Jornal Correio Braziliense

Economia

O beabá do paraíso e do caos

Analistas criam um abecedário próprio para definir o sobe e desce da economia. Na crise, Brasil fez o movimento em V

Nouriel Roubini, economista turco que, em 2005, previu a quebradeira global e foi chamado de louco, ganhou o apelido de ;Dr. Catástrofe; por ter acertado em cheio. Em uma das dezenas de palestras que já fez ao longo deste ano, disparou: ;A Europa está enfrentando um duplo mergulho;. A frase, repetida à exaustão por tantos outros medalhões, ecoa pelo mundo assombrando a todos, mas também tem servido de inspiração. O fenômeno definido por Roubini e seus discípulos leva o codinome de ;W;.

Economias que estavam no auge caíram em recessão e agora retomam o fôlego estão no centro das atenções. Boa parte dos analistas aposta que, depois da bonança, será inevitável o mergulho de determinados países até outra reação, o que empurraria para o futuro os patamares experimentados no início da sequência. Por causa da fragilidade fiscal de países como Grécia, Espanha e Portugal, a Zona do Euro estaria ameaçada de reviver agonias recentes como se estivesse prestes a submergir a qualquer instante.

;W;, ;V, ;L;, ;U; e até a raiz quadrada explicam o desemprego recorde nos Estados Unidos, os rombos nos orçamentos da Europa e a paralisia japonesa. Em outra medida, as letras do alfabeto e o símbolo matemático também ajudam a entender a recuperação do sistema financeiro, a exuberância dos emergentes e a reação das bolsas de valores. Contraditório? Sim, mas e daí? Se crise econômica provocada pelo estouro da bolha imobiliária americana em 2008 ficou para trás, o pânico e o otimismo, não. Ambos continuam sendo os sentimentos da moda.

Para justificar como as profecias do caos podem caminhar juntas com expectativas tão positivas, os teóricos da economia abusam das imagens. O ;V; é o cenário mais otimista possível. A letra indica que, no ápice, o crescimento de um país despenca veloz e fortemente, mas se recupera na mesma velocidade e intensidade. Especialistas acreditam que Brasil, Rússia, Índia e China, os chamados Bric, estariam nesse cenário. Outros, porém, afirmam que não. ;Esses países estão em uma raiz quadrada. O Brasil, por exemplo, caiu, subiu muito e vai crescer a taxas mais comportadas nos próximos anos;, diz André Perfeito, economista da Gradual Investimentos.

As perspectivas de expansão da economia mundial feitas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) provam algum sentido. Ainda abatido pela turbulência de dois anos atrás, o mundo rico crescerá menos do que os emergentes nos próximos anos. O diagnóstico tem grandes possibilidades de se confirmar, mesmo porque o comércio internacional continua em banho-maria influenciado pela gangorra dos preços das commodities (mercadorias com cotação internacional).

Diante dos cenários atuais, Perfeito acredita que o planeta poderá experimentar uma fase em ;L;, quando a geração de riqueza experimenta uma queda livre do topo ao piso e estagnada vive um longo período de crescimento tímido ou de paralisia. ;A economia mundial desacelerou fortemente. A recuperação vai se dar de maneira muito gradual;, completa o analista.

Sopa de letrinhas
O impacto sobre o consumo e o fluxo de compras e vendas internacionais deverá ser influenciado pela incapacidade das locomotivas tradicionais arrancarem. Caberá à China, à Índia e a mais duas ou três economias em recuperação ; entre elas, o Brasil ; ditar o ritmo global.

Dependendo da forma de como esse crescimento acontecerá, o Produto Interno Bruto (PIB) mundial poderá viver um ;U;, realidade na qual a atividade econômica afunda, patina por um determinado período, para só depois voltar aos trilhos e se expandir. Se isso vai acontecer, ninguém sabe. Os radares dos grandes bancos e das agências de risco internacionais estão ligados à caça de outros Roubini ou de alguém que seja capaz de organizar a sopa de letrinhas.