Jornal Correio Braziliense

Economia

Crescimento zero abre crise no governo

Indicador do BC que mostra parada na economia depois de 16 meses de avanço dá munição a Mantega para voltar a atacar a alta dos juros. Ele se queixou diretamente a Lula

No novo front aberto na batalha entre o Ministério da Fazenda e o Banco Central em torno do aumento da taxa Selic, a própria autoridade monetária deu munição ontem à equipe do ministro Guido Mantega ao apontar a completa paralisação da economia em maio. O Índice de Atividade do Banco Central (IBC-BR), que procura antecipar a tendência do Produto Interno Bruto (PIB) do país, estancou após 16 meses consecutivos de avanço e deve reforçar os argumentos de Mantega. Para o ministro, um novo aumento dos juros em julho é aceitável, mas elevar a taxa acima dos 11% pode comprometer o crescimento do país.

Desde que voltou de férias, na última sexta-feira, Mantega se mostrou disposto a atacar novamente a política monetária conduzida pelo BC, a ponto de ir pessoalmente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticar a alta dos juros capitaneada por Henrique Meirelles. As principais armas utilizadas pelo ministro são os indicadores recentes da economia, confirmando previsões que Mantega havia feito desde o fim do primeiro trimestre de que a economia iria desacelerar a partir de abril e de que a inflação, assombrada por preços de alimentos, sofria na verdade um choque pontual, já revertido.

No mercado, é consenso que o Comitê de Política Monetária (Copom) vai aumentar novamente a taxa de juros em 0,75 ponto percentual na reunião de julho. Também começam a ganhar força avaliações de que o BC pode trazer na ata do encontro um novo balanço de riscos, sinalizando uma redução no ritmo de ajuste na taxa ou mesmo o fim do ciclo de arrocho monetário. ;Tudo indica uma acomodação do crescimento no segundo trimestre, mas mesmo que alguns agentes já comecem a rever suas projeções e, independentemente desses indicadores, o BC não vai alterar sua estratégia nessa próxima reunião, senão vai pegar o mercado de surpresa;, avaliou a economista-chefe da corretora Icap Brasil, Inês Filipa.

Para a economista, as duas últimas atas do Copom foram muito claras em apontar, por exemplo, descompasso entre oferta e demanda, e um freio brusco do BC já em julho poderia criar ruído entre a autoridade monetária e as expectativas dos agentes econômicos. ;Agora, o BC não tem compromisso com a taxa Selic no ano. Tem com a meta de inflação. A chance é pequena, mas ele poderia muito bem aumentar os juros (em julho) e sinalizar na ata uma parada no ciclo de ajustes;, acrescentou.

Preços favoráveis
Os analistas acreditam que a ideia de reduzir o aperto monetário pode se consolidar, caso a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de julho venha tão comportada quanto em junho, quando ficou em zero. De acordo com o Boletim Focus, pesquisa na qual o BC coleta as projeções das 100 maiores instituições financeiras do país, a expectativa de inflação para este mês foi reduzida pela terceira semana seguida e chegou a 0,23%.

Para o economista-chefe do Banco WestLB, Roberto Padovani, a retirada de estímulos fiscais e monetários no mercado doméstico e um menor ritmo de crescimento no mercado mundial também podem levar o BC a rever a estratégia após a reunião de julho. ;De fato, os indicadores de atividade no Brasil mostram desaceleração no segundo trimestre, reflexo da reorientação das políticas fiscal e monetária feitas a partir do fim de 2009. Da mesma forma, as ainda frágeis condições de renda e crédito na economia mundial deixam claro que o ritmo de recuperação observado no primeiro trimestre não poderia ser mantido;, destacou o economista em relatório.

As expectativas de inflação futura, para 2011, que atualmente são o principal alvo da política monetária, também não contribuem com o BC para justificar um ajuste mais longo nos juros. As projeções para o avanço do IPCA no ano que vem estão estáveis em 4,8% há 13 semanas, informou o Focus.

Apesar da análise de que o BC pode se decidir pelo último aumento do ano já em julho, o economista Homero Guizzo, da LCA Consultores, destaca que ainda é cedo para afirmar que o Banco Central pesou demais na elevação dos juros já realizada. ;Ele elevou a taxa de 8,75% ao ano para 10,25%. Não é um aumento draconiano e, mesmo que ele promova mais dois aumentos de 0,75 ponto percentual, não vai ficar distante dos juros de equilíbrio, como em outras ocasiões;, destacou. Na avaliação de Guizzo, o BC só deve encerrar o ciclo de aperto monetário após a reunião de julho se houver sinais mais sérios de paralisação da economia. ;Por enquanto, o país ainda está crescendo. Não em ritmo chinês, como no primeiro trimestre, mas ainda crescendo;, ponderou.

Ano deve fechar com PIB de 7%
Mariana Mainenti


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que a economia brasileira crescerá pelo menos 7% este ano. ;Projetamos crescimento da economia não inferior a 7% em 2010 e temos a meta de gerar 2,5 milhões de empregos;, disse Lula durante ato de assinaturas de convênios do Brasil com a União Europeia, no Itamaraty. Durante o evento, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que o crescimento do Brasil ficará entre 6,5% e 7% este ano. As previsões anteriores do próprio ministro eram de um crescimento de até 6,5%. Questionado sobre os últimos números divulgados pelo Banco Central, Mantega disse ainda que não há superaquecimento da economia.

;Já estava previsto. Faz tempo que digo isso para vocês: ;vai haver uma desaceleração do crescimento depois do primeiro trimestre porque o primeiro trimestre antecipou o faturamento, as vendas, do segundo trimestre;. Então é como se a gente devesse fazer uma média: pegar o primeiro trimestre, que foi um crescimento muito forte, somar com o segundo trimestre e dividir pelo meio;, argumentou.

Preocupação
Mantega previu uma recomposição do crescimento a partir do terceiro trimestre do ano. ;Estaremos naquela época com 5,5% de crescimento, 6% de crescimento;, calculou. O ministro afirmou que é natural que agora tenha havido uma desaceleração e que o crescimento do primeiro trimestre foi uma reação à queda de 2009, mas que haverá uma acomodação da economia num patamar ;normal; de crescimento. ;O novo patamar normal de crescimento é 5,5%, 6%. Então, este ano é um pouco atípico por conta do que aconteceu no ano passado. Tirando estímulos, a economia desacelera e entra num ritmo normal. O ano termina com 6,5% a 7% de crescimento;, disse Mantega durante a Cúpula Brasil-União Europeia, em Brasília.

O ministro previu ainda que o ano terminará com uma inflação dentro da meta estabelecida. ;A inflação é uma preocupação permanente da gente, mas com o IPCA zero é claro que ela deu uma caída, que, aliás, eu já havia previsto também. Eu falei: ;alimentação puxava a inflação para cima e vai puxar para baixo;.

E nesse momento puxou para baixo, tanto que deu IPCA zero (em junho);, disse. Para Mantega, esse resultado é muito satisfatório porque indica que o crescimento é sustentável e que não há superaquecimento da economia. ;Nós teremos um crescimento sustentável até o final do ano e devemos encerrar o ano com a inflação dentro das metas;, estimou.