Jornal Correio Braziliense

Economia

Decisão do BC sobre a taxa básica de juros dá vitória a Mantega contra Meirelles

Resultado indica que atual ciclo de aperto monetário está perto de acabar

O ritmo do aumento dos juros começou a diminuir. O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, elevou ontem, pela terceira vez seguida, o percentual da taxa básica da economia, desta vez em 0,50 ponto percentual. Os dois aumentos anteriores tinham sido de 0,75 ponto. O novo ajuste levou a taxa Selic de 10,25% para 10,75% ao ano. A decisão foi por unanimidade e representou uma vitória do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que recorreu até ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva em sua cruzada contra o arrocho capitaneado pelo presidente do BC, Henrique Meirelles. Venceu a visão do chefe da equipe econômica, de que não era necessária uma nova paulada tão forte, já que a inflação mostrou um recuo importante ainda no primeiro semestre.

Por outro lado, o recuo do BC logo após a intervenção de Lula ; o presidente endossou a atuação de Meirelles na condução da política monetária ; poderá dar margem à interpretação de que a decisão tem por objetivo inflar a candidatura de Dilma Rousseff ao Palácio do Planalto. As avaliações públicas de Mantega incomodaram o presidente do BC, Henrique Meirelles, que fez questão de deixar claro que o Copom só tomava a decisão no dia e com base nos dados disponíveis. De qualquer forma, embora a elevação menor que a esperada já tenha sido captada nos últimos dias por bancos e investidores, ela pegou no contra-pé vários economistas. Com base em comunicados que davam conta da deterioração da inflação, eles apostavam num aumento de 0,75 ponto percentual na taxa de juros.

Na nota divulgada ao fim de quase três horas de reunião, o BC disse que tomou a decisão ;considerando o processo de redução de riscos para o cenário inflacionário que se configura desde a última reunião, e que (o aumento de 0,50 ponto percentual) se deve à evolução recente de fatores domésticos e externos;. Fontes do banco, contudo, insistiram que o aumento não foi pouca coisa e que a preocupação com a inflação persiste. A decisão baseou-se em um cenários de riscos mais favorável.

Cenário
Com a decisão de abrandar o aumento dos juros, parte dos economistas já avalia que o ciclo de aperto monetário pode estar perto do fim. ;Com base no comunicado do Copom, podemos ter mais um aumento de 0,50 ponto e só;, observou o economista Ricardo Denadai, do Santander. O banco espanhol era um dos que apostava numa elevação de 0,75 ponto. ;Achávamos que era o melhor a ser feito. Com mais 0,75, o Copom correria menos riscos;, disse. Para o Santander, influenciou na decisão do Copom a piora do cenário internacional ; com menos demanda externa, vai sobrar mais produtos internamente para atender a demanda doméstica ;, a acomodação da atividade interna e a expressiva desaceleração da inflação, muito ainda por conta dos alimentos, mas também já mostrando um alívio dos núcleos.

O economista-chefe da Prosper Corretora, Eduardo Velho, concorda. Ele, que também apostava num aumento de 0,75, disse que se surpreendeu com a decisão do BC. ;A crise externa passou a ter um impacto efetivo;, observou. A seu ver, dependendo de como vier a ata do Copom(1) na próxima semana, pode até mesmo não ter alta de juros na reunião de setembro. ;O percentual de 11,75% passou a ser teto;, afirmou Velho.

A aposta em 0,75 baseou-se, principalmente, no balanço trimestral de inflação. ;No relatório divulgado há menos de 21 dias, o BC mostrava o cenário de inflação bastante deteriorado e a necessidade de continuar o aperto monetário no mesmo ritmo para conseguir colocar a inflação na meta em 2011;, disse o economista-chefe do Sul América Investimentos, Newton Rosa. Ele ponderou que vários indicadores divulgados nos últimos dias apontavam para uma atividade econômica mais fraca e inflação mais comedida.

Potencial
Mesmo assim, o economista também apostava que o BC iria manter o ritmo de aumento da taxa. Para Rosa, a economia ainda está crescendo acima do seu potencial. A indústria trabalha no seu limite e o mercado de trabalho, com taxa de desemprego na baixa histórica, vem contribuindo não apenas para a demanda permanecer alta como também para a elevação de custos das empresas.

Para Flávio Serrano, economista sênior do BES Investimento, o mercado passou a duvidar da manutenção do ritmo forte de ajuste monetário depois que a situação externa piorou, com a expectativa de um crescimento bem menor para a economia mundial; pela acomodação da atividade econômica interna frente a um primeiro trimestre acelerado; e também pela queda da inflação. ;A reversão da inflação foi realmente muito forte. Em junho, o

IPCA já foi zero e em julho tivemos deflação;, acentuou.

Para novas avaliações, a atenção dos economistas agora está voltada para a ata da reunião do Copom, que será divulgada na quinta-feira da semana que vem. É pelo tom da ata que o mercado ajustará suas estimativas, agora já bem mais reduzidas. Para a reunião do Copom de setembro, os economistas estão mais divididos do que nunca. Já há quem aposte que ela será a última com aumento de juros, agora no novo patamar de 0,50 pontos, e outros que ainda acreditam na extensão de aperto monetário até outubro, com nova alta de 0,50 ponto ou mesmo de 0,25 ponto.

1 - Visão panorâmica
Para tomar a decisão sobre o aumento dos juros, o Copom mira na meta de inflação para tomar a decisão de aumentar ou não a taxa de juros e em que percentual. Os membros do Comitê olham vários indicadores, inclusive os do mercado internacional e seus reflexos sobre a economia. Num cenário benigno, com a pressão inflacionária em queda, a tendência é de redução da taxa. O objetivoé manter os preços perto do centro da meta de 4,5% para este e para o próximo ano.