercado?
Há muitas pesquisas e relatórios demostrando que o preço da tarifa do celular no Brasil é um dos mais caros do mundo. E um dos principais culpados disso é a VU-M. Isso porque se o usuário da telefonia fixa quiser ligar para outra operadora, ele tem que pagar quase R$ 0,40 por minuto (enquanto o minuto dentro da rede fixa é de R$ 0,03). Por isso o uso de minutos no país é baixo. A Índia, por exemplo, usa muito mais o celular para fazer ligações do que o Brasil. Por quê? Porque eles podem falar sem medo da conta. A Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça já disse que esse preço é abusivo, então algo deve ser feito. Acredito que há a possibilidade de se reduzir em pelo menos 50% esse valor sem impactar as empresas. Isso porque, se elas reduzirem o valor, as receitas vão crescer, compensadas pelo aumento de uso. A Anatel precisa olhar para esse problema. Esse modelo atual prejudica os usuários, as próprias operadoras móveis e as fixas.
O senhor já declarou que não pretende disputar o leilão de licenças da banda H (blocos de exploração do Serviço Móvel Pessoal de 3G)? Por que não?
A GVT não tem interesse porque não há novidade alguma na tecnologia 3G no Brasil. A concorrência é muito alta e não vamos poder oferecer algo diferenciado com esse serviço. Mas olhamos com interesse para o leilão de 4G. Essa nova tecnologia (chamada de LTE) vai oferecer uma velocidade muito mais alta do que é ofertada hoje. Para se ter uma ideia, o 4G pode entregar uma conexão até 10 vezes mais veloz que o 3G. Então por que iríamos querer gastar bilhões de reais com essa tecnologia se podemos começar do zero com uma nova plataforma? Assim vamos ser a primeira empresa 100% com clientes 4G no mercado.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pode aplicar uma multa de R$ 3 bilhões à Vivendi por suposta irregularidade no processo de aquisição da GVT. Caso a pena se concretize, isso pode afetar os planos de investimentos no Brasil?
Primeiro quero esclarecer que, ao contrário do que dizem, o processo da CVM ainda não está concluído. A Vivendi recebeu muitos questionamentos por parte da Comissão, o que é natural em qualquer processo de aquisição. O importante é entender que a Vivendi é uma companhia séria e que faz tudo dentro da lei e das regras dos países em que opera. Surgiram dúvidas normais dentro do processo, mas que nem de longe é esse monstro que estão falando. Acredito que há muitos interesses por trás da divulgação desse tipo de notícias. É bom deixar bem claro que a CVM ainda não se posicionou em relação a esse assunto. Mas voltando à sua pergunta, a Vivendi confia muito na economia brasileira e na GVT. Por isso vamos investir duas vezes mais do que foi investido no ano passado.
Mas houve a divulgação de informações erradas na época da aquisição?
Na época, a Vivendi divulgou que tinha o controle de trinta e poucos por cento das ações da GVT e mais 19% de opções. Agora, a CVM nos questionou quais tipos de opções eram essas. Eram opções de compra e venda. Toda a investigação da CVM diz respeito ao fato de se precisávamos ou não divulgar o tipo de ações que havíamos comprado. Só isso. Não há irregularidade nenhuma. Segundo os advogados da empresa, na ocasião, só era preciso dizer que se possuía essas opções. Agora estão cobrando a identificação. Mas esse é um assunto da Vivendi com a CVM, a GVT não tem nada a ver com isso.
Os serviços de voz ainda têm uma representação significativa na receita da GVT, mas, como acontece em todas as companhias, tem perdido importância cada vez mais para os serviços de dados. Com isso, a banda larga se torna a principal aposta da empresa para os próximos anos?
Essa é uma tendência, seja no mercado residencial ou corporativo. As pessoas querem cada vez mais velocidade. Apostamos nisso quando começamos nossas operações, em 2000, e hoje temos capacidade de vender banda larga de 10Mbps, 20Mbps, 100Mbps. Se olharmos o perfil dos nossos clientes, a maioria compra 10Mbps ou mais. Temos uma rede que pode oferecer essa velocidade com alta qualidade.
O que o senhor acha da reativação do sistema Telebrás?
Essa foi uma decisão do governo para atingir algumas metas. O objetivo é bom ; de levar banda larga para as cidades pequenas onde não se tem cobertura e diminuir, assim, o vazio digital que existe em algumas partes do país. Mas o governo precisa pensar bem qual será o papel da estatal nesse processo. Acho que a parceria com o mercado privado seria a melhor forma para implementar esse projeto. Assim, gastaríamos menos tempo e custos para atingir a meta de 40 milhões de usuários até 2014.
O setor privado tem muito ativo e experiência que podem ajudar o governo. A GVT, especificamente, precisa da ajuda da Telebrás. Apesar de termos o terceiro maior backbone do Brasil, depois da Oi e da Embratel, ainda não chegamos em muitas cidades. Isso porque investir em backbone é muito caro. Agora, se a Telebrás disponibilizar o backbone que tem com um preço subsidiado pelo governo, é claro que todos vão querer utilizá-lo. O melhor jeito do governo reduzir preço e melhorar o serviço de internet é criando concorrência.
Como o senhor vê o mercado de telecomunicações brasileiro que se desenha para o futuro, repleto de fusões e aquisições?
É um momento interessante. Temos grupos fortes no Brasil que querem consolidar suas posições. Um exemplo é a Telefônica. Entendo a intenção da companhia de querer consolidar serviços fixos e móveis. A Embratel também se mexeu. Mas no fim, acho que o setor não vai mudar, porque não haverá a entrada de novos jogadores. A boa notícia é que, com a chegada de Vivendi, teremos um novo jogador para disputar com a Telmex, a Telefônica e a Oi. À longo prazo, teremos, então, um cenário bastante interessante com quatro empresas competindo em todos os mercados ; telefonia fixa, TV paga e, no momento certo, no celular. Mesmo assim, pelo tamanho do mercado brasileiro, acho que quatro grandes grupos ainda não é o suficiente. Talvez cinco seria o ambiente ideal.
No primeiro trimestre, a empresa registrou uma receita líquida de R$ 500 milhões ; 37% superior ao mesmo período do ano passado. A compra pelo grupo francês Vivendi tornará esse ritmo sustentável?
Acho que sim. O potencial do mercado para a GVT é incrível. A nossa participação no mercado nacional de voz é de apenas 3%. Já na banda larga a fatia é de 6%. Ou seja temos um mercado grande para entrar. Nossa cobertura atinge apenas 5 milhões de residências, sendo que o Brasil tem 40 milhões de lares. Entendemos que ainda há muito para construir. O lançamento de produtos inovadores servirá como motor para ajudar a manter o nosso crescimento atual.
A ideia é aproveitar a plataforma de conteúdo da Vivendi?
A Vivendi é a maior empresa do mundo de videogames. Nossa ideia é aproveitar a plataforma deles para os que os nossos usuários joguem online. É algo difícil, mas já temos um projeto em curso. Queremos usar cada vez mais conteúdos do grupo Vivendi aqui para o Brasil, exclusivamente para os nossos usuários.
A empresa ganhou ou perdeu com a portabilidade numérica?
Essa foi uma mudança muito importante para o mercado, dando mais direito para o consumidor. Acho que, inclusive, ela chegou tarde. Para nós, ganhamos e muito com ela. Para cada clientes que perdemos, ganhamos sete ou oito. A maioria dos nossos novos clientes vem da concorrência. Nas novas cidades de atuação, acho que 80% vêm de outras empresas.